A Enter — uma startup que está usando inteligência artificial para ajudar grandes empresas em suas defesas jurídicas – fechou uma rodada com a Sequoia Capital.
A captação – que aconteceu há nove meses mas só agora está se tornando pública – é o primeiro investimento de um dos mais lendários VCs do Vale do Silício no Brasil, desde seu aporte no Nubank 12 anos atrás.
A Enter (anteriormente conhecida como Talisman) não abre o valor da rodada, mas diz que desde sua fundação levantou um total de US$ 5,5 milhões, o equivalente a pouco mais de R$ 30 milhões no câmbio de hoje.
A startup está se propondo a aliviar uma das maiores dores das grandes empresas brasileiras: os custos com processos consumeristas e trabalhistas, cujas provisões chegam a representar de 4x a 5x o lucro líquido das empresas.
“É muito atípico o que acontece no Brasil. Mais de 90% das ações trabalhistas do mundo estão aqui, e isso machuca muito os resultados das empresas,” Mateus Costa-Ribeiro, o CEO e cofundador, disse ao Brazil Journal. “Só em 2023, as empresas brasileiras foram processadas 15 milhões de vezes.”
Para atacar o problema, a Enter criou um agente de inteligência artificial que faz três coisas: entende porque a pessoa está processando a empresa; processa informações dos sistemas internos da empresa para compreender o que de fato aconteceu; e entrega uma defesa formal pronta para ser levada à Justiça.
A Enter começou sua atuação com os processos de consumidores contra as empresas, e o próximo passo será entrar também nos processos trabalhistas — que têm uma complexidade adicional por envolver audiências.
Por enquanto, a startup atende 12 grandes clientes, incluindo o Nubank, Banco C6, SulAmerica, BMG, Agibank, Vivo e Light.
Henrique Vaz, o outro fundador, diz que a inteligência artificial tem uma vantagem sobre o ser humano.
“O problema é que o humano não consegue dizer se existe alguma fraude no processo — por exemplo, se o comprovante de residência não foi listado ou se a pessoa pediu para não pagar os honorários de sucumbência mas recebe R$ 20 mil de salário,” disse ele. “Nossa IA faz todas essas checagens de forma muito rápida, o que ajuda a aumentar o êxito, mesmo para empresas que já têm um processo organizado.”
O agente de AI da Enter pode escutar, por exemplo, horas de ligação entre um consumidor e o SAC da empresa, para buscar inconsistências no processo.
Com isso, a Enter diz que tem obtido de 7% a 21% mais ganhos de causa com suas defesas feitas por IA, em comparação a uma empresa que faz a defesa sem o auxílio da tecnologia. Desde que foi fundada, a startup já gerou 34 mil contestações.
Mateus fundou a Enter depois de uma carreira precoce como advogado.
Aos 11 anos, foi diagnosticado como superdotado, e aos 14 entrou na faculdade de direito da UnB. Quatro anos depois se formou e foi aprovado de primeira na OAB, tornando-se o advogado mais jovem do Brasil.
No mesmo ano, fez história outra vez ao se tornar o advogado mais jovem a fazer uma sustentação oral diante dos ministros do STF: defendeu uma ação direta de inconstitucionalidade contra uma lei estadual do Rio Grande do Sul que proibia a revistas íntimas de patrões nos empregados.
Com 19 anos, foi fazer seu mestrado na Harvard Law School. Quando se formou, no ano seguinte, conseguiu passar na New York Bar, depois de pedir uma autorização para isso, já que a idade mínima para prestar o exame era 21 anos. Trabalhou um ano no Milbank, um escritório em NY focado no mercado de capitais, antes de ganhar a bolsa Knight-Hennessy Scholars para um MBA em Stanford.
Ficou apenas um semestre. Largou o MBA para fundar a Enter com Henrique, que era o CMO da Wildlife Studios e se formou em ciência da computação em Harvard, e Michael Mac-Vicar, um programador que co-fundou a Wildlife e ficou 13 anos na empresa brasileira de games.
Apesar de focada em processos jurídicos, Mateus não quer que a Enter seja categorizada como uma legaltech, e sim como uma empresa de “enterprise AI”.
“No futuro, podemos resolver outras dores das enterprises que não sejam apenas do mundo jurídico,” disse ele.
A rodada também teve a participação do fundo brasileiro Atlântico, e é a segunda da história da Enter.
No início de 2023, poucos meses depois de ser fundada, a startup levantou uma rodada seed com a ONEVC.