Nevaldo Rocha, que com sangue, suor e tino comercial transformou uma lojinha em Natal no Grupo Guararapes, uma das maiores redes de varejo do País, morreu quarta-feira à noite após passar mal em casa. A causa da morte ainda não é conhecida.

Ele tinha 91 anos.

10237 c5cc8cab af95 0604 0000 082f1e42422e“Foi a pessoa mais brilhante que conheci,” disse Dorio Ferman, o sócio do Opportunity, que conheceu Nevaldo quando tinha 10 anos de idade.  “Meu pai foi o primeiro patrão dele, e depois foram amigos a vida inteira.  Nevaldo deixa um exemplo de capacidade e seriedade para todo o Brasil — um menino do interior que começou a vida pedindo uma oportunidade e no final gerou oportunidade para tanta gente.” 

Nevaldo Rocha nasceu em 21 de julho de 1928 em Caraúbas, no interior do Rio Grande do Norte, uma das regiões mais castigadas pela seca. Foi coroinha e escoteiro.  Ainda jovem, embarcou num pau de arara rumo a Natal, na esperança de ser recebido pela esposa do governador, segundo Henrique Araújo, editor do site Curiozzzo, especializado na história potiguar.

Segundo o site, a esperança do menino Nevaldo era embasada no fato de que sua mãe havia cumprimentado a primeira-dama numa quermesse, “um encontro casual que na cabeça do menino se transformou em promessa quase mágica de uma nova vida.” 

Depois de vagar dias pela cidade, Nevaldo arranjou emprego numa relojoaria. Na época, em plena Segunda Guerra, Natal era ponto de apoio militar para os EUA, e Nevaldo passou a oferecer relógios aos americanos e militares brasileiros na Base de Parnamirim.

Vendia muito.

O embrião do Grupo Guararapes começa em 1947, quando Nevaldo abre A Capital, uma loja no bairro Ribeira. Seu irmão Newton entrou de sócio.

Reinvestindo tudo e apostando numa confecção própria, Nevaldo abre uma loja em Recife em 1956, e em seguida mais quatro.

Em 1979, surge a grande oportunidade:  adquirir as Lojas Riachuelo, um movimento que expande o grupo para o Sudeste.

Segundo a Tribuna do Norte, Flavio Rocha recebeu a notícia em Brasilia, voou para São Paulo e em seguida iria para Natal. Mas o jornal diz que o sepultamento deve acontecer em São Paulo, onde está o jazigo da esposa, Eliete. 
  
Nevaldo já havia feito a sucessão patrimonial, mas ainda era formalmente o CEO da Guararapes, que além da Riachuelo é dona da financeira Midway e do Midway Mall, o shopping da companhia em Natal. A companhia tem 323 lojas e vale R$ 8 bilhões na B3.

 
Num detalhe excêntrico, ele nunca deixou que o shopping cobrasse pelo estacionamento, dizendo que isso afugentava o cliente e era “lucro ruim”. 

 
Nevaldo também passou décadas resistindo a pressões de investidores por mudanças na governança da Guararapes. Dizia que eram ‘desnecessárias’ e que só aconteceriam quando ele não estivesse mais entre os vivos.  Mas no final de 2018, mudou de ideia parcialmente: unificou as duas classes de ações, fez um desdobramento para melhorar a liquidez e melhorou a governança, mas a companhia ainda não foi para o Novo Mercado.
Agora, a morte do patriarca vai abrir a temporada de especulações sobre o futuro da companhia.  Ideias como a venda do Midway — frequentemente avaliado em mais de R$ 1 bilhão — devem prosperar.  A venda dos imóveis de 50 lojas próprias, idem. (Já uma fusão com a Renner, cogitada ao redor de 2009, hoje parece menos provável, com a Renner valendo R$ 35 bilhões.)

Mas antes, o mercado tem que refletir sobre este legado, uma trajetória brasileira tão inspiradora quanto cada vez mais improvável. 

Numa rara entrevista, Nevaldo listou as cinco palavras que o empurraram para frente: honestidade, simplicidade, foco, transparência e meritocracia.

Viúvo, ele deixa os filhos Flávio, Lisiane e Élvio.