Cinco anos depois da estreia do MasterChef Brasil, a Globo finalmente tem um reality culinário para chamar de seu.
Mestre do Sabor estreou mês passado no horário nobre, como acontece com a Band, que exibe o MasterChef Brasil desde 2014. A própria Record se antecipou e lançou este ano o Top Chef, comandado por Felipe Bronze, dos restaurantes Oro e Bronze, e uma das estrelas da GNT.
Para escalar o mestre de cerimônias da atração, a Globo acertou no sabor: ninguém melhor que Claude Troisgros, o chef francês e Monsieur Simpatia que domina o Rio com marcas como o Olympe (de alta gastronomia), CT Boucherie, Le Blond, Chez Claude e CT Brasserie. Claude também é um rosto conhecido nacionalmente pela competição The Taste Brasil e a série Que marravilha!, ambos na GNT, sempre acompanhado de seu alter ego, o Batista.
Mestre do Sabor pretende eleger o ‘melhor chef do Brasil’ entre profissionais que já atuam no mercado – não, este não é um programa para amadores.
Para o júri, foram convidados três nomes de destaque no cenário da boa mesa nacional e internacional: Kátia Barbosa (do Aconchego Carioca), Leo Paixão (do Glouton, de Belo Horizonte) e o português José Avillez (dono de vários restaurantes em Lisboa e no Porto).
Já foram exibidos cinco episódios até agora, todos com plateia. Então por que esperar tanto tempo para escrever sobre o programa? Explico. Sempre com provas às cegas, os três primeiros episódios consistiam em eliminatórias para formar três equipes com oito participantes que são orientadas pelo trio de chefs convidados.
Ou seja, tudo caminhou em banho-maria na fase seletiva. Teoricamente, o programa deveria ganhar força a partir do momento em que começasse a ficar claro quem são os competidores. Infelizmente, não foi o que se viu na primeira eliminatória levada ao ar na última quinta. Continua faltando o ingrediente essencial a um reality: a emoção.
Tudo é cozido a fogo lento demais. Não há sal nem pimenta nas ações dos jurados e dos participantes. Nem a mudança da cor das luzes nas bancadas – de verde a amarelo com a vermelha nos últimos segundos para entrega dos pratos – pareceu abalar os competidores, que continuaram impávidos diante da falta de tensão.
Sequer a presença da madrinha Ana Maria Braga, a rainha do fogão e dona das manhãs de muitos brasileiros, ajudou a subir a temperatura no estúdio na eliminatória. Como a própria Ana observou, o cenário é grandioso demais e, numa cozinha, ainda que de estúdio, espera-se o mínimo de intimidade.
Na primeira eliminatória, ao comentar sua saída, a chef Mariana Pelozio estava convencida de que seu erro (o camarão fora do ponto) era mínimo e deixou competição com um sorriso estampado no rosto. (Mariana é ‘reciclada’ de outro reality: já participou do Hell’s Kitchen do SBT, no qual ficou em segundo lugar.)
Talvez um dos maiores entraves do programa seja o formato das avaliações com o trio Kátia, Paixão e Avillez ou a dupla Troisgros e Batista confinados numa sala-palco também colabora para derrubar a temperatura. Mostrar um pouco mais de garra dos participantes, de sede de vitória também atiçaria a chama, ops!, o calor dos fogões elétricos.
É bem verdade que a temperatura subiu um pouco no episódio da última quinta, mas apenas graças a uma cozinheira da Paraíba que arrancou lágrimas ao mostrar a força de uma culinária simples, baseada no milho. Foi ela quem escolheu os ingredientes essenciais da eliminatória: milho, quiabo e abóbora.
Seria solução fácil comparar Mestre do Sabor ao MasterChef Brasil, no qual o trio de jurados Paola Carosella, Erick Jacquin e Henrique Fogaça esbraveja o tempo todo e, assim, conquistaram o país de norte a sul. Não caio nessa arapuca.
O novo reality culinário da Globo se aproxima mais da estrutura (com provas às cegas) do The Voice Brasil, também exibido pela emissora. Não faltam, porém, risos e lágrimas à competição musical e sábias observações dos jurados especializados, coisa que falta no reality culinário.
Não é que os jurados do Mestre do Sabor não tenham conhecimento sobre o ofício. O problema é que sabem demais, e tem dificuldade em transmitir seu conhecimento.
Estamos falando de uma competição entre profissionais, é bom lembrar. Mas o grande público não tem a obrigação de ser especializado para não boiar diante de ingredientes e técnicas apresentadas. Sinto que por vezes o programa precisaria de legendas. Afinal, o que é umami? Quem tem obrigação de conhecer essa palavra japonesa surgida e patrocinada pela indústria de alimentos que equivale ao quinto sabor, depois do salgado, do doce, do ácido e do picante?
