Ao longo da última década, os investidores jogaram a toalha no setor de telecom.
Dona do maior peso no Ibovespa em seus dias de glória, a indústria se tornou um pântano de problemas societários e de gestão, com as empresas frequentemente entrando em concorrência predatória, colhendo resultados fracos e colocando uma bigorna sobre o preço das ações.
Mas dois eventos em curso — a venda da Oi Móvel e o leilão das frequências 5G — podem fazer o setor ficar interessante de novo, dizem gestores posicionados para o movimento.
Neste cenário, a TIM, a terceira maior tele do País e hoje umas das empresas mais “baratas” da bolsa, pode ser o ativo com maior upside.
A TIM negocia a 3,5x EV/EBITDA para 2022, e vale R$ 30 bilhões na B3. Para efeito de comparação, a maioria das teles em todo o mundo negociam ao redor de 6x EV/EBITDA.
A tese de investimento nas teles em geral, e na TIM em particular, é baseada num entendimento das especificidades do leilão de 5G e na evolução das teles em direção a um mercado mais racional.
Primeiro, ao leilão.
A Anatel marcou para 5 de novembro o leilão das faixas de frequência 5G, a nova geração da internet móvel. Ao contrário de outros leilões já realizados pelo mundo, o modelo brasileiro é melhor para as empresas por não ter um viés arrecadatório.
O custo das licenças será de somente 5% do que a Anatel estimou para o investimento de cada lote, e todo o restante será direcionado a atender obrigações de cobertura nos próximos oito anos.
Na maioria dos países que já fizeram o leilão do 5G, o alto custo das licenças e o capex monstruoso prejudicaram os retornos das empresas.
(Nos Estados Unidos, por exemplo, as empresas pagaram US$ 90 bilhões pelas licenças do 5G, além de ter que fazer investimentos na rede. No Brasil, as licenças vão custar apenas R$ 2,35 bilhões às teles, que no entanto terão que investir quase R$ 45 bi.)
“No Brasil, as frequências estão saindo praticamente de graça para as companhias em troca dos investimentos,” diz Victor Cerqueira, analista e sócio da Athena Capital, uma gestora com R$ 1,2 bilhão no Rio.
Mesmo com o alto custo do leilão do 5G, as ações das empresas americanas se valorizaram por conta das receitas adicionais esperadas com a nova frequência.
Segundo Victor, uma das principais aplicações do 5G hoje é o FWA (Fixed-Wireless-Access) — o equivalente à banda larga residencial, só que, em vez de a internet na ponta ser conectada por cabos de cobre (NET) ou fibra (Vivo, Oi, entre outras), o last mile da conexão é feita via radiofrequências.
Além de não focar na arrecadação, o modelo proposto pela Anatel também permitiu o compartilhamento de rede entre os participantes.
“Nessas condições, a chance de o 5G não dar retorno para as empresas diminui muito,” diz Roberto Knoepfelmacher, sócio da Vinci e gestor do fundo Mosaico, que discutiu o assunto numa carta aos cotistas em agosto.
A Vinci estima que as incumbentes poderão ter uma economia de cerca de 20% em relação ao capex orçado pela Anatel para o desenvolvimento do 5G em função de seu poder de barganha com fornecedores, o uso de infraestrutura pré-existente — como torres — e acordos de compartilhamento de rede.
Como se sabe, o 5G permitirá uma transmissão muito maior de dados com uma latência bem menor, e será a base de sustentação da Internet of Things (IoT). Na opinião da Vinci, a TIM tende a se beneficiar mais disso.
Além de não ter a a telefonia fixa e a banda larga por fio de cobre, cujas receitas são declinantes, a TIM saiu na frente na oferta de serviços para IoT, mesmo antes da implementação do 5G.
O CEO Pietro Labriola fechou acordos com a Fiat e empresas do agronegócio para manter carros e campo conectados, além de parcerias com o banco C6, a Cogna e empresas de saúde.
O segundo evento que pode reprecificar as teles é a definição da venda da Oi Móvel. Vivo, Claro e TIM formaram um consórcio e venceram o leilão em dezembro passado. A proposta das três é dividir os ativos da Oi e equiparar as três empresas em termos de espectro e market share nas diferentes regiões. A Anatel já se pronunciou de forma favorável à proposta, com alguns poucos remédios; a expectativa agora é pela aprovação do CADE.
Como a TIM é a menor das três operadoras, ela será a mais beneficiada, pois herdará a maior quantidade de clientes e de espectros, além de eliminar sua grande fragilidade, que é a falta de frequências.
Para ficar com 40% dos 39 milhões de clientes da Oi Móvel e 54% do total de radiofrequências da companhia, a TIM vai pagar cerca de R$ 7,3 bilhões, ou 44% dos R$ 16,5 bi que o consórcio vai pagar à Oi, nas estimativas da Vinci.
O relevante no caso do leilão da Oi é que foram vendidos apenas a base de clientes e os espectros, ou seja, os ativos, mas não a empresa. Assim, segundo a Vinci, os custos que as três teles terão para atender a nova clientela serão marginais, produzindo uma margem EBITDA de cerca de 70% sobre as receitas herdadas da Oi.
“Isso deve levar a margem EBITDA da TIM para um patamar superior a 50%”, diz Knoepfelmacher. A margem, neste ano, deve ficar perto de 48%.
A saída de um concorrente como a Oi (que sempre jogou os preços para baixo), a união das três teles para dividir os ativos, e o fato de nenhum novo entrante ter aparecido no leilão são sinais de que um grande problema do setor — a guerra de preços por clientes — é coisa do passado.
“Esse é um setor que já teve muita competição, mas agora está se consolidando. Acredito que há espaço inclusive para uma alta de preços”, diz Victor, da Athena. “O brasileiro é viciado em internet. Na média, a gente fica muito mais tempo online do que a população de outros países e paga barato por isso em comparação com outros países.”
Com todas as sinergias possíveis, reduções de custos e triggers positivos potenciais, a Athena acha que a TIM pode valer 60% a mais que seu market cap atual, de R$ 30 bilhões.
“As ações da TIM estão avaliadas perto de uma mínima histórica. O mercado ainda não colocou no preço nenhuma dessas opcionalidades”, diz Victor.
Hoje, a TIM é negociada na bolsa a 3,5 x EV/EBITDA para 2022, abaixo da Vivo, que está em 4,2x, apesar de metade do seu negócio não estar na telefonia móvel.
Para Knoepfelmacher, no contexto atual de deterioração da economia, o mercado busca histórias defensivas, e a TIM é uma delas.
“A TIM vem sendo muito estável. A empresa tem crescido ano após ano, mesmo quando a economia não vai muito bem”, diz o sócio da Vinci, destacando que a atual gestão deu um choque de eficiência na companhia, multiplicando a geração de caixa por 4,3x.