Num evento recente da Fundação Estudar, perguntaram a André Esteves se BTG significa mesmo ‘Back to The Game’.
No palco para dar conselhos a estudantes, Esteves nem piscou antes de mudar o acrônimo que já se tornara lenda: “Agora é ‘Back to Growth,” disse.
O mercado está concordando.
Seis meses atrás, a ação do BTG Pactual negociava a um modestíssimo múltiplo de uma vez o seu valor patrimonial — além da baixa liquidez da ação, o mercado temia novas denúncias envolvendo seu controlador — acusado na Lava Jato e inocentado pela Justiça.
De lá para cá, o valor de mercado do banco dobrou, e ontem à noite sua holding levantou R$ 2,2 bilhões vendendo ações do banco.
No preço da oferta — R$ 46/ação — o BTG agora negocia a 2,1 vezes seu valor patrimonial, comparado aos 2,6x do Itaú e aos 2,4x do Bradesco. Sua ação recentemente entrou para o MSCI, e o aumento da liquidez (depois da oferta, o giro diário deve subir de R$ 75 milhões para R$ 100 milhões) faz dela uma candidata natural ao Índice bovespa.
Durante o roadshow, o próprio Esteves — que desde sua volta ao banco assumiu um perfil mais discreto — investiu no corpo a corpo com os grandes investidores institucionais.
Segundo estes gestores, sua análise sobre o valor potencial do banco pode ser resumida em uma frase: o retorno sobre o patrimônio do BTG tem muito a aumentar daqui pra frente.
Por um lado, as receitas dos negócios baseados em comissões — como a gestão de recursos e o banco de investimentos — estão crescendo mais rápido do que as dos negócios de capital intensivo, como as atividades de crédito e tesouraria. E, dentre estas últimas, a receita advinda das atividades industriais (crédito) cresce mais do que a que vem das atividades artesanais (trading).
Nas conversas do roadshow, Esteves dividiu a tese de investimentos em duas partes.
A primeira é o fenômeno que os economistas chamam de “financial deepening”: um aumento na oferta de serviços financeiros como resultado de juros mais baixos, inovação tecnológica e mudanças na regulação. Em termos práticos: não passa uma semana sem que surja um novo hedge fund, um novo fundo de crédito, uma nova fintech ou uma nova boutique de ‘special situations’ — todos eles novos clientes em potencial para os negócios ‘core’ do BTG.
Com a Bolsa em seu pico histórico (em termos nominais, e ainda sem a participação dos estrangeiros), e com a migração aparentemente estrutural da renda fixa para a variável, Esteves diz que o BTG é o player mais bem posicionado para surfar o momento.
Enquanto todos os negócios de atacado do BTG são influenciados pelo financial deepening, nos grandes bancos de varejo eles representam uma fatia muito menor da torta. Num prazo de um ou dois anos, alguns investidores acreditam que o BTG pode negociar com um prêmio de múltiplo sobre os bancões.
“A gente ficou 25 anos concentrando o sistema financeiro e agora vai ficar 25 anos desconcentrando — e isso é uma enorme oportunidade para o ‘liquidity provider’ do mercado, que somos nós,” Esteves disse no evento da Fundação Estudar.
A segunda metade da tese são os negócios digitais do banco.
Essa área vai além do próprio BTG Digital — a plataforma de investimentos focada nas classes A e B e que compete com a XP — e inclui ainda o Banco Pan, focado em crédito e direcionado à classe C; um negócio de seguros; e uma área que atende pequenas e médias empresas.
Estas quatro áreas são servidas pela Decode, a empresa de data analytics que o BTG comprou ano passado e cujos 40 cientistas de dados informam todos os processos e jornadas digitais do banco.
Esteves disse aos investidores que o BTG Digital é “mais digital” do que a XP e tem um caráter “mais bancário”. “Ele diz que os agentes autônomos do BTG são ‘postos avançados’ do banco, originando negócios em crédito, M&A e venda de ativos, e não só os produtos típicos de uma corretora.”
Mas mesmo gestores simpáticos à tese preferem ver os negócios digitais como uma opcionalidade. “O negócio digital exige um outro tipo de ‘skill’ que não é inato ao BTG,” diz um deles.
De qualquer forma, a oferta concluída ontem é uma injeção de autoestima num banco que passou os últimos quatro anos apagando incêndios e, até recentemente, enxergava seu fundador simultaneamente como seu maior ativo e maior passivo.
O uso de recursos da oferta é engenhoso: os recursos serão usados pela holding do BTG para comprar do próprio banco a participação que o BTG tem no banco suíço EFG. Com um ROE próximo a zero, o EFG tem deprimido tanto o retorno sobre o patrimônio do BTG quanto seu capital regulatório.
Com a venda da participação, o capital regulatório do BTG vai de 10,5% para 13,5%, liberando capital para os outros negócios do banco.
Quando o book de reservas fechou, havia espaço para um ‘hot issue’ — um aumento no tamanho da oferta — mas, segundo uma fonte, Esteves foi enfático em dizer ‘não’, por considerar a ação barata. No final da noite, estava no Bar Original em Moema tomando chopp com outros sócios do banco.