Após um hiato de quatro anos, Juliana Cury voltou ao Itaú como chief marketing officer com a missão de reformular o marketing do banco centenário e comandar o maior orçamento do País.
Três meses após assumir o cargo, a executiva fez sua primeira grande movimentação: redefiniu toda a estrutura da área que lidera.
“Nós estamos nos reorganizando, não fazendo um turnaround. O que estamos propondo é a especialização em algumas arenas que entendemos como fundamentais para o futuro,” Juliana disse ao Brazil Journal em sua primeira entrevista após assumir o cargo.
Antes de retornar ao Itaú – substituindo Eduardo Tracanella, demitido em dezembro de 2024 por irregularidades no uso do cartão corporativo – Juliana passou pela Zamp, a franqueadora do Burger King, e pelo Santander.
Depois de deixar o banco espanhol, cumpriu seis meses de garden leave e, nesse período, foi a Stanford estudar como manter a relevância de marcas já consolidadas em um programa de inovação para empresas estabelecidas – justamente o que considera sua meta: preparar o Itaú para os próximos 100 anos.
“O nosso desafio é menos sobre aumentar o orçamento e mais sobre como usar os recursos à luz da nova estratégia,” ela disse.
A seguir, os principais trechos da conversa.
Você deixou o banco para se aventurar no varejo. O que pesou na sua decisão de retornar ao marketing no setor financeiro?
O que me motivou a voltar foi o momento de revolução que estamos vivendo. Acho que os protagonistas desse movimento são os players incumbentes, que estão na vitrine se reposicionando.
Nesse contexto, o papel do marketing é enorme, porque ele não é mais só uma área de comunicação do banco. Agora estamos sendo convocados a ser uma área estratégica, de tecnologia, e a discutir produtos, clientes e canais. Depois que tive a experiência no varejo, que olha para todos esses aspectos, fiz esse paralelo e entendi que tinha bagagem para participar desse momento de transformação.
Com a saída polêmica do seu antecessor, o seu nome foi rapidamente anunciado como a nova CMO. Como foi essa negociação?
A minha volta é pautada em dois elementos que se sobrepõem em uma decisão absolutamente racional: poder assumir essa posição de liderança em uma das maiores marcas do Brasil e da América Latina e, do outro, houve também um componente muito emocional, pela relação com uma empresa que conheço muito bem.
Você saiu do Itaú em 2021. O que mudou no banco, no mercado e na forma de construir marcas nesse momento em que você retorna?
Estamos falando de um processo de continuidade e evolução da marca do Itaú. O consumidor hoje se relaciona de forma muito diferente com o mercado financeiro e com o dinheiro. Entendo que o marketing tem um papel essencial nesse momento, ainda ligado ao core de publicidade, comunicação e conteúdo, mas de um jeito diferente, a partir dos novos canais e formatos.
O que precisamos é estar muito mais conectados ao negócio, acompanhando um movimento cada vez mais fragmentado e com propostas de valor personalizadas para cada cliente.
Uma comunicação de marca mais one-on-one?
No limite sim. Porque o Itaú é uma marca que por anos se comunicou em formatos mais tradicionais e que agora se vê em novos contextos, nos quais quem produz o conteúdo e fala pela marca não é a própria marca, mas sim as pessoas, os influenciadores e os clientes narrando suas jornadas.
O papel do marketing hoje é reinterpretar a função do banco na vida das pessoas. E se ao longo dessa jornada conseguirmos ser memoráveis e transmitir alguma essência de marca, melhor ainda – é assim que se constroem grandes mensagens.
Hoje vocês lidam com a concorrência de fintechs e startups. Como tem guiado o seu time para esse novo desafio?
O setor mudou muito, e isso se potencializou no pós-pandemia, com os clientes experimentando o digital. Isso destravou um ambiente competitivo totalmente diferente para o banco, algo que já vinha acontecendo mas que agora se intensificou.
A busca desse novo ciclo no marketing vai ser por relevância, não por tamanho. É sobre como consigo ser a instituição mais relevante para o cliente que tenho, porque não vamos ser relevantes para todos os brasileiros.
Vamos olhar os clientes de forma cada vez mais individualizada, numa construção de marca e relevância muito mais granular. O desafio é apresentar a marca de forma personalizada. E vamos construir essa relevância conhecendo profundamente o cliente, com um marketing altamente pulverizado.
Seu retorno ao banco marcou uma reorganização da estrutura do marketing do Itaú. Como essas cinco frentes vão guiar a sua gestão?
Nós estamos nos reorganizando, não fazendo um turnaround. O que estamos propondo é a especialização em algumas arenas que entendemos como fundamentais para o futuro. A estrutura será dividida entre: Planejamento, Dados e Tecnologia; Marca Institucional; Product Marketing; Consumer Marketing; e Especialidades de Marketing.
As fintechs e startups têm investimentos em marketing muito menores quando comparados ao Itaú, mas conseguem um retorno expressivo. Como você pretende gerir o investimento em marketing de modo a equilibrar construção de marca e geração de negócios?
Nós vamos sempre buscar o maior retorno para cada real investido na nossa estratégia de marketing. Uma das nossas bandeiras é o foco em dados: queremos mensuração e alocação fundamentada em dados.
Uma estratégia cada vez mais robusta, que sirva de bússola para a alocação de investimentos. Hoje temos um orçamento condizente com o tamanho do banco, sempre com o desafio de alocar recursos nas principais arenas competitivas e nos desafios de marca.
Você pretende ampliar o orçamento da área, já que agora ela está atrelada não só à construção de marca, mas também ao desenvolvimento de produtos e a outras frentes do negócio?
O nosso desafio é menos sobre aumentar o orçamento e mais sobre como usar os recursos à luz da nova estratégia.
Essa é a pergunta que faço todos os dias aqui. Temos debatido muito sobre para onde apontar nossa lente e até demandado dos nossos parceiros – as agências – uma reinterpretação das estratégias e formas de inovação conjunta. Então, eu diria que é menos sobre aumentar o cheque e mais sobre ressignificar o nosso orçamento em um contexto com mais desafios na mesa.
O mercado tem questionado se a sua chegada pode gerar uma troca de agências. Você pretende abrir concorrência para escolher novos parceiros de publicidade?
Não, eu não tenho nenhum plano de abrir concorrência. São relações de longo prazo. O Itaú foi o primeiro cliente da África e o primeiro cliente da Galeria. São relações absolutamente conectadas, em que muitas vezes não se sabe onde termina o time do Itaú e começa o das agências parceiras.
A provocação que faço – na mesma linha do que falamos sobre orçamento – é que África e Galeria sempre se colocaram no centro da transformação junto com o Itaú. São parceiros que acompanharam a evolução do banco em uma relação de longo prazo. Por isso, não temos nenhum plano de mudança nessa parceria.