A compra do Credit Suisse pelo UBS criou um precedente perigoso para um título de crédito extremamente popular na Europa: os Contingent Convertible Bonds, ou simplesmente CoCo Bonds.

Esses títulos – também conhecidos como Additional Tier 1 Bonds (AT1s) – foram criados depois da crise financeira de 2008 com o objetivo de dar aos bancos formas adicionais de atender as exigências de capital regulatório (sem precisar diluir os acionistas).

Na prática, os CoCo Bonds são o degrau mais baixo da dívida bancária. Em outras palavras: eles pagam retornos elevados, mas são os últimos na fila do pão (dentre os credores) se o banco for à falência. 

Esses títulos, no entanto, ainda têm prioridade em relação aos acionistas, que são os últimos a receber qualquer coisa quando uma empresa quebra. 

Na venda do Credit Suisse, no entanto, não foi isso que aconteceu. 

Ao mesmo tempo em que os acionistas do CS vão receber ações do UBS equivalentes a US$ 3,3 bilhões, os reguladores decidiram fazer um write-off completo dos CoCo Bonds do banco – transformando US$ 17 bilhões que estavam alocados nessa dívida em pó.

O write-off foi desenhado para fortalecer o balanço do novo banco que nasce da transação – mas cria um precedente perigoso para um mercado que soma mais de US$ 275 bilhões em títulos emitidos. 

Segundo a Barron’s, a notícia já mexeu com alguns ETFs que investem nesses bonds. O Invesco AT1 Capital Bond ETF caiu mais de 6% hoje, enquanto o Wisdom Tree AT1 Coco Bond ETF caiu outros 9%. 

“Os reguladores parecem dispostos a sacrificar os direitos individuais no altar do bem comum,” escreveu um analista da Gavekal, segundo a revista. “Quebrar o mercado de CoCo Bonds significa que, na próxima crise, os bancos terão que se financiar de novas maneiras, ou os acionistas simplesmente enfrentarão uma diluição maciça.”

Para acalmar os investidores, os reguladores da União Europeia e o Banco da Inglaterra divulgaram comunicados reafirmando que – pelo menos nos mercados regulados por eles – os CoCo Bonds manterão sua prioridade em relação ao equity, ou seja, só sofrerão perdas depois dos acionistas. 

(A Suíça não faz parte da União Europeia, e não parece disposta a mudar sua decisão.)

Um banqueiro brasileiro disse ao Brazil Journal que sempre achou os CoCo Bonds um risco mal precificado. 

“Quando saiu a regulamentação, eu li e proibi todo mundo de operar isso porque era extinguishable,” disse ele. “A cláusula da regulamentação da Basiléia era muito dura.

Era a critério do regulador. O risco estava lá, mas ninguém lê nada…”

A saída para os investidores dos CoCo Bonds do CS deve ser entrar na Justiça. Segundo a Barron’s, o escritório Quinn Emanuel Urquhart & Sullivan já está examinando o caso.

Em 2017, o escritório trabalhou num caso semelhante – que teve decisão favorável aos bondholders – envolvendo o Banco Popular. O banco espanhol foi comprado pelo Santander e também viu seus CoCo Bonds virarem pó.

A escala, no entanto, foi muito menor: os CoCos somavam US$ 1,5 bilhão. 

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