Em meio à controvérsia sobre a fusão entre BRF e Marfrig, um detalhe parece ter passado despercebido pelo mercado.

Quando comprou 51% da National Beef, há um ano, a Marfrig deu aos minoritários da empresa americana o direito de vender os outros 49% da National Beef em caso de troca de controle.

Levando em conta o valor pago pela fatia majoritária, o exercício desta ‘put’ poderia adicionar cerca de US$ 1 bi — ou um pouco menos, se excluído o prêmio de controle — ao endividamento da companhia resultante da fusão, comprometendo a tese de redução de alavancagem que é um dos principais pilares da transação.

O contrato prevê que essa participação teria que ser avaliada a ‘valor justo’, a ser definido em comum acordo pelos acionistas ou por laudo de uma empresa terceirizada.

Duas fontes próximas à Marfrig afirmam que a companhia vem mantendo conversas com o Jefferies Financial Group — o principal minoritário da National Beef, com 31% das ações — para negociar um waiver (perdão) à opção de venda.  Nesse caso, se a troca de controle for de fato concretizada, seria desenhado outro contrato para amarrar os acionistas da National Beef à empresa resultante.

Uma das fontes diz que o Jefferies é ‘simpático’ à fusão entre BRF e Marfrig e não deve exercer a put.

Outros 15% da National Beef estão nas mãos de um grupo de pecuaristas americanos que têm contratos de fornecimento de longo prazo com a companhia.

Procurada, a Marfrig não quis comentar.

O acordo de compra prevê que os minoritários da National Beef podem vender à Marfrig um terço dos 49% restantes por ano a partir de 2023. 

Essa informação veio à tona num relatório de rating da S&P em agosto passado, quatro meses depois do anúncio da compra do controle da National Beef — o que na época enfureceu os minoritários da Marfrig, que não haviam se atentado para este ‘detalhe’ no fechamento da transação.

Mas as letras miúdas não acabam aí.

O contrato prevê que, em caso de troca de controle da NBM — a holding que concentra a participação da Marfrig na National Beef – os minoritários têm o direito de vender a integralidade de suas participações num período de até 60 dias.

As tratativas para a fusão entre BRF e Marfrig continuam sendo objeto de debate do mercado. Esta manhã, a Reuters disse que o acordo enfrentou oposição de representantes dos minoritários no conselho da BRF.

Recentemente, a BRF se desfez de seus ativos de carne bovina — com a venda de duas operações para a própria Marfrig — com o discurso de focar no seus ativos core e reduzir o endividamento. Na mesma linha, a Marfrig vendeu a Keystone, de comida processada, para a Tyson Foods.

As sinergias operacionais entre as duas empresas, que operam em proteínas e geografias distintas, ainda não estão claras para os investidores.