Há 14 anos, o cientista Sérgio Mascarenhas, hoje com 90 anos, foi diagnosticado com hidrocefalia, doença que provoca acúmulo de líquido no cérebro. Mas só foi possível chegar ao diagnóstico definitivo – no início os médicos suspeitavam de mal de Parkinson – depois de literalmente fazer um furo em sua cabeça. Inconformado com o método arcaico, o professor voltou aos laboratórios da universidade.

Primeiro reitor da Universidade Federal de São Carlos e professor visitante de Princeton, Harvard e MIT, Mascarenhas se debruçou sobre o funcionamento do cérebro e fez uma grande descoberta: ao contrário do que vinha sendo ensinado nas faculdades de medicina há mais de 150 anos, adultos não são cabeça dura. A caixa craniana segue expansível mesmo depois que paramos de crescer. 10612 27baf10d 89fb b473 c825 d96bf0e5e3cf

Em sociedade com os pesquisadores Gustavo Vilela e Rodrigo Andrade, e com apoio da Fapesp, Mascarenhas fundou a Braincare, uma startup que desenvolveu um sensor externo capaz de medir a pressão intracraniana.

Até então, o monitoramento da pressão intracraniana só podia ser feito com internação e cirurgia, restringindo quase totalmente sua utilização para fins de diagnóstico. (O método invasivo tem outras finalidades, como drenagem de líquor do cérebro.)

Apesar do avanço científico, a Braincare caminhava para ser mais uma empresa vendedora de equipamento hospitalar, uma tecnologia facilmente replicável. Mais familiarizado com a ciência do que com o mundo dos negócios, Mascarenhas resolveu pedir ajuda a um ex-aluno, o consultor de empresas Plínio Targa, então sócio da E&Y no Brasil. (Plínio fundou a consultoria Axia Value Chain, incorporada pela E&Y.)

Ao se encantar com as potencialidades da descoberta do ex-professor, Plínio resolveu não apenas investir no negócio como fazê-lo ‘virar’.

A Braincare acaba de levantar US$ 5 milhões junto a investidores anjo e está em fase de obtenção de patentes globais e registros junto à Food and Drug Administration (FDA), processos que devem ser concluídos ao longo deste ano.

A primeira medida de Plínio como CEO da Braincare foi colocar o conceito à prova: levou o case para a Singularity University e acabou selecionado, junto com mais seis empreendedores, para o programa de aceleração da universidade, numa concorrência com mais de 500 empresas.

No programa de aceleração, Plínio fez mais de 100 reuniões com pessoas-chave em toda a cadeia da indústria médica. “Ao longo das conversas, foi caindo a ficha de que tínhamos nas mãos mais do que um device para medir pressão craniana: estávamos facilitando o acesso a um sinal vital”, diz Plínio.

De vendedor de aparelho hospitalar, a Braincare se transformou num prestador de serviço de monitoramento de pressão intracraniana. “Temos uma tecnologia que salva vidas e que pode impactar a saúde de bilhões de pessoas.”

O aparelho – que em sua primeira versão se conectava a um monitor via cabo – foi substituído por um pequeno sensor com bluetooth 5.0, que transmite os dados para um tablet. Pela nuvem, a empresa processa as informações e envia o laudo para o aplicativo.

O aparelho é fornecido em comodato por meio de uma assinatura mensal de cerca de R$ 3 mil.

Em setembro, a empresa conquistou seu primeiro cliente: o Hospital Sírio Libanês.

Além dos sócios originais e de Plínio, o empresário Horácio Lafer Piva também entrou como anjo. A nova rodada de US$ 5 milhões foi captada por meio do fundo Miletus, criado por Plínio e Horácio especificamente para atrair novos investidores para a Braincare.

“Está no nosso horizonte atrair VCs e grandes players da área da saúde, mas só depois que tivermos todas as patentes e o registro na FDA”, diz Plínio. “No momento queremos apenas anjos conectados com o nosso propósito.”

A operação brasileira deve começar a dar lucro este ano.

A empresa também colocou como missão investir em pesquisa para expandir o conhecimento da medicina em torno do novo sinal vital: está patrocinando pesquisas em Stanford, tentando estabelecendo novas correlações entre o cérebro e a saúde.

Em outra frente, a Braincare também vai construir um enorme banco de dados na nuvem, que no futuro pode ajudar no planejamento de políticas públicas.