Não é só. Palavras como ‘emulsão’ precisam de explicação, assim como ‘tucupi negro’ e ‘pequi’, esse um frutinho de polpa espinhosa do Centro-Oeste brasileiro que a maioria das pessoas da plateia não conhecia quando Claude levou para ser provado. Pelo menos ficou-se sabendo que nibs são sementes de cacau torradas e moídas.
Embora ainda morno, coisa que dificilmente vai mudar por causa da estrutura de blocos do programa, existem méritos em Mestre do Sabor. A começar pelo apresentador com seu carisma gigantesco. Claude é aquele tipo de cara que todo mundo quer ficar amigo e passar horas conversando. Ainda que suaves demais, as avaliações são acertadas e, certamente, do trio convidado, Kátia Barbosa é quem vem conquistando o coração do público com um sorriso franco e avaliações numa linguagem mais clara para o leigo. Mas o maior mérito do programa talvez seja a expressiva representação de estados brasileiros, incluindo cidades que não são capitais. Agora é aguardar os próximos episódios.
Conheça as equipes, (escolhidas às cegas pelos chefs), o que permite montar um roteiro de visitas a restaurantes espalhados pelo país:
Time José Avillez
Ana Bueno (48 anos, paulista de São José dos Campos radicada em Paraty, onde mantém o restaurante Banana da Terra)
Djalma Victor (34 anos, mineiro de Sete Lagoas formado em Direito e dono do restaurante Osso, em Belo Horizonte)
Gabriel Coelho (31 anos, paulista de Presidente Venceslau, responsável pela merenda de um colégio particular paulistano, muito próximo de Claude Troisgros, já que em 2016 integrou o time do chef francês no The Taste Brasil e acabou em sexto lugar na competição)
Gustavo Young (36 anos, paulistano, ex-chef do bistrô Bagatelle e, hoje, sócio do restaurante em bufê Bacuri Cozinha, mais conhecido por ter sido jurado do SuperChef, no Mais Você e por ser irmão de Leonardo Young, o vencedor da terceira temporada do MasterChef Brasil)
Janete Borges (41 anos, paulista de São José dos Campos radicada em Florianópolis, é especializada em embutidos e frios feitos com pescados)
Lui Veronese (31 anos, brasiliense, tem passagens por vários restaurantes internacionais e atualmente trabalha consultor no Distrito Federal)
Rafael Lorenti (30 anos, paulistano, chef do restaurante Basilicata, que pertence à sua família, dona da centenária padaria de mesmo nome em São Paulo)
Thiago das Chagas (36 anos, pernambucano de Recife, onde mantém os restaurantes Reteteu Comida Honesta e São Pedro)
Time Kátia Barbosa
Amanda Grezzana (33 anos, catarinense de Joaçaba radicada em de Caxias do Sul, cidade no interior do Rio Grande do Sul onde faz doces para a confeitaria Carême Café)
Carol Albuquerque (38 anos, gaúcha de Porto Alegre, braço-direito da chef Helena Rizzo, do Maní, focada no desenvolvimento de receitas)
Felipe Oliveira (34 anos, mineiro de São João Del Rey, dono do restaurante Tiradentes, onde apresenta as próprias versões de pratos clássicos mineiros)
Fernando Vaz (39 anos, carioca e chef do Xian, de culinária franco-asiática)
Lili Almeida (38 anos, soteropolitana, dona do restaurante Casa da Dona Lili, em Salvador)
Lira Müller (32 anos, piauiense de Teresina, radicada Barrinha, litoral do estado nordestino)
Marcelo Cotrim (35 anos, mato-grossense de Cuiabá, onde está à frente da empresa de eventos culinários Cotrim Gastronomia)
Seichele Alves Barbosa (28 anos, sergipana de Aracaju, onde mantém o restaurante Seu Sergipe, especializado na culinária do estado)
Time Leo Paixão
André Barros (51 anos, goiano de Rio Verde, há quase duas década comanda o restaurante do Country Club de Goiás, em Aparecida de Goiânia)
Diego Gimenez (31 anos, paulistano, subchef de Emmanuel Bassoleil no restaurante Skye, instalado no Hotel Unique, e sócio de uma empresa de marmita fitness)
Dudu Poerner (27 anos, catarinense do Balneário Camboriú, onde é dono do restaurante Dudu)
Mariana Pelozio (33 anos, paulistana de Pinheiros, sócia do restaurante Duas Terezas, na região dos Jardins em São Paulo)
Raíssa Ribeiro (25 anos, paulistana e ex-participante da segunda temporada de MasterChef Profissionais e chef no restaurante Gabbana, em Campinas, interior de São Paulo)
Ricardo Caldas (47 anos, gaúcho de Porto Alegre, radicado em Florianópolis, onde é proprietário do restaurante Dolce Vita by Ricardo Caldas)
Roberto Neves (31 anos, paraense de Belém, é o atual embaixador da cozinha do Pará)
Viviane Almeida (22 anos, mineira de Belo Horizonte, onde trabalhou com Leo Paixão, seu técnico no reality, no restaurante Glouton)
Arnaldo Lorençato é editor de gastronomia da VEJA São Paulo.