Fundada em 2008 pelo ex-CIO da Credit Suisse Asset Management, Inácio Ponchet, a BLP Asset administra cerca de R$ 400 milhões em onze fundos, incluindo fundos exclusivos. 

Mês passado, a BLP começou a comprar Ambev ao redor de R$ 12. Hoje, o papel está em R$ 14. 

A Ambev tem sido um patinho feio do mercado nos últimos anos. Entre altos e baixos, não sai do lugar desde 2013, sofrendo com a queda no volume de vendas, perdas consistentes de market share e rentabilidade. 

O homem por trás da tese de compra é Pedro Leduc, que fez carreira no JP Morgan, onde era o analista sênior de alimentos e bebidas na América Latina, e foi rankeado #1 pela Institutional Investor.

“Imaginamos que a Ambev vai conseguir recuperar share já a partir do segundo tri,” Leduc disse ao Brazil Journal. “Enquanto muitas pequenas empresas estão sofrendo, toda força de venda dela foi mantida e todas as plantas e CDs estão funcionando normalmente. Ela tem ferramentas na mão para recuperar mercado.”

Há também um fator técnico: enquanto muitas empresas já dobraram de valor desde o low da crise, a Ambev recuperou pouco, subindo cerca de 26%.

Em sua carta aos investidores publicada esta semana, a BLP explica por que está comprando o papel.  Abaixo, um resumo:

Montamos uma posição comprada em Ambev pela primeira vez desde nossa criação. O nome combina uma série de características que estávamos buscando para nosso portfólio doméstico, incluindo uma saída mais rápida e fortalecida da pandemia – principalmente por uma melhor execução relativa em um setor “simples”, valuation atrativo (19x P/L para 2021), balanço forte (caixa líquido) e ampla geração de caixa (7% yield 21E).

Estamos vendo o mercado dar o benefício da dúvida (pagar múltiplos “normalizados”) para muitas empresas com pior qualidade na execução, balanços piores e setores mais cíclicos, cuja retomada ao “normal” deve ser, no mínimo, mais sinuosa. Por que então excluir Ambev da lista de candidatos à retomada?

Entendemos os desafios estruturais, mas acreditamos que ela pode surpreender, inclusive fazer do “obstáculo COVID” um trampolim para aterrissar bem mais adiante, com mais market share e laços fortalecidos com sua cadeia de fornecedores e clientes.

Até então, tem sido fácil defender uma posição vendida em Ambev. Um case de retração de volume e contração de margem quase estrutural, por aumento de competição que inibe aumento de preços, além de alta de custos (FX, impostos, complexidade de portfólio) e mudança de preferências do consumidor/canal. Porém, não podemos deixar nossos embasamentos e fundamentos esquecidos. Certa vez, um antigo analista de uma corretora de ações (muito competente por sinal) nos contou uma dica que hoje aplicamos: ao escrever um downgrade, sempre escrevia, também, a capa de um upgrade – e vice-versa – para saber o que mudaria seu case. E assim foi conosco em Ambev.

Chance de recuperar market share com competição enfraquecida. Acreditamos que algumas empresas nacionais e/ou regionais sofreram um enorme aperto de liquidez ao reduzirem seu faturamento durante a pandemia. Muitas delas não devem voltar ou, se voltarem, o farão de forma mais tímida, postergando projetos de expansão ou com termos comerciais piores para bares e varejistas. Muitos dos próprios clientes (como grandes redes) devem priorizar fornecedores com mais solidez, assegurando perenidade na disponibilidade e confiabilidade do produto. Ambev saiu de cerca de 70% de market share em 2010 para os atuais 60%. Fora Heineken, com seus 20% de market share, acreditamos haver relevantes 20% fragilizados na mesa. Comparando com a última crise, hoje Ambev também conta com mais serviços digitais e um portfólio muito mais amplo para atender aos mais diversos gostos e bolsos. Acreditamos que recuperação de volumes é prioridade imediata da empresa; em seguida, virão medidas para recomposição de margens.

Mais prestígio na cadeia; críticas viram qualidades. Se antes um fornecedor (de material para embalagens ou insumos agrícolas, por exemplo) criticava Ambev por ser “dura” em preços e prazos, agora deve estar feliz por, ao menos, saber exatamente quanto e quando vai receber. Uma rede de supermercados que antes criticava Ambev por ser difícil na negociação, hoje deve privilegiar este fornecedor, que entrega com prazos definidos e possui um leque completo de produtos; afinal, a companhia não fechou nenhuma planta, não desativou centros de distribuição e não reduziu sua equipe comercial. Acreditamos que a empresa vai compensar uma parte da pressão imediata na margem (tradicionalmente menor em supermercados vs. venda a bares) com redução de descontos e verba para trade marketing. Se antes um bar reclamava que Ambev tinha uma agenda de entregas rígida e vinha estimulando retirada de pedidos via aplicativo, nas medidas sugeridas pelo algoritmo do “Venda Certa”, hoje agradecem a pontualidade da entrega e o auxílio da tecnologia. Se antes um banco reclamava que conceder crédito à Ambev não era tão lucrativo, hoje devem priorizar um tomador com esse perfil. Se antes existia uma imagem de que a Ambev cortava custos demasiadamente, hoje sua austeridade se transformará em uma vantagem competitiva. Seus colaboradores não precisam perder tempo em aprender a cortar gastos ou trabalhar com orçamentos apertados, pois já o fazem dessa forma desde sempre.

2T20 “menos ruim” deve acender a luz. Todo call de “valuation” ou “turnaround” precisa de um trigger que chame atenção e aponte mudança de tendência. Muitas vezes, isso envolve troca de management ou aquisição de novos ativos. Acreditamos que o segundo trimestre, ainda desafiador (EBITDA consolidado podendo cair -27%Y/Y), poderá mostrar alguns destaques que indiquem o caminho da volta. Projetamos uma queda bem menor de volumes em cerveja Brasil (-13%) em comparação com o anunciado no conference call do 1T20 relativo a abril (-29%), tanto pela empresa abocanhar market share de menores, quanto pela mudança no comportamento do consumidor que parece ter se adaptado ao consumo nos lares após o repentino fechamento do canal de maior volume (bares).

O preço médio de cerveja e as margens podem sofrer, mas este 2T pode trazer uma redução relevante de custos gerais e administrativos – algo que, possivelmente, não “deu tempo” de ajustar durante o 1T. Por último, os investidores da empresa brasileira finalmente poderão se alegrar com as operações no Canadá, que, pela desvalorização do BRL, devem amenizar muito o impacto de menores volumes na receita consolidada.

Fora do radar. Ambev hoje tem apenas 3 recomendações de compra, 9 de manutenção e 5 de venda, de acordo com o compilado de analistas de mercado do Bloomberg. Podemos, então, afirmar que não é um ativo consenso de mercado e, tecnicamente, torna-se também mais interessante. Ao que tudo indica, a maioria dos investidores no mercado local tem preferido se posicionar em papéis mais cíclicos, preterindo Ambev – apesar das projeções fracas de emprego, geração de renda e PIB. Acreditamos, portanto, que o comprador marginal de Ambev venha primeiro do mercado internacional. É um business simples de ser entendido globalmente, com baixa elasticidade ao PIB, com yield e sem nenhum risco de balanço. É uma porta ideal para se entrar no Brasil, com boa liquidez e participação relevante no Ibovespa.