Wilson Ferreira Júnior, que foi nomeado CEO da Eletrobras pelo Governo Temer para reestruturar a companhia e prepará-la para a privatização, renunciou ao cargo neste domingo.

No Fato Relevante em que comunica a renúncia, a estatal diz que Wilson alegou motivos pessoais e fica no cargo até 5 de março. Ele fará uma teleconferência com o mercado amanhã.

10291 839cecde 002d 0059 09e1 c8172e533b0aA renúncia reduz ainda mais as chances de que o Governo Bolsonaro privatizará a Eletrobras, uma das maiores estatais do País e pronta para ser vendida há anos.

A presença de Wilson — um dos CEOs mais experientes do setor e uma unanimidade entre os investidores — ajudava a valorizar a companhia, e sua continuidade no cargo depois da privatização era o cenário-base de qualquer analista minimamente informado.

A renúncia também deve despertar o apetite pantagruélico do Centrão pelo cargo, impondo um teste ao Presidente Bolsonaro:  achar outro nome técnico e acima de qualquer suspeita, ou mergulhar na fisiologia que sempre condenou no palanque.

A renúncia — no início do penúltimo ano do Governo Bolsonaro — sugere que o CEO não via a privatização como provável na segunda metade do mandato. 

Os sinais, aliás, estão em toda parte.

Na semana passada, o favorito à presidência do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) — que é apoiado por Davi Alcolumbre e pelo Presidente Bolsonaro — se disse a favor das privatizações em geral, mas adotou linguagem populista ao falar do assunto, alertando para o “entreguismo sem critério.” 

No geral, a classe política está usando a incompetência de uma empresa privada — que levou ao apagão no Amapá — para dizer que o setor elétrico está melhor nas mãos do estado, um raciocínio que zomba da inteligência dos brasileiros à luz da história recente.

“Não é um raciocínio fácil dizer que a Eletrobras precisa ser vendida,” disse Pacheco. “Episódios recentes da vida nacional demonstram que a iniciativa privada  é muito boa, mas por vezes não tem compromisso social que o setor público tem.” 

Certamente o Senado Federal está preocupado com o “compromisso social”, e não com os cargos e contratos que as estatais oferecem — como ficará claro quando Pacheco, Alcolumbre e Bolsonaro colocarem outro nome técnico, da envergadura de Wilson, no comando da Eletrobras.

A ação da Eletrobras chegou a cair 10% em dois pregões após Pacheco revelar sua visão de mundo.

A renúncia é um golpe para a 3G Radar, o maior investidor privado da estatal, com 10,3% das ações PN. A gestora montou a posição há anos apostando na tese da privatização.

Quatro anos depois de assumir o cargo, Wilson entrega uma Eletrobras mais leve e mais rentável.  

Logo ao chegar à companhia, no rescaldo da Lava Jato, o novo CEO concluiu as investigações sobre corrupção na empresa e entregou à SEC os balanços auditados pendentes, permitindo que as ações da companhia voltassem a ser negociadas em  Nova York.  

Começou a vender distribuidoras de energia deficitárias e a reduzir o emaranhado de 178 sociedades de propósito específico (SPEs) que havia debaixo da empresa — tudo isso batendo de frente com sindicatos e resistindo à pressão política.

Numa reunião com sindicalistas em 2017, explodiu:

“São 40% da Eletrobras… 40% de cara que é inútil, não serve para nada, tá aqui ganhando uma gratificação, um telefone, uma vaga de garagem, uma secretária. Vocês me perdoem! A sociedade não pode pagar por vagabundo, em particular no serviço público!”

E disse mais:

“Nós temos muito mais gerente do que devia… E nós temos um monte de safado — lamentavelmente — que ganha lá 30, 40 pau. Tá lá em cima… sentadinho… não tá nem aí com a situação sua e tá querendo que você venha aqui e arrume um jeito [de ele ficar] porque ele sabe que ele tá fora!  E tem muito… E tem muito..”

Na conversa, um sindicalista tentou mostrar ao presidente da empresa como as coisas funcionam numa estatal dominada por políticos:

“Desculpa, Wilson. Mas olha, nós não concordamos com isso não. O problema é o seguinte: infelizmente … quando vem o ferrão, não pega esses caras porque eles têm padrinho! Pega é a gente aqui!”

Wilson tenta dizer que haverá justiça:  “Nããããooo, não vai pegar não…. Não vai pegar.”

Parte do turnaround foi fazer o óbvio: Wilson implantou o SAP, comum em qualquer empresa de maior porte mas que nunca havia sido cogitado nos 55 anos da estatal, e criou um Centro de Serviços Compartilhado (CSC) para atender tanto a holding quanto as subsidiárias.  Fez diversos planos de demissão voluntária, economizando centenas de milhões de reais por ano.