O impacto econômico da pandemia foi duramente sentido em todo o mundo e, em um esforço para evitar uma potencial recessão prolongada, muitos bancos centrais injetaram uma necessária liquidez em suas economias. Isso levou alguns investidores a procurar oportunidades de curto prazo para gerar retornos. 

Na CPP Investments, temos US$ 314 bilhões em ativos sob gestão e estamos nos mantendo fiéis a nosso horizonte de investimento. Inclusive para o Brasil e para toda a América Latina, onde hoje alocamos cerca de 4% desses recursos – e onde, independente da atual pandemia, temos apetite para mais do que dobrar nossa exposição nos próximos anos.
 
Por que pensamos assim?
 
Em quaisquer circunstâncias, mas sobretudo em momentos de elevada incerteza, o sucesso de um investimento estruturado agora para se desenvolver ao longo 20, 30 ou 40 anos depende fundamentalmente de duas variáveis: a qualidade intrínseca do ativo em questão e a parceria entre nós, investidores financeiros, e um operador ‘best in class’.
 
Pensando sobretudo nessa segunda variável, desenvolvemos um modelo de construir parcerias com empresas familiares, nas quais encontramos as características que distinguem os melhores operadores no mundo — e são ainda mais valiosas nesse mundo pós-covid que começa a se desenhar.
 
Somos os gestores dos recursos do Canada Pension Plan, ajudando a criar segurança de aposentadoria para gerações de canadenses. Para alcançar esse objetivo, adotamos uma visão de longo prazo e buscamos parceiros que compartilhem o mesmo horizonte de tempo, valores, cultura e boas práticas de negócios. Não por acaso, essas são algumas das características marcantes das empresas controladas por famílias.
 
Ao unir forças com uma empresa familiar, os investidores podem se beneficiar de seu conhecimento de mercado, comprovado histórico e disciplina de investimento. Na outra mão, as empresas podem se beneficiar de parcerias de longo prazo com investidores que trazem forte governança, décadas de experiência e uma perspectiva global de negócios. Com as rupturas financeiras do passado, aprendemos que – por mais tentador que seja reagir rapidamente – é a perspectiva de longo prazo que traz retornos duradouros. Para muitas empresas familiares, com perspectiva multigeracional, essa abordagem já está em seu DNA.
 
Em mercados em todo o mundo, empresas familiares são dominantes em setores-chave. Sejam empresas de varejo e tecnologia nos Estados Unidos, fabricantes de automóveis na Alemanha, empresas de telecomunicações na Índia, moda na Itália, serviços bancários na Espanha ou produtos de luxo França, todos esses mercados são liderados por empresas com um fundador forte ou controle familiar e com uma perspectiva de longo prazo sobre o retorno dos acionistas.

 
Nossa análise mostra que, na América Latina, 43% das maiores empresas são controladas por famílias ou por um grupo vinculado aos fundadores. Isso vale para várias das que foram capazes de superar seus concorrentes, sobretudo em momentos de volatilidade e estresse, quando outras empresas estavam focadas em cortar custos ou em desinvestir.
 
Um bom exemplo é o Grupo Votorantim, controlada pela mesma família há cinco gerações e com planos para muitas outras. Como muitas empresas familiares, a Votorantim tem apetite inteligente por risco, forte foco nos negócios, determinação e boa governança organizacional.

Outra história de sucesso é a da Cyrela, com quem iniciamos um relacionamento em 2009. Nossa primeira transação conjunta ocorreu no ano seguinte, com a Cyrela Commercial Properties. Hoje temos quase R$ 4 bilhões comprometidos com o grupo.
 
As empresas familiares tendem a seguir estratégias de longo prazo que se beneficiam do alinhamento entre desempenho e incentivos gerenciais. Seu investimento fixo e gastos em P&D são maiores e, como resultado, essas companhias tendem a superar seus pares. Nos 15 anos até o final de 2018, empresas com ações no mercado que são controladas por seus fundadores tiveram desempenho quase duas vezes superior ao desempenho anualizado do mercado (retornos de 17,8% versus 9,1% para o MSCI).
 
Elas também foram mais lucrativas, com ROE de 16,6% contra 11,3% em um período de dez anos, de acordo com um estudo do UBS com a PwC. Este trabalho constatou que a forte governança, os acionistas estáveis e as estratégias de criação de valor de longo prazo associadas a empresas familiares têm correlação com as companhias que superam os índices. Em particular, o estudo cita transparência, planejamento sucessório, direitos dos acionistas e metas para remuneração – todos indicativos de uma boa governança – como propulsores de desempenho.
 
Descobrimos que a parceria com empresas familiares pode trazer muitos benefícios para os investidores de longo prazo. Na melhor das hipóteses, são operadores de primeira classe, com profundo conhecimento de seus negócios e mercados, têm um longo histórico que pode ser avaliado e – sejam privados ou listados – resistem ao “curto-prazismo”.
 
A parceria com empresas familiares é uma estratégia eficaz para o desenvolvimento de ativos de longo prazo. Para acertar, no entanto, os investidores não devem pensar em transações de curto prazo, e sim em construir relacionamentos que durem gerações – como uma família.
 
Rodolfo Spielmann é managing director e head de América Latina da CPP Investments.