Na pesquisa para decidir se investia ou não em Fleury, Victor Furlan não teve dúvidas: bateu perna por diversas unidades do laboratório na capital paulista e conversou com os funcionários. Percebeu que o discurso em relação ao atendimento e os valores era muito alinhado com o dos executivos com quem conversou na companhia.
“Fiquei impressionado como o discurso da diretoria chegava na ponta, até o funcionário que atende o cliente. Isso mostra que o treinamento e a capacitação funcionam”, diz. Juntou essa impressão à sua análise sobre o potencial do setor e ao valuation da ação, e recomendou a compra do papel.
Poderia ser a história de qualquer analista criado no ‘value investing’, mas Furlan tinha 19 anos, estava no segundo ano da faculdade, e a decisão sobre o investimento em Fleury era parte do Constellation Challenge, a gincana para estudantes universitários promovida há três anos pela gestora de R$ 3,6 bilhões comandada por Florian Bartunek.
Furlan, que formou uma dupla com uma colega da FEA-USP, ficou em segundo lugar. Mas sua iniciativa e o insight sobre o treinamento dos funcionários do Fleury lhe renderam uma vaga de estagiário na gestora.
Desde o ano passado ele cobre o setor de consumo, replicando o modelo de trabalho que aplicou intuitivamente no desafio.
Nos últimos meses, para avaliar se entra novamente em Natura – que já esteve na carteira da Constellation há alguns anos, antes da companhia começar a perder mercado –, Furlan começou a trabalhar como consultor de vendas da empresa e dos concorrentes. “Estou em tudo que é grupo de Whatsapp da vendas diretas, da Natura à Hinode”, conta.
Estratégia de recrutamento singular num mercado que tende à padronização, o Constellation Challenge é uma espécie de intensivão sobre o mercado financeiro e análise de ações. Mas ao contrário de provas como o vestibular, sua popularidade só cresce. De 40 candidatos em 2015, foi para 288 no ano passado e 712 em 2017, vindos de nada menos que 127 faculdades.
“Mesmo nas faculdades de economia, administração, engenharia, as pessoas não conhecem muito bem a rotina do mercado financeiro e muito menos de uma asset”, diz Felipe David, sócio da Constellation que analisa os setores de educação, saúde e construção civil e hoje é responsável pelo Challenge. “Não ligo de perder um cara bom porque ele quer trabalhar para multinacional, para banco, para startup. Ligo de perder quem é bom porque não fiz nada para atraí-lo”.
A ideia do Challenge partiu de André de Souza Lima, na época estagiário e hoje, aos 24 anos, analista. André percebeu que a gestora gastava muito tempo entrevistando possíveis candidatos e tinha pouca visibilidade sobre o perfil de quem aplicava a uma vaga de estágio. “Era difícil saber se o cara tinha perfil, e aqui a ideia é contratar para ficar, virar sócio”, diz.
A Constellation lançou, então, o primeiro desafio, para avaliar a Linx, empresa de softwares de gestão para o varejo — um modelo de negócio complexo e pouco conhecido do público em geral. A pergunta é direta – “Você seria acionista desta empresa?” –, mas está longe de ser simples. A dinâmica do Challenge replica aquela que os sócios e analistas enfrentam no comitê de investimentos.
O desafio está enfrentando seus próprios desafios – de escala.
Antes, a Constellation conseguia disponibilizar os executivos das empresas escolhidas para que os candidatos tirassem dúvidas. Agora, para dar conta do volume de inscritos, já tem que recorrer à tecnologia: na última edição, pediu ao RI do Fleury, Rodrigo Manso, para fazer uma ‘live’ no Facebook, a única forma de atender todo mundo.
As inscrições para este ano estão abertas até o dia 22. Os candidatos só saberão a empresa a ser analisada depois do fim das inscrições.
Os finalistas ganham um curso ministrado pelos sócios da Constellation e o vencedor leva um prêmio R$ 4 mil. “A gente não quer saber se o candidato calculou o valuation super corretamente, quer entender mais como funciona a cabeça dele, quais as premissas que ele usou”, diz Felipe.
Segundo ele, a Constellation não se importa de treinar profissionais que amanhã podem ir para outras gestoras. “Nosso mercado tem menos visibilidade que um bancão, por exemplo. É um conhecimento que precisa ser disseminado. De quebra, tornou-se mais fácil ter acesso a boas pessoas de maneira rápida”, diz Felipe.
Ou, nas palavras de Charlie Munger que abrem o site da competição: “The best thing a human can do is help another human being know more”.
Na foto acima, os finalistas do Constellation Challenge 2017.