A reação do mercado ao tarifaço de Donald Trump tem mais a ver com os possíveis impactos políticos do que com os macroeconômicos.
A leitura de investidores locais é de que os motivos citados por Trump para impor a taxação tendem a fortalecer tanto Lula quanto Bolsonaro – e diminuir a chance de um nome mais ao centro na eleição de 2026.
Apesar de faltar mais um ano para a disputa, os investidores locais passaram a acreditar mais na vitória de um candidato moderado de centro-direita nos últimos meses – o que contribuiu para valorizar os ativos brasileiros.
Uma mudança nesta aposta probabilística eleva novamente os prêmios de risco. “O aumento da polarização é o que está guiando os preços dos ativos desde ontem,” diz um dos principais gestores de fundos do País.
O investidor estrangeiro está muito menos aterrorizado que o local. Segundo brokers, os gringos estão comprando títulos públicos e vendendo dólares na sessão de hoje, o que reduziu a depreciação do real ao longo do dia de 2% para cerca de 1% agora.
Na bolsa, o fluxo estrangeiro está errático ao longo do dia – e não claramente negativo. “O gringo é dois terços mais comprador que vendedor no pregão de hoje,” disse o chefe da mesa de equities de um banco americano.
A avaliação predominante entre os locais é de que Trump colocou Bolsonaro de volta ao jogo; o ex-presidente poderia, por exemplo, tentar negociar a retirada das tarifas (considerando a diplomacia pouco ortodoxa dos EUA atualmente) e ganhar capital político com isso.
Ao mesmo tempo, Trump deu a Lula a narrativa que as esquerdas historicamente sabem aproveitar como ninguém: a resistência a um inimigo externo.
“Não está claro se essa narrativa é suficiente para emocionar o eleitor no ano que vem, mas o fato é que um governo com baixa popularidade e pouco para mostrar acaba de ganhar um discurso,” disse outro gestor.
O risco é Lula acreditar na própria narrativa e pesar a mão na retaliação – o que não está no preço dos ativos.
Dependendo de como conduzir a resposta brasileira, o governo pode colocar o País numa espiral que não controla, nem em termos de prazo nem de resultado – o que poderia afetar a economia. Por enquanto, os preços de tela mostram que este desfecho é visto como pouco provável.
“Não fizemos grandes mudanças nas posições dos fundos, mas podemos fazer dependendo do que for anunciado como retaliação,” diz esse gestor.
Nas condições atuais, o mercado acredita que os efeitos na economia podem ser suavizados. Os principais produtos exportados para os EUA são commodities – especialmente petróleo e derivados, que respondem por quase 19% do total – e poderiam ser direcionados para outros países.
Para a XP, isso reduziria o impacto potencial da taxação. Mas, mesmo sem esse redirecionamento, o impacto no PIB tende a ser pequeno, de até 0,3 ponto percentual este ano.
Enquanto esse redirecionamento não acontece, o efeito é desinflacionário, já que podem sobrar produtos no mercado local. “As cadeias devem se desorganizar temporariamente,” diz um gestor.
Além disso, desde 2 de abril, quando anunciou tarifas sobre as exportações de dezenas de países, a Casa Branca renegociou e reduziu muitas delas. Para investidores e analistas, existe a possibilidade de acontecer algo parecido com a taxação brasileira.
“Os mercados têm uma reação inicial forte, mas acabam precificando o fato de que o governo americano acaba voltando atrás,” disse esse gestor.
Uma mensagem de Whatsapp que circulou agora à tarde entre executivos do mercado resume a confusão em três bullets:
– Não se pode subestimar a sorte de Lula.
– Não se pode subestimar a estupidez da família Bolsonaro.
– A eleição de 2026 será novamente acirrada e imprevisível.