Ernesto Zarzur, o filho de libaneses que com beijos calorosos e mão de ferro construiu uma das incorporadoras mais respeitadas do País, morreu hoje em São Paulo depois de duas semanas hospitalizado.

Ele tinha 87 anos.

11824 f94007d7 fbe5 b4ef 73e0 26ede3187b08A avó de Ernesto, Marta, enviou seus cinco filhos para o Brasil.  O avô resistiu à ideia, e o casal nunca emigrou.  Os cinco filhos tiveram sucesso empresarial.

A mosca do real estate mordeu diversos dos nove membros da geração de Ernesto. Seu irmão mais velho, Waldomiro, que morreu em 2013, construiu o maior arranha-céu brasileiro à época, o Palácio Zarzur e Kogan, concluído em 1966 no Vale do Anhangabaú, mais tarde renomeado W Zarzur.

A passagem de Ernesto levanta uma dúvida sobre a direção estratégica da EZTEC e impõe aos herdeiros a necessidade de construir consensos. O que aumenta as chances de sucesso: os irmãos trabalham juntos há 30 anos.

“Hoje quando você faz uma reunião na EZTEC, são vários Zarzurs: todos os filhos do Ernesto, netos e genros,” diz uma pessoa que faz negócios com a companhia. A empresa vale R$ 4,6 bilhões na Bolsa.

Apesar de afastado há dois anos do dia-a-dia da empresa, o patriarca ainda se fazia ouvir. Uma pessoa que fez negócios com a companhia lembra de Ernesto aparecer numa reunião e dizer, “Esquece o que essa garotada falou.  Eu quero assim assado.”  E mudava a negociação toda.

Seus quatro filhos homens ocupam a presidência da empresa em rodízio, um sistema criado por Ernesto em 2006.

Ernesto Zarzur nasceu em São Paulo em 28 de fevereiro de 1934.  Largou a escola e aprendeu a ler e a escrever em casa, com professores particulares.

Começou a vida trabalhando com o irmão mais velho. Mais tarde, quando os filhos começaram a se formar na faculdade, montou sua própria empresa, a EZTEC, em 1979.

A empresa foi para a Bolsa em 2007, num IPO 100% primário que colocou 35% da companhia nas mãos do mercado. No ano seguinte, a crise global fez a ação perder 90% do valor, e Ernesto segurou os lançamentos.

“Numa geração de incorporadores que cedeu à tentação de formar landbank e VGV sem pensar em rentabilidade, a EZTEC foi um ponto fora da curva de austeridade financeira, sempre capitalizada, o que lhe permitiu atravessar as crises e recessões melhor que a média do mercado,” disse um investidor do setor.

A EZTEC também conduziu melhor que outras empresas sua transição de incorporadora residencial para o negócio de properties: desenvolveu as duas torres da EZTower – uma vendida à São Carlos, a outra à Brookfield – e agora está construindo a Esther Tower, cujo nome homenageia a esposa de Ernesto, um casamento de 65 anos.

Talvez o maior diferencial da EZTEC seja a proverbial barriga no balcão: quando lançam um novo empreendimento, diversos membros da família passam o sábado no stand – dependendo do interesse do mercado, decidem na hora se podem subir o preço.

Ernesto tinha muito orgulho das raízes. Aprendeu a falar árabe com líderes da comunidade libanesa de São Paulo, reunidos no Clube Monte Líbano, que presidiu e onde sempre exerceu liderança, fazendo todos os presidentes nos últimos 30 anos.

“O Brasil nos ofereceu uma maravilhosa oportunidade de se desenvolver,” disse numa entrevista à TV libanesa há seis anos. “Quem trabalhou no Brasil teve sucesso. E o povo libanês viajou para cá pra trabalhar, não pra passear.”

Ernesto deixa a esposa, Esther, seis filhos, 17 netos e oito bisnetos.

O velório será amanhã no Hospital Sírio Libanês, e o enterro, no Cemitério da Consolação.

A repórter Chiara Quintão, que o entrevistou extensivamente ao longo de décadas, nota que o empresário deixa órfãos também os minoritários da EZTec. Numa entrevista a Chiara em 2014, Ernesto disse: “Eu me preocupo mais com meus acionistas do que com meus filhos. Meus minoritários precisam de mim.”