O pai de família Israel Araújo, de 41 anos, trabalha como pedreiro numa cidade de 50 mil habitantes do interior de Minas — o Estado que Aécio Neves governou e de onde, costuma lembrar, saiu com 92% de aprovação.
Em outubro, seu Israel, como é conhecido, pretende votar em Dilma Rousseff.
“Acho que ela está dando um bom seguimento ao governo do Lula,” disse ele à coluna em duas horas de conversa. “Não é tão bom quanto o do Lula, mas é bom.”
Apesar dos avanços dos outros dois candidatos e de seus próprios tropeços — como sua aparição de ontem no Jornal Nacional — a Presidente Dilma continua sendo a favorita para outubro, evidenciando a dificuldade da oposição em comunicar à maioria da sociedade, com eficácia, os problemas econômicos que se avolumam após 11 anos e meio de PT no poder.
A crítica à política econômica de Dilma é conhecida de quem lê os jornais e paga impostos: a economia cresce quase nada , a inflação está assanhada há anos, o gasto público explodiu, e os empresários só investem se forem ‘loucos’ (segundo um dos mais governistas da classe). Por fim, o partido que está no poder inspira dúvidas sobre seu compromisso com as liberdades individuais , o que afeta o ambiente econômico no longo prazo.
Seu Israel, no entanto, vê a coisa de forma diferente.
A coluna perguntou por que ele aprova o Governo Dilma. Em vez de apontar uma ou outra iniciativa do governo, Israel emitiu um veredito sobre os últimos 10 anos: “O brasileiro hoje come melhor do que uns 10 anos atrás. A alimentação melhorou muito. Antes o café da manhã era só um cafezinho mesmo, hoje já tem pão, leite, manteiga…”
Seu Israel, que mora no alto de um morro na periferia da cidade, tem uma renda mensal de 1.800 reais, além dos 60 reais que recebe do Bolsa Família para um de seus três filhos, a menina de oito anos. (O mais velho já saiu da idade elegível, e o do meio, de 16, foi cortado do programa por não ter ido à escola regularmente).
Nas eleições majoritárias, a busca da vitória é uma cruzada pelo Santo Gral do Mínimo Denominador Comum e pelo convencimento do “homem médio”, aquele centro de gravidade onde se sedimentam os raros consensos sociais, que então se transformam em mandatos e legitimidade.
Na campanha que elegeu Bill Clinton em 1992, o marketeiro James Carville fez história ao cunhar a expressão: “It’s the economy, stupid!“. Tudo que Clinton tinha que fazer era explorar o PIBinho de George Bush.
Mas com o Brasil ainda próximo do pleno emprego, a inadimplência ainda em patamares razoáveis e os ganhos de consumo da nova classe média ainda criando uma sensação de bem estar, a tarefa da oposição é mais difícil: falar dos problemas que ainda não estão à vista de muitos — mas que irão complicar a vida de todos a partir do ano que vem.
Seu Israel, o “homem médio” a ser convencido, entende de racionalidade econômica. Antes de se tornar pedreiro, ganhava a vida como pintor, mas resolveu mudar de profissão porque “todo mundo que perdia o emprego virava pintor, e aí não dava pra tirar a mesma coisa que antes”, disse ele. Além disso, a pintura de um apartamento dura apenas alguns dias, enquanto uma obra qualquer o mantem empregado por muitos meses.
Apesar de tomar decisões econômicas racionais, ele não consegue analisar a política econômica sob a mesma ótica.
A coluna perguntou a seu Israel se ele estava incomodado com a inflação e quem era responsável por isso. Sua resposta: “Acho que isso aí são os grandes empresários”.
Um banqueiro que acredita que Dilma será reeleita diz: “O boom econômico ainda não acabou, pelo menos na cabeça das pessoas. Ela foi eleita pelo boom e vai ser reeleita por isso. Você tem uma deterioração [da economia], e quem é mais sofisticado vê isso, mas essa piora ainda não é determinante para o povão.”
A cabeça do seu Israel é, assim, o campo de batalha onde as chances de vitória da oposição exigem o melhor do marketing político.
Como converter o voto deste brasileiro médio, mais decisivo para o resultado das urnas do que os partidários que fazem a guerrilha diária nos blogs, no Twitter e no Facebook?
Como mostrar para seu Israel que o bem-estar que ele sente hoje foi comprado com uma hipoteca sobre o futuro — e, pior, que a conta está prestes a chegar?
Como falar para este trabalhador sobre os esqueletos dos juros subsidiados, a distorção de preços que existe hoje na economia, como explicar que a inflação já está fazendo o trabalho que as políticas fiscal e monetária não fizeram, e que, se o rumo atual for mantido, sua renda amanhã será menor que a de hoje?
Os economistas sempre disseram que a grande dúvida desta eleição é se a economia vai enfraquecer rápido o suficiente para expor as más escolhas econômicas do Governo Dilma, e com isso virar o jogo… ou se a Presidente vai escapar por pouco.
Com as últimas pesquisas e o ‘fenômeno Marina’, muita gente já acha que a Era Dilma está chegando ao fim, mas, por via das dúvidas, convém combinar com seu Israel.