A Vinci iniciou a captação de um fundo para aplicar em ativos estressados da Argentina negociados nos EUA – uma aposta de que, apesar dos solavancos, as reformas de Javier Milei vão surtir efeito e entregar uma rentabilidade polpuda em dólares nos próximos meses.
A gestora enxerga assimetrias com prêmios generosos, diante dos grandes descontos dos títulos soberanos e dos papéis das empresas argentinas. A ideia é replicar o sucesso de um fundo com estratégia semelhante criado no início do governo de Mauricio Macri.
O fundo será offshore e aplicará apenas em papéis negociados nos EUA, por causa da maior segurança jurídica. O primeiro alvo serão os títulos públicos e outros ativos de maior liquidez. A gestão ficará a cargo de Daniel Gordonos, que também administrou o fundo criado em 2015, cuja rentabilidade bruta em dólar ficou em torno de 20%.
Pelo cenário traçado pela Vinci, será um fundo temático de curta duração, inferior a dois anos. Após o esperado fechamento dos prêmios decorrente da esperada recuperação no preço dos ativos, a Vinci entregará o dinheiro de volta aos cotistas.
“Hoje a Argentina é tecnicamente um mercado de fronteira, não um mercado emergente,” disse Gordonos. “Mesmo se o Milei não entregar todas as reformas econômicas prometidas, o país poderá ter uma elevação dos ratings e voltar a fazer parte dos índices de emergentes.”
Os papéis soberanos valem entre 30 e 40 centavos de dólar, chegando a ser negociados abaixo dos títulos venezuelanos em default. A eventual elevação do rating soberano de ‘CCC-’ para a faixa ‘B’ poderá dobrar o preço dos papéis.
O público-alvo do fundo são family offices e grandes investidores pessoa física com estômago para enfrentar a montanha-russa política e econômica dos próximos meses na Argentina. O lock-up é de um ano e, após esse período, será possível fazer resgates a cada três meses.
As dúvidas sobre o sucesso de Milei de colocar o país nos trilhos não são poucas, como ficou evidente nas dificuldade do Governo para passar no Congresso a ‘Lei Ônibus’ – um projeto de privatizações, ajustes fiscais e desregulamentações que nasceu com 664 artigos, foi desidratado à metade do original, e ainda segue com aprovação incerta.
A Vinci, contudo, enxerga ventos favoráveis no curto prazo que deverão se refletir na reprecificação dos ativos.
“Há enormes assimetrias, com preços muito estressados,” afirmou José Carlos Carvalho, sócio e estrategista de macroeconomia da gestora carioca , que segue a Argentina de perto desde os anos 90, nos tempos em que trabalhava no Pactual. “Vemos um risco/retorno muito bom em dólar.”
A gestora vê desafios a serem superados, como a inflação ainda rodando acima de 200% ao ano, mas projeta uma melhora nas contas públicas e no setor externo.
Os argentinos deverão colher uma grande safra neste ano. A receita com a exportação de grãos deverá subir cerca de 50%, para US$ 35 bilhões. Outro ponto a favor é a reversão no déficit da balança energética, com a crescente exportação de gás natural do campo de Vaca Muerta.
Os maiores riscos estão na seara política.
Milei tem uma personalidade mercurial e pouca experiência em negociações no Congresso. Mas, como destaca a Vinci, ele se cercou de ministros experientes e de diferentes correntes políticas.
Outro risco, aponta a Vinci, é a possível insatisfação de seus eleitores. O ajuste da economia colocará o país em recessão – e PIB em queda e inflação nas alturas são receita de corrosão e no apoio popular.