Para cada prédio que a Cyrela finca na terra, Elie Horn está pensando em sua vaga no céu.
O fundador e controlador da mais valiosa incorporadora brasileira é o único bilionário do País a ter aderido ao The Giving Pledge, a promessa de gente como Warren Buffet e Bill Gates de doar, ainda em vida, a maior parte de sua fortuna. (A lista inclui 157 famílias, principalmente dos EUA.)
Insatisfeito em fazer ‘apenas’ sua doação pessoal, Elie também abriu um novo caminho na filantropia corporativa: há seis anos consecutivos, ele convence o conselho da Cyrela a doar 1% do lucro líquido da empresa para filantropia — nada a ver com incentivos fiscais. O Instituto Cyrela recebe os recursos e os aplica em projetos. Segundo Elie, o exemplo já foi emulado por duas concorrentes: a MRV Engenharia e a Tecnisa.
“A ideia do senhor Elie é que a gente consiga influenciar mais empresas brasileiras a seguir esse exemplo”, diz Aron Zylberman, diretor executivo do Instituto Cyrela. “O 1% é um benchmark internacional, e é interessante porque, na hora que você determina que 1% vai para caridade, você não precisa rediscutir isso a cada instante.”
Nos EUA, a filantropia é um atestado público — altamente visível — do sucesso material do doador: é dinheiro que vai para universidades, hospitais de ponta, pesquisa científica e bolsas de estudo.
No Brasil, todos os sinais desta equação são trocados. Aqui, a maioria dos bilionários que têm um trabalho filantrópico o fazem discretamente, seja por questões de segurança ou por temerem uma sobrecarga de demanda.
“A ideia do senhor Elie é que a gente consiga influenciar mais empresas brasileiras a seguir esse exemplo”, diz Aron Zylberman, diretor executivo do Instituto Cyrela. “O 1% é um benchmark internacional, e é interessante porque, na hora que você determina que 1% vai para caridade, você não precisa rediscutir isso a cada instante.”
Nos EUA, a filantropia é um atestado público — altamente visível — do sucesso material do doador: é dinheiro que vai para universidades, hospitais de ponta, pesquisa científica e bolsas de estudo.
No Brasil, todos os sinais desta equação são trocados. Aqui, a maioria dos bilionários que têm um trabalho filantrópico o fazem discretamente, seja por questões de segurança ou por temerem uma sobrecarga de demanda.
Não há notícia, até agora, de nenhum brasileiro fazendo algo na escala a que Elie se propôs, e ele quer mais empresários compartilhando suas ideias sobre ‘fazer o bem’.
Elie não vai largar o assunto. Ao contrário. Sua mulher, Susy, está entrando no corpo a corpo, promovendo jantares para convencer os amigos do casal a entrar pelo menos no ‘clube dos 20%’, ou seja, doar um quinto da fortuna.
(No Brasil, como o imposto sobre doações após a morte é de cerca de 4%, contra 40% a 60% nos Estados Unidos, uma doação proporcionalmente menor pode ser ainda mais relevante na prática.)
A filantropia é uma escolha pessoal, baseada em convicções e experiências próprias adquiridas ao longo de uma vida. Mas talvez o melhor caminho para se começar a pensar no assunto seja uma conversa com Elie Horn, como esta que tivemos recentemente:
(No Brasil, como o imposto sobre doações após a morte é de cerca de 4%, contra 40% a 60% nos Estados Unidos, uma doação proporcionalmente menor pode ser ainda mais relevante na prática.)
A filantropia é uma escolha pessoal, baseada em convicções e experiências próprias adquiridas ao longo de uma vida. Mas talvez o melhor caminho para se começar a pensar no assunto seja uma conversa com Elie Horn, como esta que tivemos recentemente:
Brazil Journal: Qual é o seu conceito de filantropia?
Elie: Por que você existe? Para fazer o bem, o bem é a causa da sua existência. É muito medíocre você viver, morrer, e não ter feito nada. Por que você viveu? Se você gastou só em si, você não fez nada. Desperdiçou dinheiro.
O único dinheiro que você leva junto, lá em cima, é o dinheiro que você deu para outras pessoas por ações de beneficência. Isso é real, não estou falando em metáforas. É puramente, 100% real.
Você tem um milhão de dólares, por exemplo, e você não deu nada. Você vai voltar depois. Como você volta na outra encarnação? (Pergunta e fixa no repórter, aguardando a resposta.)
BJ: Sem um milhão de dólares?
Elie: Volta sem um milhão e vai ficar sofrendo um tempão, com a vida inteira sem tutu para poder gastar, comer e beber.
Então, é muito mais barato dar a metade desse um milhão e garantir a sua poupança no outro mundo, na eternidade. Tem dois mundos: da encarnação aqui na Terra e da eternidade com Deus. Ser pobre na eternidade é paulada. Olha, se ser pobre com 60 anos já é problema, ser pobre pelo tempo infinito é uma desgraça.
Agora, quem não quer saber desse assunto é egoísta, porque só pensa nele agora e não tem nada depois. É uma visão míope.
