Quando foi contratado para comandar a Nextel, Roberto Rittes entrou num prédio em chamas.

A companhia perdia clientes pelo ladrão, era odiada por boa parte dos que ainda permaneciam e tinha uma geração de caixa operacional muito negativa.

10810 63d97c17 dc35 4809 75f9 9c3ea8fec6f3Nos primeiros três meses depois de sentar na cadeira, o novo CEO viu a companhia perder 180 mil clientes, enquanto o churn — que mede o percentual de clientes abandonando a empresa — rodava acima de 4% ao mês nos serviços 3G/4G, muito acima da indústria. (Na época, a Nextel ainda oferecia o serviço de rádio.) 

Em dois anos de trabalho, Rittes virou o jogo e deixou a Nextel pronta para ser vendida para a Claro, que pagou R$ 3,5 bi pela operadora em março deste ano.  Com a compra, que ainda aguarda aprovação do CADE, a Claro se torna a segunda maior operadora móvel do Brasil, com 26% de participação de mercado, atrás da Vivo, com 31,9%.  A aquisição também fez do grupo mexicano o líder absoluto em espectro, o insumo fundamental para dar vazão à demanda crescente por dados.
 
A história de como um recém-chegado CEO conseguiu estabilizar um navio que afundava ilustra o potencial de ganho que existe para as grandes empresas que ousam adotar um mantra mais comum às startups: colocar a experiência do usuário no centro do negócio.  

Em sua primeira reunião com a equipe, Rittes — o quarto CEO da Nextel em apenas quatro anos — disse aos executivos que, em vez de “um plano de 100 dias,” a situação era tão grave que teriam que adotar um plano de 50 dias.

A primeira medida:  “Vamos ganhar esse jogo por ser a empresa com melhor atendimento. Esse vai ser o nosso diferencial.”

Rittes começou a atacar todas aquelas coisas que enlouquecem o cliente das operadoras.

Para isso, criou uma espécie de SWAT do atendimento — um time chamado de “Eu Resolvo” — que chegou a ter 500 pessoas.

O prazo máximo para resolver um problema caiu de 5 dias para 1 dia.  (Antes, a Nextel resolvia menos de 20% das queixas de clientes em 1 dia; hoje, resolve 90%).

Outras regras que oneravam o cliente também foram mudadas.  Por exemplo, quando havia questionamentos de fatura, o atendente tinha autonomia para resolver disputas de até R$ 15.  Rittes aumentou a alçada para R$ 50 e, mais recentemente, para R$ 100.

“A regra havia sido criada pensando no espertalhão que liga para dar o golpe, mas nós invertemos essa lógica,” diz Rittes.

Planos antiquados — cheios de letras finas — foram substituídos por planos simples e ilimitados.  (A ligação de um cliente que mora em São Paulo para Santos gerava cobranca adicional de longa distancia, mas isso só ficava claro quando o cliente recebia a conta.  Um SMS custava R$ 0,39, mas o custo também era escondido.)

Nas medições internas da empresa, o NPS da Nextel subiu de 13 para 33 em nove meses.  Ainda é um NPS baixo, mas  a empresa foi a grande ganhadora da última pesquisa anual de satisfação e qualidade da Anatel e já tem uma “carinha verde” no Reclame Aqui.  O churn caiu dos 4% em meados de 2017 para 2,6% agora.

Nos últimos dois anos, gigantes do setor como Vivo e Claro também passaram a incluir a satisfação do cliente (o NPS) no cálculo da remuneração de seus executivos e criaram programas para melhorar o atendimento.

Rittes — um ex-analista de M&A do UBS que teve seu primeiro job na indústria na Brasil Telecom — também atacou o lado financeiro e operacional.

Implantou o orçamento base-zero e reduziu o headcount em 30%. “Criamos uma estrutura mais horizontal, cortando um nível hierárquico em algumas áreas e dois níveis em outras,” diz. 

O enxugamento foi feito em cima da reengenharia de processos, injetando mais tecnologia na rotina da empresa. Mais de 150 processos operacionais foram automatizados, e hoje a Nextel tem cerca de 650 robôs executando funções que antes eram feitas por humanos. 

Uma das funções:  a mudança de plano requisitada pelo cliente.  Desde que começaram a executar a tarefa, os robôs já trocaram cerca de 1,4 milhão de planos.  Isso equivale a uma pessoa trabalhando oito horas por dia, cinco dias por semana, por 70 anos.

No departamento jurídico, as ações contra a empresa que vinham dos tribunais de pequenas causas eram recebidas por uma empresa terceirizada onde estudantes de direito geriam tudo usando um software.

Além de trocar a ferramenta por outra que custava um terço do preço, a Nextel percebeu que os estudantes de direito tinham uma rotatividade alta: 20% por mês.

A resposta de Rittes foi colocar menores aprendizes que trabalhavam na Nextel para lidar com a tarefa: além de cadastrar as informações dos processos no software, eles passaram a ligar para os clientes propondo acordos e a participar dos squads de melhoria do atendimento. Bottom line: o número de novas ações caiu 50% em um ano.

Lembrando dos anos em que trabalhou na Brasil Telecom e na Oi, Rittes diz que “em telecom, 20 anos se passaram e continua tudo igual. As empresas continuam altamente burocráticas e hierárquicas.”

Em 2018, a Nextel foi a operadora que mais cresceu a base de assinantes em relação ao ano anterior, um ganho de 14%. Concorrentes dizem que a operadora tem uma política de crédito muito agressiva e está enchendo a base de assinantes com clientes de má qualidade.

A companhia — que no ano passado fez uma promoção focada nos negativados aproveitando a discussão do tema na campanha eleitoral — diz que seu modelo de negócios consegue atender este perfil de cliente de maneira rentável.