Muitos CMOs experientes estão deixando o quentinho de uma grande empresa – com verbas volumosas e marcas nutridas por anos de investimento em branding – para desbravar startups cujas identidades ainda estão sendo formadas.
Frequentemente atraídos por stock options e promessas de crescimento exponencial, já na largada esses recém-chegados CMOs precisam convencer todo o time (muitas vezes dominado por engenheiros) de que investir em marca é muito mais do que queimar dinheiro comprando clientes. Um dos mais recentes movimentos foi feito pelo ex-CMO do BTG Pactual, André Alves, que trocou o banco por uma fintech em maio. Quando chegou no seu novo endereço, o primeiro impacto foi imediato: aos 51 anos, Alves já era a pessoa mais velha da empresa. Alves começou pelo básico: definir o gênero do Stark Bank, a fintech que tem entre seus investidores a Bezo Expeditions. (Até então, parte dos funcionários chamava o banco de “a StarkBank”.) Além disso, tomou outras ações básicas de branding, como alinhar o discurso, a postura dos funcionários e o posicionamento como um corporate bank. São coisas simples, diz Alves, mas fundamentais para que a fintech chegue aos clientes como um time da primeira divisão, competindo em pé de igualdade com os bancos que já estão há décadas no mercado. Os especialistas em branding costumam dizer que, por mais inovador que você seja, não dá para parecer uma empresa de fundo de quintal, improvisada. Isso é especialmente verdade para um banco que precisa vender – mais do que produtos – segurança, solidez e credibilidade.“O branding é uma escadinha em que esse investimento vai sendo somado, depositado na cabeça do consumidor,” diz Guta Tolmasquim, fundadora da Purple Metrics, uma startup de publicidade que mede o efeito do branding nas empresas. Na fase de investimento em branding, o famoso CAC, o custo de aquisição do cliente, já não é mais uma métrica, “porque o processo de convencer o mainstream não é imediato. Não é mais ‘viu, clicou, converteu’.”
Não importa quão descolado e disruptivo seja o produto, a experiência mostra que em algum momento a curva de novos clientes vai entrar em um platô e as métricas vão implodir, dado que o marketing de performance, aquele em que a empresa ‘compra’ o cliente, vai ficar caro. O Airbnb percebeu isso há alguns anos e fez uma mudança radical no seu investimento em marketing. Desde 2021, o balanço da empresa começou a sentir os efeitos positivos da decisão de reduzir os gastos com marketing de performance e focar em uma estratégia mais orientada para a marca e liderada pela área de relações públicas. Este ano, somente com matérias sobre a casa da Barbie, em Malibu, a empresa apareceu em 13 mil notícias veiculadas. O novo modus operandi do Airbnb virou um case matador para que os CMOs possam argumentar com seus founders sobre a importância de se construir marcas focadas em RP, diz Gonzalo Latugaye, diretor de marca global da Nuvemshop, que faz o e-commerce de pequenas e médias empresas.A Nuvemshop também embarcou no sucesso do filme da Barbie e conseguiu emplacar uma reportagem na CNN sobre como produtos cor de rosa tiveram um aumento expressivo no e-commerce de seus clientes. Latugaye diz que o retorno para a empresa, quando sua marca está na imprensa, é imediato. O executivo deixou a Mondelez há três anos para se juntar à Nuvemshop.
Mas nem sempre a mudança de um cargo em uma grande marca para uma novata dá certo. No caso de Stella Brant, uma ex-executiva da Ambev e da 99, o problema não foi a falta de visão do founder sobre a importância do branding, e sim um probleminha mais ordinário: a escassez de funding para as startups depois da bolha dos últimos anos. Stella se jogou no sonho de ajudar a construir uma marca preocupada com a alimentação saudável, a Liv Up. Mas no ano passado, a startup precisou reduzir custos e focar na geração de caixa. Era uma questão de sobrevivência. Foi aí que a CMO se mudou para a Afya, um misto de startup com empresa tradicional de educação focada em medicina. (A própria Afya já investiu em 12 startups.) “Aqui já comecei a catequização interna de que a construção da marca no longo prazo é sobre consistência, sobre colocar o cliente de fato no centro – e não só falar sobre seu produto.” Antes da Liv Up, Stella passou pela 99, uma startup com um investimento em marca gigante, quando comparada a outras. Cleber Paradela, que na época sucedeu Stella no cargo, disse que seu grande aprendizado na empresa foi transformar aquele marketing romântico do passado em um marketing que caminharia na mesma velocidade da performance.A 99 queria construir marca, mas a performance continuava a todo vapor. Paradela criou um guia de marca flexível para ser ajustado rapidamente. “Eu tinha um template com bancos de texto e imagem e títulos, tudo muito organizado para acompanhar aquela velocidade.” Em vez de levar dias, semanas ou meses, em poucas horas uma campanha estava pronta.
Isso ajudou Cleber a se tornar o diretor global de creative marketing da Didi, a empresa chinesa que comprou a 99. No ano passado, ele deixou a startup de mobilidade e foi para a Juntos Energia, onde usou a expertise da 99 para fazer parcerias com empresas como os Correios para vender energia solar a pessoas físicas. Paradela diz que as startups estão mais preparadas para os novos CMOs. “Eu cheguei na Juntos na ressaca dos unicórnios. Tudo o que deu errado criou uma nova geração de startups, com o pé no chão, focada em crescimento mais sustentável e que não dependa somente da queima de caixa para comprar clientes.”