Para além de suas implicações geopolíticas, a vitória avassaladora de Donald Trump deveria servir como ultimato ao Governo Lula sobre a necessidade de uma mudança de rota na condução da política econômica em meio a uma transformação dos anseios do eleitor médio. 

Desde que assumiu o Governo, há dois anos – numa volta ao Poder tão espetacular e improvável quanto a do próprio Trump – Lula tem governado apenas para sua base, negligenciando (e muitas vezes afrontando) o centro político que lhe deu a sustentação essencial para a vitória. 

Defensivo e muitas vezes rancoroso, este terceiro mandato apostou em ideias que cheiram a naftalina e na desconstrução de qualquer medida (ainda que correta) feita pelo Governo anterior.

Apenas e tão somente para marcar uma posição política, o Lula 3 substituiu um teto de gastos que funcionava por um arcabouço fiscal que vive em crise existencial desde o dia em que foi parido. 

Setores do PT ainda tentaram mudar partes do Marco do Saneamento – uma das maiores políticas públicas a favor dos pobres já feitas neste País – bem como interferir na governança de ex-estatais como a Eletrobras e a Vale. (Em alguns casos, foram barrados pelo Congresso.)

Tudo isso criou o climão que está aí: juros asfixiantes, sem perspectiva de queda; dólar flertando com R$ 6; recuperações judiciais batendo novos recordes; e um crescimento de PIB bonito na superfície, mas medíocre tendo em vista o potencial deste País. 

É aqui que entram as lições da eleição nos EUA.

Mais uma vez, os eleitores votaram com o bolso. 

De pouco adiantou a Biden uma economia pujante, o desemprego em mínimas históricas e a Bolsa no all-time high. Os Democratas perderam em boa parte porque o americano médio, pressionado pela disparada no custo de vida, não sentia estar participando daquela prosperidade. 

No Brasil, acontece a mesma coisa. Segundo o Datafolha, 41% dos brasileiros acham que a situação econômica piorou nos últimos meses, enquanto 26% disseram que ela melhorou. 

Os anseios do eleitor médio também estão mudando (nos EUA e no Brasil). O fenômeno Pablo Marçal mostrou que o eleitorado está mais interessado num discurso de prosperidade e empreendedorismo do que de assistencialismo e Estado provedor. 

Lula deveria responder à vitória de Trump com uma guinada fiscal – não para agradar a Faria Lima, mas para se ajudar.

A alta do dólar e dos juros que o País viu hoje não deve se reverter tão cedo. As políticas prometidas por Trump, combinando desregulamentação interna e protecionismo externo, tendem a fortalecer a moeda americana.

A Fazenda e o Planejamento têm um cardápio de medidas em mãos. Especialistas em finanças públicas consideram que este cardápio pode conter a deterioração das expectativas, mas ainda é insuficiente para produzir os superávits necessários para impedir a alta da dívida pública. 

O Ministro Fernando Haddad foi convocado a dialogar com as pastas possivelmente atingidas pela redução de gastos – mas todos os ministros saem das reuniões dizendo que suas pastas não serão atingidas.

Os investidores haviam dado ao Governo o benefício da dúvida. Agora, o cenário externo ficou mais restritivo, e o Governo não tem nada para mostrar. 

O desequilíbrio nas contas públicas se aprofundou a despeito da forte alta na arrecadação; houve  retrocesso na transparência das contas públicas, e a criatividade parafiscal já supera os R$ 100 bilhões.  Este Governo fica a cada dia mais parecido com o de Dilma Rousseff: o aumento nos gastos públicos alimenta a inflação, o real se desvaloriza, os juros sobem e o potencial de crescimento de longo prazo diminui.

Não precisa ser assim.

Na volatilidade acentuada dos últimos dois anos, sempre houve redução nos prêmios de risco quando o Governo apresentou políticas sensatas no sentido de impedir uma trajetória explosiva da dívida. 

Se Lula não entender – finalmente – que a incerteza fiscal está engessando a economia, seu futuro político provavelmente será igual ao dos Democratas.

O modelo de gastos está claramente saturado: está quebrando o País sem trazer nenhum benefício de popularidade ao Governo. 

Talvez o presidente não queira fazer nada para agradar investidores, mas pode ter algum interesse em salvar seu Governo e seu partido de uma derrota acachapante daqui a dois anos.