A Agrogalaxy anunciou hoje que entrou com um pedido de recuperação judicial depois de deixar de pagar uma amortização de R$ 70 milhões que vencia hoje.

A companhia, uma rede de mais de 100 lojas de insumos para o produtor, tem uma dívida líquida de mais de R$ 1,5 bilhão com bancos e CRAs. Mas a dívida total é muito maior, já que inclui também a conta de fornecedores, que soma mais de R$ 4 bilhões. 

A ação da Agrogalaxy, que já negociava perto do low histórico, caiu mais de 13% hoje depois da notícia. Além do pedido de RJ, a companhia anunciou a renúncia de seu CEO e de cinco de seus nove conselheiros — deixando a companhia praticamente à deriva. 

A RJ não é exatamente uma surpresa para quem acompanha o setor. A Agrogalaxy vem sofrendo desde o início do ano passado, quando o cenário do agronegócio mudou drasticamente. 

A companhia — controlada pela Aqua Capital — cresceu nos últimos anos com uma estratégia de forte consolidação, adquirindo diversas revendas e financiando esses M&As com um misto de equity e dívida. 

A estratégia levou sua alavancagem para a lua, mas o indicador ficou camuflado por alguns anos, porque o cenário do setor estava positivo. 

“Os anos de 2020, 2021 e 2022 foram muito bons para a agricultura e para o setor de insumos. As margens das distribuidoras estavam muito altas e elas formavam muito estoque porque esse estoque só se valorizava,” disse um gestor de Fiagro, que não tem exposição a empresa. “Isso fez com que as distribuidoras pisassem no acelerador.”

O problema: em 2023 o cenário mudou abruptamente, com o preço das commodities caindo, principalmente de soja e milho, e o produtor pisando no freio.

“Para o produtor foi a tempestade perfeita. Ele tinha comprado o fertilizante no high, por conta da guerra na Ucrânia, e depois teve que vender a soja no low,” disse outro gestor. 

Boa parte das vendas da Agrogalaxy são feitas a prazo, com o pagamento sendo efetuado apenas quando o produtor faz a colheita. Com a crise no setor, muitos produtores acabaram deixando de pagar ou atrasando os pagamentos, o que pressionou o capital de giro da companhia. 

Essa dinâmica faz com que a empresa sofra duas vezes quando a safra é ruim: tem problema de provisão na carteira atual e, além disso, recebe menos pedidos do produtor para a safra seguinte.

As margens — que já eram apertadas — passaram a rodar no negativo. 

Esse mercado tipicamente opera com margens EBITDA de 5% a 6% e com margens líquidas de 2% a 3%. Nos anos de bonança, a margem EBITDA estava rodando acima de 10% e a líquida acima de 5% — o que criou uma ilusão temporária de que a alavancagem não era tão alta. 

Já nos últimos dois anos, a Agrogalaxy passou a operar com margens negativas. No segundo trimestre deste ano, a companhia teve uma margem EBITDA negativa de -7,9%. Um ano antes, a margem havia ficado em -4%. 

Outra problema, na visão de gestores ouvidos pelo Brazil Journal, foi que a Acqua teve dificuldade para integrar as revendas que comprou. “A tese era integrar, mas acabou virando clusters,” disse um gestor. “A revenda do centro-oeste, por exemplo, não conversava com a política de crédito da revenda do Paraná.”

A Agrogalaxy até tentou se adequar à nova realidade do mercado, reduzindo seu SG&A e buscando uma injeção de capital com seu controlador. Em dezembro passado, a Aqua chegou a injetar R$ 150 milhões na empresa — o que, nas palavras de um investidor, “foi como jogar água na frigideira.”

“Nesse nível de juros, com a alavancagem que eles estavam, e com a forma como veio essa inversão de mercado, era muito difícil reverter a situação,” disse o gestor de Fiagro.

Os maiores credores bancários da Agrogalaxy são o Santander, Citi e Banco do Brasil. 

Nos CRAs, alguns credores relevantes são os Fiagros da Capitânia, JGP e a XP Asset. Para esses fundos, o impacto deve ser relevante. No CPTR11, da Capitânia, a exposição à Agrogalaxy é de 7% do PL. No XPCA11, da XP, a exposição é ainda maior, de 8,2%. Já o JGPX11 tem 8% de seu PL em CRAs da companhia.

Os três fundos fecharam em queda hoje, caindo 3,5%, 0,8% e 6,4%, respectivamente. 

No final do pregão, a ação da Agrogalaxy valia menos de R$ 1, com a empresa avaliada em R$ 249 milhões. 

Para se ter uma ideia, isso é menos do que a companhia levantou em seu IPO, em 2021. Na época, a Agrogalaxy captou R$ 350 milhões vendendo suas ações a R$ 13,75.

A crise no setor de distribuidores de insumos agrícolas não é exclusiva da Agrogalaxy, e o pedido de RJ da companhia vai deixar o mercado atento à situação de outra empresa que opera neste setor: a Lavoro, controlada pelo Pátria e que também surgiu com a mesma tese de consolidação — embora tenha uma estrutura de capital e execução diferentes.