Em dezembro do ano passado, o Banco BMG tentou abrir seu capital na Bolsa, mas os investidores internacionais já haviam fechado ‘o lojinha’ e uma correção aguda no S&P não ajudou em nada.  A operação foi abortada.

De lá para cá, o BMG entregou quase tudo o que prometera aos investidores — mesmo sem os recursos da oferta — e voltou agora ao mercado praticamente com a mesma faixa de preço da transação anterior.

Esse desconto implícito, somado à perspectiva de crescimento futuro já contratado, está atraindo alguns fundos long-only locais e investidores internacionais, que pela primeira vez em muito tempo representam uma fatia considerável das ordens (35%, segundo pessoas próximas à oferta).

O período de reservas termina hoje no fim da tarde e, até às 10 da manhã, o book estava mais de duas vezes coberto, ainda que na parte baixa da faixa de R$ 11,60 a R$ 13,40.

Gestores que não gostam da história dizem que o modelo de negócios do BMG tem pouca diferenciação, num mercado em que todos os bancos trabalham com consignado, além de um risco regulatório intrínseco, ja que a regra que governa os produtos consignados pode mudar com uma canetada do BC. Há também dúvidas sobre a capacidade do BMG de executar sua estratégia de banco digital — algo muito mais complexo do que apenas expressar este desejo.

Pelo menos dois gestores me disseram que a queda na Selic vai evidenciar que o spread cobrado pelo BMG é “muito alto” e “insustentável.”   “Esse banco vai passar por um repricing da carteira imenso, o que deve reduzir o ROE dele,” disse um gestor que, obviamente, está ficando longe da oferta.

Por enquanto, o BMG está entregando. O banco tem um ROE recorrente de cerca de 15%.  O ROE ’sujo’ roda a 9%, sofrendo os efeitos do ágio que a empresa pagou na aquisição Banco Schahin e que termina em 2021. O lucro do banco aumentou 52% no primeiro semestre deste ano contra o primeiro semestre do ano passado.

Se uma eventual queda dos spreads pode pressionar a rentabilidade do ativo, do lado do passivo a contínua queda da Selic deve ajudar o banco.

Como 60% do passivo vem de CDBs pré-fixados, enquanto 40% são pós-fixados, o BMG tende a se beneficiar quando o passivo atual vencer e for substituído por uma dívida mais barata.

As preocupações com a concorrência dos bancões também parecem exageradas.

“Todo mundo diz há quatro anos que os bancões poderiam entrar no mercado e fazer a mesma coisa, mas nada acontece,” diz uma fonte próxima ao banco.  “E por quê? Porque a taxa média do rotativo dos cartões de crédito hoje é de 12% ao mês, e, quando tem o parcelamento do rotativo, emprestam a 9%. Ou seja, os grandes bancos não tem interesse nenhum em oferecer um produto mais barato.”  

Para efeito de comparação, a carteira de cartão consignado do BMG rende 3,3% ao mês, em média, o que faz de seu crédito um dos mais baratos no mercado de cartões.

O banco consegue emprestar (e ser rentável) nesta taxa porque seu canal de distribuição — os correspondentes bancários — é bem mais barato que o dos bancos.

Tipicamente, os correspondentes montam lojas Help (franqueadas exclusivas do BMG), montam lojas próprias ou coordenam times de ‘pastinhas’. As lojas costumam ser pequenas (20 metros quadrados), bem menores que agências bancárias, e, por não trabalharem com dinheiro vivo, não precisam arcar com os custos de segurança como carros fortes e portas giratórias.  Além disso, o funcionário de um correspondente bancário não é um bancário, que tem piso salarial de R$ 4 mil.

Hoje, 80% da originação do BMG vem de correspondentes não exclusivos, outros 17% vem das lojas Help, e 3% pelo canal digital.

No piso da faixa, o BMG levantaria R$ 1,3 bi e teria um valor de mercado de R$ 7 bilhões, ou 1,7x seu patrimônio líquido (post money).

Apesar da história ter lógica, o risco setorial ainda mantem alguns investidores à distância.

Num mercado em que todo mundo está tentando comer o almoço do vizinho, e onde as barreiras de entrada diminuíram, “o spread sobre a Selic está num high histórico,” diz um gestor desconfortável com bancos em geral.  “Como você justifica isso com a queda do risco-país? Parece ser apenas uma questão de tempo haver capital suficiente nos novos entrantes para essas taxas caírem.” 

Os coordenadores da oferta são XP, Itaú, Credit Suisse, Brasil Plural e Banco do Brasil.