O DXY — o índice que mede a força do dólar americano em relação a outras moedas globais, e que tem relação inversa com o preço das commodities — está negociando perto de 89, um suporte crítico que, se rompido, deve levar o índice rumo a 80, indicando dólar em baixa e commodities em alta.
O que nos faz então acreditar que poderemos ter, a partir de 2021, um período favorável para mercados emergentes e desvalorização adicional do dólar? A eleição de Joe Biden deverá trazer um ambiente global mais construtivo e menos ruidoso e, principalmente, a reconstrução das pontes com a Europa e com a aliança transatlântica. Este fato, somado ao início da vacinação nos países desenvolvidos, levará a uma recuperação global sincronizada em 2021 e 2022, elevando expectativas de inflação e preços de commodities.
A valorização das commodities pode ser simplesmente vista como o outro lado da moeda da desvalorização do dólar. Jean Van de Walle (um dos investidores mais experientes e bem sucedidos em mercados emergentes), por exemplo, acredita que podemos estar no início de um novo superciclo.
Olhando o mundo de forma extremamente simplista, podemos dizer que existem dois ativos financeiros: o dólar americano e todo o resto. Ouvem-se frequentemente também frases como “o mundo não aguenta dólar forte por muito tempo” e “toda vez que o dólar se fortalece ou o déficit americano encolhe, algum país quebra”. Ou como me disse uma vez um grande gestor global, “se você acerta o dólar e o petróleo, 90% cenário está dado”.
Tudo isso vem do fato de que o dólar é a principal moeda de reserva mundial, e dificilmente o euro e renminbi o ameaçarão na próxima década. Além da supremacia econômica americana a partir do pós-guerra, um fator importantíssimo é que o mundo ainda é movido a petróleo, que praticamente só é transacionado em dólares. Ou seja, países importadores de petróleo sempre precisaram de dólares, que eram supridos pelos déficits em conta corrente dos EUA. E finalmente, a reciclagem desses petrodólares fez com que a maioria dos ativos financeiros e dividas em moeda estrangeira fossem denominados em dólares.
Ou seja, os movimentos de depreciação global do dólar são associados a condições financeiras mais favoráveis para países e empresas de mercados emergentes, e também à valorização das commodities. O gráfico abaixo conta a história da bolsa brasileira nos últimos 20 anos, além de ilustrar que o ambiente externo na maior parte das vezes se sobrepõe ao cenário doméstico. Ou seja, quem faz preço é o gringo.
Muita coisa mudou desde o pico do último ciclo em 2010/11. A participação do Brasil no índice MSCI de mercados emergentes caiu de 15% para 5%. A classe de ativos de mercados emergentes hoje é basicamente norte da Ásia (China, Coreia e Taiwan representam 65% do índice), e o setor de tecnologia é 50% da alocação setorial. Se por um lado é ruim que o Brasil não tenha sido capaz de desenvolver empresas como a Tencent, o Alibaba e até mesmo a Naspers sul-africana, por outro podemos nos beneficiar com a rotação em curso globalmente de growth para value — que se reflete na venda das ações de empresas de tecnologia e compra nos setores de bancos, commodities e bens industriais.
A bola está no campo do Brasil para aproveitar essa oportunidade. A curto prazo, é preciso que a questão fiscal seja endereçada para que investidores tenham confiança na estabilização da relação divida/PIB. Do contrário, all bets are off. A médio prazo, para que o Brasil tenha acesso a mais fontes de capital, devemos mudar a política ambiental ou pelo menos a percepção que se tem dela no exterior. Com os EUA retornando ao acordo de Paris, praticamente o mundo todo remará junto em direção à neutralidade de carbono. Caso o Brasil se junte a essa agenda, não apenas deixaremos de perder investimentos, mas temos também muito a ganhar com o desenvolvimento do mercado de créditos de carbono.
Roberto Attuch Jr. é fundador e CEO da OHMRESEARCH.