A experiência trabalhando para um dos maiores banqueiros do nosso tempo mudou a cabeça do ex-analista da Merrill Lynch, que conheceu o ‘seu José’ porque o banqueiro era um grande acionista da Aracruz, empresa que Thomas cobria.
Há dois anos, Thomas se juntou à One Partners, a boutique de Bernardo Parnes e Sergio Penchas que une M&A, wealth management e gestão de recursos, e lançou o Atlas One FIA, um fundo long only hoje com pouco mais de R$ 100 milhões.
O Atlas ainda é pequeno na captação, mas o track record de Thomas ao longo da última década sugere que é apenas uma questão de tempo: sua performance foi de 305% contra 72% do índice Bovespa e 128% do IBX-500.
A equipe também tem punch. O co-gestor do fundo, Subho Daripa, foi um dos fundadores da Moat Capital, trabalhou na Petra — a empresa de petróleo e gás de Roberto Viana — e cobriu commodities, utilities e infraestrutura em diversos bancos de investimento. Ricardo Penna Franca, David Khattar e Marcelo Azevedo trabalharam com Thomas na Gávea, onde foram ‘comprados’ pelo JP Morgan antes de montar o Atlas. Felipe Santos, que também trabalhou no banco, cobre petróleo, energia e infraestrutura.
O fundo — disponível em plataformas como BTG Digital, Bradesco, Órama, Pi, Guide e Ativa — tipicamente tem cerca de 20 empresas investidas, mas metade da exposição está nas cinco maiores posições: Petrobras, Magazine Luiza, B3, IRB e Banco do Brasil.
Para tirar a intuição do processo de stockpicking, o Atlas desenvolveu uma ferramenta proprietária que digitalizou todo o seu processo de investimento.
Para cada empresa analisada, o time responde a mais de 200 perguntas para metrificar itens como governança, gestão, bem como a previsibilidade, resiliência e vantagens competitivas do modelo de negócio. O processo produz uma taxa interna de retorno (TIR) esperada para aquele investimento, que a equipe depois ajustada pelo risco relativo da empresa. A carteira reflete a melhor combinação entre a convicção sobre essas TIRs e a assimetria de preço.
Abaixo, os melhores trechos da conversa de Thomas e equipe com o Brazil Journal na última terça-feira.
A Petrobras é a maior posição de vocês hoje. Qual a tese?
O petróleo está muito mais perto do low do que do high – o Brent está próximo de US$ 60 por barril – e, mesmo nesse preço, a Petrobras vai gerar US$ 20 bi, US$ 25 bi de caixa.
Nos últimos anos a Petrobras investiu muito em capacidade, colocou muitas plataformas e agora está num período de aumento de produção com geração de fluxo de caixa e capex baixo. A gente deve ver uma situação de troca de dívida para equity nos próximo dois, três anos – e provavelmente até além disso, porque a empresa tem muita reserva e muito recurso disponível para continuar crescendo sem precisar investir muito.
Mas como vocês avaliam o risco político? Não há risco de as políticas colocadas em prática pela gestão Castello Branco mudarem se, eventualmente, outro presidente assumir?
O que eles estão fazendo lá é transformacional, não tem volta. Eles estão saindo de tudo que não é E&P [exploração e produção]. Com isso, a manipulação governamental em cima da Petro vai ficar inócua: a refinaria vai estar privatizada, a distribuidora vai estar privatizada. Se o governo quiser interferir no preço da gasolina e do diesel, a Petrobras não vai ter nada a ver com isso, porque ela vai basicamente vender o petróleo – e isso se vende a preço internacional, no matter what.
Muitos de vocês tem um histórico em análise de commodities – um setor para o qual muita gente torce o nariz por conta da volatilidade de preços e por ser difícil ter uma vantagem competitiva na análise. Tem alguma outra empresa de commodities relevante na carteira?
Nós temos Metalúrgica Gerdau, muito em cima da recuperação doméstica e cíclica. A quantidade de lançamento que as incorporadoras estão em fazendo em São Paulo, que é onde tudo começa em termos de crescimento econômico no País, é muito grande – isso sem falar nos investimentos em infraestrutura e a cessão onerosa – e a gente vê que a segunda derivada, que é a venda de aço longo, não está refletida nos números de Gerdau.
No Brasil, a Gerdau opera com cerca de 65% da capacidade, o que dá a ela muita alavancagem operacional quando o mercado voltar.
O papel está no zero a zero num ano em que muitas incorporadoras já subiram mais de 100%. E a Metalúrgica Gerdau passou por uma transformação super importante: eles zeraram a dívida e ela se tornou uma holding pura, só dona de uma participação em Gerdau SA. Acabou a alavancagem que destruía valor.
Sua carteira tem alguma exposição a incorporadoras?
Tem esse oba-oba com média e alta renda, mas o que aprendemos no último ciclo de 10 anos? Que quando a companhia resolve acelerar crescimento, alguma hora ela dá com os burros n’água.
