“Criei todo o meu trabalho em torno do blazer, foi o meu ponto de partida para tudo,” definiu o estilista e empresário Giorgio Armani – morto hoje aos 91 anos, em Milão  – no documentário Made in Milan, dirigido por Martin Scorsese em 1990.

Sem dúvida, uma declaração minimalista do homem que fez do minimalismo a base de sua criação, obtendo resultados maximalistas.

Giorgio Armani, a marca e a empresa que o estilista fundou com o seu companheiro de vida, Sergio Galeotti (1945-1985) 50 anos atrás, mais que uma grife de moda tornou-se um estilo de vida e um negócio global bilionário.

Acumulando as funções de designer, diretor criativo e chefe executivo, Armani desenvolveu a marca principal que leva seu nome, a linha mais jovem Emporio Armani, a mais acessível Armani Exchange – tendo o jeans como carro-chefe – e o exclusivíssimo Atelier Armani de alta costura, fundado em 2005 e que desfila em Paris. Sem falar nos Armani Hotels, Armani Cafés e a Armani/Casa, de móveis e decoração, que tomaram o mundo. Há ainda os cosméticos, os chocolates e até uma floricultura. Um império que materializou uma fortuna pessoal de cerca de US$ 12 bilhões e agora deve ser dividida entre duas sobrinhas, um sobrinho e Leo dell’Orco, o chefe da linha masculina e braço direito do maestro, segundo o Financial Times. No ano passado, o faturamento da empresa foi de US$ 2,7 bilhões. 

Ao longo das últimas décadas, enquanto a moda se tornava um negócio global, Armani mais de uma vez declinou convites para se juntar aos conglomerados de luxo, como a Kering e a LVMH. “A independência é a essência do meu trabalho e da minha companhia,” justificava.

Moda

 Desde o desfile da primeira coleção, em 1975, Giorgio Armani disse a que veio. A alta alfaiataria dos blazers de abotoamento transpassado, ternos e tailleurs longilíneos de ombros marcados, confortáveis calças com pregas e sobretudos longos acinturados no amarramento de compridos cintos de lã sugeria uma elegância ao mesmo tempo sóbria e suave – lã fria, cashmere, seda, musseline… – fluida e sensual e, acima de tudo, poderosa.

Tudo a ver com o espírito “vestido para comandar” que explodiria na década seguinte com a geração yuppie. A imprensa especializada não titubeou e o elegeu “o rei do blazer”. 

“Não há necessidade de se despir para se revelar. Tudo o que você precisa é de um blazer macio, desestruturado que caia naturalmente sobre ombros relaxados, livre de ajustes e ainda assim perfeito,” escreveu mais tarde em sua autobiografia, Per Amore.

Desde o princípio, o estilo Armani chamou atenção pela aplicação das técnicas da alfaiataria masculina no vestuário feminino. Nada de mulheres voluptuosas de silhuetas justas, como em Versace ou Dolce & Gabbana. Nenhuma explosão de cores, estampas ou excentricidades como em Gucci ou Prada. Giorgio também não comunga com o glamour palaciano de Valentino.

Para ele, a paleta de cores sempre foi a dos básicos infalíveis – cinzas, beges, preto e branco – temperados com terrosos e alguma borrifada de vermelhos encorpados, como o vinho. O brilho é sempre equilibrado: dourados escurecidos e prateados luminosos, como no art-déco dos anos 1920 e 30, sua época referência.

O homem Giorgio Armani é o cavalheiro bem nascido, como Gianni Agnelli. A mulher é adulta, sofisticada e decidida. 

O próprio estilista fazia questão de só exibir trajes sóbrios e um impecável bronzeado, mesmo no rigor do inverno. 

Giorgio Armani nasceu em Piacenza, no norte da Itália, e na juventude queria ser médico. Começou o curso de Medicina na Universidade de Milão em 1953, mas não completou os estudos. Alistou-se no exército, onde também não durou. Voltou para Milão em 1957 e começou a trabalhar como vitrinista na loja de departamento La Rinascente, onde dizia ter aprendido sobre negócios e vendas. Em seguida foi contratado como designer assistente na marca masculina Nino Cerutti, em 1965.

Aos 41 anos, foi convencido pelo parceiro, o arquiteto Sergio Galeotti, a vender seu Fusca e investir no negócio que se tornaria a Giorgio Armani. A combinação entre criatividade, visão artística, apuro técnico, faro para os negócios e um perfeccionismo alucinante deu frutos.

Armani foi um dos primeiros estilistas famosos a investir pesado na cultura pop e no entretenimento como veículo de divulgação e expansão de sua marca. No início dos anos 1980, assinou os figurinos de Richard Gere no filme Gigolô Americano, colocando sua marca na boca do mundo. É dele também o blazer preto vestido por Grace Jones na capa de seu álbum seminal Nightclubbing. Vestiu os gangsters e os policiais de Os Intocáveis, assim como Diane Keaton, Glenn Close, Jodie Foster e Julia Roberts para entregas de prêmios a partir de 1989, e nunca mais abandonou os tapetes vermelhos.

Costumava dizer: “Entrei na moda por acidente e então, aos poucos, ela cresceu e me absorveu, até roubar a minha vida”. E que vida.  

No comunicado emitido pela empresa, não foi revelada a causa mortis, apenas que Armani partiu cercado de familiares e amigos próximos. Mas ele já vinha dando sinais de uma saúde frágil, devido à idade. Em julho, pela primeira vez, deixou de comparecer aos seus desfiles durante a semana de moda masculina em Paris.

O comunicado também informa que o funeral acontecerá neste fim de semana, no Teatro Armani, em Milão, restrito à família e convidados. Uma grande cerimônia de comemoração aos 50 anos da marca acontece no final de setembro, com a abertura de uma mostra retrospectiva na Pinacoteca di Beri, também em Milão.