O que acontece quando você substitui as condições monetárias mais líquidas da história do capitalismo com as condições mais restritivas desde a década de 70?
Uma crise bancária.
A solução dada ao Credit Suisse no fim de semana – depois dos casos do Silicon Valley Bank, do Signature e do First Republic – deveria ter arrancado um enorme suspiro de alívio do sistema financeiro internacional na noite deste domingo.
Mas não é isto que está acontecendo. Num sinal aparente de que antecipa novos corpos boiando, o Fed e outros grandes bancos centrais se coordenaram para aumentar a liquidez de dólares disponível aos bancos que usam suas linhas de swap, a partir de amanhã.
Assim, em vez de haver chegado ao fim, a crise bancária global está plenamente instalada, e é difícil dizer se este é apenas o fim do começo (nosso maior medo) ou o começo do fim (nossa maior esperança).
Enquanto perdurarem as atuais condições internacionais de liquidez – com o Fed tentando remeter a inflação aos níveis pré-covid – o foco do mercado continuará migrando para o próximo elo mais fraco da cadeia.
Ontem foi o Credit Suisse, amanhã será outro grande banco europeu ou americano – mas a possibilidade de que um deles quebre é remota, dado que, no playbook pós-2008, os governos nacionais já têm o manual de bailout no bolso.
“A questão hoje é saber se o Credit Suisse era o último ou apenas ‘o próximo’ da lista,” um grande banqueiro brasileiro disse ao Brazil Journal. “Enquanto não houver uma reversão da expectativa de subida de juros nos EUA, vai continuar quebrando gente.”
Como se sabe, os bancos americanos estão posicionados em papéis de duration longo que hoje valem menos do que seu preço de compra, e a inadimplência em vários setores da economia americana está subindo.
Nos EUA, os bancos regionais tendem a continuar sob pressão, e os bancos com exposição ao mercado de commercial mortgages cada vez aparecem mais nas conversas de bastidores com banqueiros.
Em meio a toda essa incerteza, “os bancos expostos a mercados ou segmentos que não vão bem e que sofrem com uma gestão fraca são os que estão mais a perigo,” disse um banqueiro com trânsito no mercado americano.
No Credit Suisse, a destruição de capital foi tão grande que até os chamados AT1 bonds – a dívida menos sênior do banco que negociava – virou pó, sequer sendo convertida em equity, como esperavam seus detentores. (US$ 20 bilhões voaram pela janela.)
Está cada vez mais claro que a onda de inflação que varre o mundo é o resultado direto de todos os superestímulos à economia global durante a covid – com uma ajuda decisiva da Rússia ao invadir a Ucrânia.
Agora, o Fed está tentando subir os juros até ter certeza de que enquadrou novamente a inflação – e isso está gerando mais disrupções ao sistema do que a própria pandemia.
“O sistema não aguenta o aperto monetário na proporção que o Fed está querendo,” diz um gestor macro. “Se continuarem nesta toada, vai quebrar mais gente.”
Na comunidade financeira americana, há cada vez mais vozes dizendo que o Fed está não ‘behind the curve’, mas ‘behind the data’ – ou seja, as condições da economia real são muito piores do que aparece no painel do banco central.
Elon Musk, que apita sobre tudo, palpitou sobre isso também num tweet no fim de semana: “The Fed is operating with way too much latency in their data. Rates need to drop immediately.”
No Brasil, muitos bancos que captavam a 98% do CDI já começam a pagar apenas 92%, com o investidor fugindo de papéis corporativos e buscando refúgio nos papéis bancários. Parece contraintuitivo, mas, justamente pela regulação pesada, o crédito dos bancos é o porto seguro em meio à crise.