Dez anos depois dos eventos que mudaram sua vida e abalaram o mercado de capitais brasileiro, o empresário Eike Batista está saindo da concha para contar o seu lado da história.
Em outubro de 2013, a OGX pediu sua recuperação judicial. Era o final trágico de uma história de criação e destruição de valor que tinha Eike como protagonista.
Eram também tempos em que o Brasil crescia muito, Lula agia como um presidente pragmático e racional, e o empreendedorismo ambicioso de Eike – com projetos de infraestrutura transformadores – inspirava o País.
Quatro anos depois, o empresário passou 90 dias num presídio em Bangu, acusado de corromper o ex-Governador Sérgio Cabral. Durante o processo, o próprio Cabral admitiu que Eike não pedira nenhuma contrapartida, e que os US$ 16 milhões recebidos eram uma doação de campanha – mas no Caixa 2, uma prática ilegal mas comum na época.
De lá para cá, a saga de Eike virou livro e filme – sem que o empresário jamais colaborasse com os autores.
Mas na semana passada, Eike começou a publicar em suas redes sociais um documentário em quatro capítulos em que conta sua versão da história.
Gigante pela própria natureza foi produzido ao longo de um ano por Nicoli Rurik, que está trabalhando na construção das redes sociais do empresário.
Nesta conversa com o Brazil Journal, Eike explica o que o motivou a fazer o documentário e tenta desconstruir narrativas envolvendo a quebra da OGX e sua prisão.
Por que você decidiu fazer esse documentário?
Como existem múltiplas versões sobre a minha história, pessoas que não conviveram comigo, que não me conhecem, foram criando narrativas. E algumas pessoas, por razões comerciais, usaram minha história para ganhar dinheiro, vendendo livros e filmes. Mas só quem viveu a história sabe a verdade, por dentro, e eu tenho um acervo enorme porque sempre fiz muitos vídeos das operações e dos projetos sendo construídos. Sem esse acervo seria difícil juntar todo esse quebra-cabeça.
Além disso, tem muitas coisas sobre mim que pouca gente conhece. O meu espírito competitivo começa no esporte, onde eu fui campeão de offshore powerboat, que é uma espécie de Fórmula 1 dos mares.
Quais outros aspectos da sua vida você acha que as pessoas não entendem bem?
Eu acho que as pessoas não conhecem e não entendem a minha história pré-Brasil, que eu já tinha ganhado muito dinheiro com mineração lá fora, na Grécia, Colômbia, Rússia, República Tcheca… Em 1981, listei uma empresa no Canadá chamada Treasure Valley, de mineração de ouro.
Elas não sabem que eu fui forjado no estresse, no bullying da vida.
Por muito tempo, diziam que eu me meti em mineração porque o meu pai, que foi presidente da Vale, teria me dado ‘o mapa da mina’.
Acho importante as pessoas entenderem que não foi nada disso, que a minha história é uma construção pessoal. Muita gente também não tem noção do tamanho do legado dos meus projetos – e isso é muito importante para mim.
E quando as minhas empresas entraram em crise, em vez de tentar judicializar e começar a brigar – e você sabe como essa é a prática no Brasil – eu aceitei vender meus ativos a preços super baratos para que os novos sócios pudessem terminar os projetos. Sabe por quê? Porque projetos de bilhões de dólares não podem parar!
Eu tive até problemas em casa por conta disso, porque as pessoas não entendiam isso, falavam que eu tinha que ir para a briga.
Que avaliação você faz do livro e filme que saíram sobre sua história?
Tem partes que correspondem à verdade, mas é aquela história: o que é a história real de alguém se existem várias narrativas erradas? Acho que elas não valem nada.
Eu não contribuí na produção de nenhum deles. E no caso do livro, por exemplo, a narrativa foi muito baseada na visão dos executivos que trabalharam comigo, e que tiraram proveito das minhas ações.
Todo fim de ano, se eles não mostrassem resultado positivo não recebiam as ações, que tinham cinco anos de ‘vesting’. Mas se os cinco diretores da OGX sentavam na minha mesa e falavam que estava tudo uma maravilha, eu tinha que acreditar neles.
Eu era o presidente do conselho. Eu que montei as estruturas, fiz os IPOs e coloquei dinheiro meu. Mas depois eu entreguei as chaves para os diretores dessas empresas.
E a única delas que realmente falhou foi a OGX. As outras estão de pé até hoje, dando mais de 20.000 empregos e gerando caixa, bilhões de dólares.
Uma parte dos seus detratores são pessoas físicas que perderam muito dinheiro – em alguns casos, tudo – com as ações da OGX. O que você tem a dizer a elas?
Digo que eu afundei com as ações igualzinho a eles. Fiquei com eles até o final. E fui enganado pelos meus executivos. Essa é a história verdadeira – senão, eu estaria sentado hoje com US$ 10 bilhões, US$ 15 bilhões.
E lembre-se que vários investidores que investiram comigo saíram na hora certa. A OGX subiu 6x no IPO, então quem entrou na fase inicial ganhou 6x, porque saíram no IPO. Depois do IPO, por um período, a empresa ainda dobrou de valor.
Agora, eu continuei com as ações porque os meus executivos diziam que tinha 10 vezes mais petróleo do que realmente tinha.
Na minha história, eu sempre criei riqueza. Eu vendi a Minas-Rio por R$ 5,5 bilhões e ninguém lembra disso. Os investidores ganharam 10x comigo nesse investimento. Eu fiz isso mais de 20 vezes na minha história.
Agora, quando eu esbarro na OGX, eu não era engenheiro de reservatório, engenheiro de pré-sal ou pós-sal na costa do Atlântico brasileira. Eu tinha que confiar, porque o bônus dessa gente era tão grande que pelo menos honestidade eu achei que eles teriam…
Eu criei um sistema de remuneração de US$ 40 milhões/ano para os cinco executivos que me destruíram. Aí saiu um relatório de uma firma internacional que mostrava que realmente só tinha aquilo, que não tinha mais nada lá. Esses executivos mentiram e fizeram de tudo para receber os US$ 40 milhões de bônus por ano.
Olhando em retrospecto, tem algo de que você se arrependa?
Meu erro foi ter escolhido esses caras como executivos e ter criado essa fórmula desastrosa de remuneração para eles, que no final acabou prejudicando a mim e ao meu conselho.
Outro grupo de detratores são pessoas que associam a sua prisão às práticas que a Lava Jato combatia.
Primeiro que não tenho nada a ver com a Lava Jato, com Petrobras. Mas no ímpeto daqueles processos, todo mundo foi sendo jogado no balaio da Lava Jato nas narrativas da imprensa. Eu sempre tive dois partidos principais e todo ano escolhia alguns políticos que eu gostava para ajudar. O dinheiro do [ex-governador Sérgio] Cabral era um dinheiro oficial. Um cheque que eu assinei, que eu declarei oficialmente, e que quiseram colocar a narrativa como se eu tivesse recebido alguma contrapartida. Depois, ficou provado que não houve contrapartida nenhuma. O problema foi que, na última hora, ele pediu pra receber lá fora, numa conta pessoal, e esse foi o meu erro.
Nunca me apropriei de dinheiro público nem tive contratos ilícitos com a Petrobras ou outras estatais.