Aos 21, Marcio Martini largou o último ano da faculdade de engenharia para fundar a banda The Lírio com o irmão e dois amigos. Depois de cinco anos de estrada, os músicos perceberam que “aquilo resolvia nossa vida sexual, mas não a financeira,” e abraçaram uma oportunidade menos lúdica: assumir o delivery das redes Pizza Hut e KFC, então recém-chegadas ao Brasil.
Na época, 30 anos atrás, o mercado de entregas rápidas tinha zero glamour. Não havia Rappi e Glovo. O iPhone só chegaria 19 anos depois. E a profissão de motoboy – um pilar do negócio – sequer era regulamentada.
Assumindo um risco trabalhista cuja dimensão nem imaginavam – por exigência dos americanos da Pizza Hut, era preciso formalizar a mão de obra – a empresa de Martini cresceu, conquistou praticamente todas as redes de fast food e se tornou a maior empresa de last mile de comidas do Brasil.
No auge, a Speedy Service chegou a ter mais de 3.600 motoboys na folha (entre contratados e cooperados) e fazia 1,5 milhão de entregas de refeições/mês em todo o País.
Os problemas logo apareceram: uma avalanche de pedidos de indenizações de familiares de motoqueiros mortos acompanhou o crescimento da Speedy Service e foi drenando o caixa da empresa.
“Minha vida virou um inferno. Todo dia morria um motoqueiro, e eu ficava angustiado de saber que o camarada tinha saído de casa pra trabalhar pra mim e não ia voltar.”
De 1998 a 2010 – dez anos depois do início da Speedy Service até pouco tempo antes dela encerrar as atividades – o número de acidentes fatais com motociclistas no Brasil explodiu: de menos de 2 mil para mais de 13 mil por ano.
Teve ano que a empresa chegou a pagar 300 indenizações. Em 25 anos, foram mais de 2 mil ações.
Com o passar do tempo, a empresa passou a prever o comportamento dos juízes trabalhistas e, dependendo da Vara, já sabia se era melhor fazer acordo. “Fazíamos provisões para as indenizações e tenho orgulho de manter meu CPF limpo, ter cartão de crédito e conta em banco em meu nome. Levo uma vida confortável, mas sem dúvida estaria bem mais rico se não fosse pelos milhões de indenizações que tivemos que pagar.”
Há seis anos, Martini fechou a Speedy Service para focar em apenas uma das expertises adquiridas em mais de duas décadas de delivery. “O que eu tinha de mais relevante era a inteligência de gestão das entregas.”
Com R$ 2 milhões levantados com “friends & family”, Martini criou o Clube da Entrega, uma empresa de software de gestão que permite aos restaurantes gerir as duas pontas (a tomada do pedido e a entrega) e ainda ajuda a organizar a ordem dos pedidos na cozinha (ou no estoque) para agilizar a expedição.
Hoje, um restaurante recebe pedidos por telefone, email ou aplicativos “tomadores de pedido” como o iFood. Para realizar a entrega, o estabelecimento usa uma rede própria de motoboys, ou entrega por meio de apps de delivery como UberEats, Loggi e Rapiddo.
(Rappi e Glovo funcionam nas duas pontas, tomando pedidos e fazendo a entrega – seja de refeição, compra de supermercado ou qualquer outro produto.)
Agora, o Clube da Entrega faz parte da Maplink – empresa de geolocalização e logística da Movile – da qual Martini se tornou sócio e business developer.
Mas o tamanho do mercado de entregas e as novas regras do jogo estão animando Martini a voltar ao delivery. Além das novas tecnologias, a reforma trabalhista deu mais segurança.
“Só o iFood toma mais de 6 milhões de pedidos mês. Tem ainda entregas de farmácia, petshop…” diz. “Quero voltar a ter pelo menos 1,5 milhão de pedidos mês e consolidar esse mercado.”
Uma das vantagens de ter mantido o CPF limpo é que Martini ainda é dono da Complemento, uma empresa que faz entrega de maquininhas de POS para clientes como Cielo, GetNet e First Data. A empresa, em sociedade com o irmão, entrega cerca de 30.000 maquininhas/mês. Atende também Mc Donald’s, franqueados de China in Box e a rede de petshop Petz. Agora, quer entregar de tudo.
“Depois que saímos, o mercado se pulverizou e ninguém ocupou o espaço de verdade. Tem gente que diz que está bombando mas entrega só no Itaim. Quero ver entregar no Brasil todo.”
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