A decisão de Pérsio Arida de deixar o BTG Pactual, anunciada sexta à noite, acontece num momento em que aumentam dentro do banco a insatisfação e a tensão com os rumores sobre uma possível delação premiada de André Esteves.
Com a saída de Arida — um dos maiores estudiosos da inflação brasileira, ex-presidente do Banco Central e um dos pais do Plano Real — o BTG perde o verniz acadêmico que ajudou a suavizar a imagem do banco desde seu IPO e um sócio que lhe emprestou credibilidade quando o banco se viu no olho do furacão.
Ao anunciar sua partida, o BTG disse que Arida vai se dedicar a seus ‘interesses intelectuais’, e caracterizou o movimento como uma mera continuidade do que acontecera em novembro, quando Arida renunciou à presidência do conselho e deixou de ter funções executivas no banco.
Apesar da escolha cuidadosa de palavras, o economista estava pedindo para ir embora há meses, mas a sociedade que controla o BTG resistia.
O desligamento de Arida vem num momento em que outros sócios do banco gostariam de experimentar a mesma liberdade — mas não podem, graças às regras que os mantêm presos à partnership.
Endurecidas recentemente, essas regras são frequentemente chamadas de ‘algemas’ por ex- e atuais sócios do banco.
A principal delas é a regra de entrada e saída na sociedade. Desde o início, a regra era que os sócios compravam e vendiam sua participação a valor patrimonial. Mas no início de 2014, o banco mudou a regra de saída: agora, os sócios têm que vender suas ações no menor de dois valores: o patrimonial ou o de mercado. Com a queda das ações depois da prisão de Esteves, isso gerou uma armadilha. Como a compra da participação é feita pelo valor patrimonial e financiada pela partnership, e como o valor de mercado hoje é bem mais baixo que o patrimonal, muitos sócios não deixam o banco por não terem como quitar sua dívida com a partnership.
Em Londres, Antoine Estier e outros sócios do BTG que eram responsáveis pela gestão do fundo GEMM do banco ameaçaram ir à Justiça para receber sua participação a valor patrimonial.
Em janeiro de 2016, outra inovação: a criação do conceito de ‘good leaver’ e ‘bad leaver’, isto é, os sócios que saem do banco ‘de bem’ ou ‘de mal’ com a instituição. O ‘bad leaver’ é forçado a vender suas ações ao valor patrimonial de um ano antes. Como o valor patrimonial do banco sobe cerca de 20% ao ano e como a dívida é ajustada pelo CDI, isso equivale a uma glosa de mais de 30%. Além disso, a definição de ‘bad leaver’ é discricionária, aberta à interpretação dos principais sócios.
Em cima de tudo isso, há alguns anos, quando 10 executivos deixaram o BTG para trabalhar na Geração Futuro, a partnership impôs um ’non-compete’ de seis meses, o que hoje dificulta a contratação dos sócios atuais por terceiros.
As regras foram desenhadas por Jonathan Bisgaier, ex-advogado do Skadden Arps que ajudou Esteves na recompra do banco e se tornou o general counsel do BTG.
As regras ficaram ainda mais duras há pouco mais de um mês, quando o banco passou a obrigar os sócios a responder com seu patrimônio pessoal em caso de quebra do banco ou da partnership. Como a compra das ações sempre foi financiada por uma dívida ‘non-recourse’, a decisão revoltou muitos sócios por representar uma mudança na regra do jogo e significar, na prática, que a sociedade quer reduzir seu risco avançando sobre o patrimônio pessoal dos sócios.
Ainda que descontentes, os sócios não podem se insurgir contra a mudança por um detalhe pouco conhecido por gente de fora do banco: quando entram na sociedade, os novos sócios assinam uma procuração dando plenos poderes à partnership, inclusive o poder de mudar as regras. A procuração também dá à partnership o direito de recomprar as ações dos sócios a qualquer momento. E, aumentando ainda mais a incerteza, os sócios não ficam com uma cópia do ‘partnership agreement’.
“Eles colocam um papel na tua frente e fazem você assinar um monte de coisa no dia-a-dia, mas ninguém fica com uma cópia do partnership agreement,” diz um sócio. “Se eles fazem adendos ou atualizações, você não fica sabendo.”