BJ: Como é que te apresentaram ao Giving Pledge?
Elie: Quinze anos atrás, eu decidi doar 60% [do patrimônio]. Faz mais ou menos 15, 20 anos. O número já tava feito. O IPO [da Cyrela] em 2005 fez o número aumentar. A ação subiu 30 vezes e deu no que deu.
Em 2012 ou 2013, eu vejo um consultor cubano de Miami que me fala, ‘Por que você não entra no Giving Pledge?’ Pensei: ‘faz parte da minha maneira de pensar e fazer’.
Então mandei uma carta, me convidaram, fui lá. Já fui lá duas vezes. Achei muito bom. São pessoas muito nobres, a maioria não vai doar metade, vai doar 90%, vai doar 99%.
Eu sou alguém, [mas] lá, não sou nada. Tem gente melhor que nós. A vantagem é que cada um faz o bem onde quer fazer, ninguém te diz: você vai fazer numa direção determinada. Você faz o que bem entender.
BJ: O senhor tinha decidido doar 60% do seu patrimônio em vida ainda?
Elie: Eu pensei na morte, meus filhos pediram na vida.
BJ: Como chegou na ideia dos 60%? Tinha algum exemplo?
Elie: Meu pai doou 100%, entre a vida e a morte. Me deu uma lição maravilhosa, que é fazer o bem. Eu quis dar 100%, [mas] não me deixaram. Os gurus, conselheiros, falaram: ‘você dá uma parte e deixa para os seus filhos se virarem para ganhar para, por sua vez, fazerem o bem de novo.’
Estava sentado com meu caçula. Ganha 6 mil reais por mês, e o que ele fez com o dinheiro do ano inteiro? Deu para caridade, tudo. Se bem que eu banco ele, mas achei muito bonito. (risos)
BJ: O senhor acha que essa mentalidade está crescendo ou não entre os empresários?
Elie: Poderia crescer mais. O problema é ignorância e a não conscientização do problema. As pessoas não enxergam. Quando a mulher é vaidosa e o homem é orgulhoso… Quando a mulher usa milhões, milhares, em Chanel, Cacharel, o diabo a quatro, quem usa essas coisas não consegue pensar nos pobres.
Se uma bolsa custa dez mil dólares, não posso dar [dinheiro] para os pobres. Tem que ter o pensamento inverso! Tem que dar dez mil dólares facilmente e não comprar bolsa Chanel, porque as duas coisas não dá certo, não existe isso.
O luxo ele te mata, ele te suga. Mesmo que você dê dinheiro para a caridade, às vezes, tem um ato de dúvida. ‘Estou fazendo certo, estou fazendo errado?’ E se alguém te rouba ou alguém investe mal seu dinheiro, você fica revoltado. Então, às vezes dá vontade de não fazer nada. Mas é um mau instinto que te domina nesse minuto.
BJ: Você acha que a gente vai ver mais brasileiros entrando no Giving Pledge?
Elie: Eu estou tentando. O homem é bom, mas precisa cutucar. Tirar a casca da ignorância ou da burguesia. Isso é ser civilizado. Nossa campanha é para conscientizar, não é para brigar. É para conscientizar o ser humano.
***
A última forma de ‘fazer o bem’ encontrada por Elie Horn foi o Instituto Liberta, que está à frente de uma campanha publicitária massiva para conscientizar o País sobre o problema da exploração sexual infantil. Elie tem jogado seu prestígio pessoal para obter espaço gratuito nas emissoras de TV e editoras.
Cerca de 500 mil crianças e adolescentes são explorados sexualmente no Brasil, e estima-se que apenas 7% dos casos sejam notificados. A maioria das crianças exploradas tem entre 7 e 14 anos.
A prática é ‘naturalizada’: na maioria dos casos, não há um agenciador, e a relação ocorre de forma voluntária por meninas e meninos em situação de miséria. Muito comumente, eles não são vistos como vítimas.
“As pessoas justificam que a menina ou menino foi ‘se oferecer’,” diz a diretora do Liberta, Luciana Temer, professora de Direito da PUC-SP, ex-secretária de assistência social de São Paulo na gestão Fernando Haddad e ex-titular da Delegacia da Mulher de Osasco, onde começou seu envolvimento com problemas sociais.
“Temos que cutucar a sociedade para que ela entenda que isso é um problema, não só porque são tragédias pessoais mas porque, do ponto de vista social, a maioria desses crianças se afastam da escola, tem doenças venéreas e gravidez precoce. É um impedimento para o rompimento do ciclo da miséria no Brasil.”
Além de trabalhar na repressão à exploração, o Liberta vai estudar formas de apoiar as famílias destas crianças: “Uma questão que o senhor Elie colocou foi que, no limite, a gente vai impedir o trabalho da menina ou do menino,” diz Luciana. “Mas depois, como cuidar dela? Quais as estratégias de auxílio para que essa menina tenha uma vida mais digna?”
Aos 72 anos, Elie Horn é conhecido por empreendimentos magníficos, mas quer ser lembrado por obras que serão eternas.