Preferimos ter a MRV, que é a melhor empresa que consegue pegar a combinação de inflação de preço de imóvel que deve vir e crescimento do metro quadrado – com liquidez, gestão e produto comprovado. Ao contrário das incorporadoras de média e alta renda, a MRV tem a facilidade de entrega, com um produto já padronizado e de baixo custo.
As de média e alta renda têm 40, 50, 60 canteiros de obra todo ano; são 40, 50, 60 produtos diferentes em nichos diferentes (média média, média alta, etc), o que aumenta bastante o risco de execução, com estouro no custo e atraso na entrega.
E agora, além de manter a participação que já tem no Minha Casa Minha Vida, o crescimento dela (de 40 mil para 60 mil unidades/ano) deve vir de fora do programa, de unidades financiadas pelo SBPE [Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos], num momento em que os juros estão muito atrativos.
Thomas, você tem uma ampla experiência no setor de papel e celulose. Por que vocês não tem Suzano mesmo depois dessa queda expressiva no preço das ações?
Nos preços de hoje, o mercado está achando que a celulose [hoje em cerca de US$ 450] vai para US$ 550 por tonelada, mas o estoque está na lua… Ele está caindo, mas vai cair numa velocidade vagarosa, de forma que não me parece que o aumento de preço deva vir nessa velocidade.
A Suzano é uma empresa excelente e a fusão com a Fibria foi um baita negócio. Mas eles erraram primeiro em tentar peitar o maior cliente, que também é o maior negociador do mundo: a China. E também em decidir parar de produzir para ajustar os estoques – que foram de 40-50 dias para quase 100 – num setor em que o custo fixo é grande e em que, se você para, a margem despenca.
Na prática, a Suzano se tornou a maior empresa do setor, com o maior estoque da história do setor e fez a maior parada de mercado da história do setor.
No varejo, quais são as principais posições do Atlas One?
Temos Pão de Açúcar, que está negociando a 16, 17 vezes o lucro para o ano que vem. Esse papel já chegou a valer 25 vezes. Esse de-rating ocorreu principalmente pela reestruturação societária, em que o Pão de Açúcar passa ser o responsável não só pelas operações do Brasil, mas também pelas operações do Exito na Colômbia.
Mas vemos uma assimetria de valuation. É um papel que pode dobrar nos próximos cinco anos – assumindo que a governança melhora, que o Exito não seja um problema, e que a operação brasileira continue melhorando.
Vocês também têm Raia Drogasil (RD), uma das empresas com o maior múltiplo da Bolsa. Não é um papel muito caro?
A relação entre preço e lucro está em 50 vezes, mas tem uma pegadinha. Quando a RD abre uma farmácia – e ela abre praticamente uma por dia útil — a curva de maturação é longa, demora quase quatro ou cinco anos. A partir do momento que você abre a farmácia, você já fez o capex, comprometeu o capital de giro, mas não tem a receita da maturação ainda. Então, ao olhar a relação entre preço e lucro deste ano sem ajustar pelo efeito das novas lojas, você está punindo a companhia.
O ideal é projetar a maturação dessas novas lojas até o quarto ano, pegar esse lucro adicional, trazer a valor presente e ajustar o múltiplo. Aí a RD vai para 30 vezes lucro, que é mais em linha com o varejo e nomes como a Renner, por exemplo.
Ninguém está dizendo que é um papel barato, mas é simplista acreditar que papéis que tem um múltiplo alto não vão gerar retorno para o acionista. Aqui vemos uma expansão da receita, com a volta do same-store sales acima da inflação em lojas maduras, o que vai fazer com que gradativamente esse papel continue performando.
VIVA (Vivara) ou VVAR (Via Varejo)?
A gente tinha Via Varejo, comprou a R$ 4 e vendeu a R$ 8, surfamos essa mudança de perspectiva da empresa e a entrada de sócios importantes que vão tirar a distração e trazer foco para a operação, que é um desastre. Mas a achamos que, a R$ 8, agora é “show me the results”.
BR Distribuidora ou Ultrapar?
BR, sem dúvida. É uma empresa em transformação, pagadora de dividendos, que não tem problema na execução, na estratégia, é empresa de um negócio só e tem toda a alavancagem que vai acontecer deixando de ser estatal e virando uma empresa privada.
Já a Ultra, talvez a R$ 15 fosse uma oportunidade, mas vemos um desafio enorme de portfólio. A Ipiranga está num momento complicado de precificação, volume, tem um mau humor com ela. A Oxiteno é um desastre – cíclico. A Extrafarma é um desastre – estrutural. Eles estão pensando o que vão fazer desse portfólio todo.
Agora eles estão falando em entrar em refinaria: um negócio capital intensivo, com ROIC baixo…
Mas não teria alguma sinergia com o negócio de postos?
São negócios muito diferentes: atacado versus varejo. Uma coisa é fazer posto de gasolina, que é sobre criar tráfego, um negócio B2C. Refinaria é B2B, um negócio em que tem que fazer política comercial para vender para o cara que está comprando mais.