Mekala Krishnan e Tiago Devesa

Às vésperas do encerramento da COP30 em Belém, uma pergunta inevitável é: em que ponto está a transição energética?

Na perspectiva do copo meio cheio, fizemos algum progresso. Nos últimos dois anos, a implementação das tecnologias limpas necessárias para alcançar a meta de 2050, alinhada com os objetivos do Acordo de Paris, cresceu alguns pontos percentuais, chegando a 13,5%. Pela ótica do copo meio vazio, o ritmo desse avanço é de aproximadamente metade do que precisamos para manter o aquecimento do planeta “bem abaixo” dos 2ºC.

Essa é a luz que um novo estudo do McKinsey Global Institute joga sobre o momento atual. Descobrimos que o cenário da transição é mais bem caracterizado como sendo uma “história de muitas transições”. E, portanto, os líderes precisam de uma compreensão detalhada e diferenciada para traçar o caminho a seguir.

Descompasso nas perspectivas para o futuro

O MGI identificou 25 desafios físicos relacionados à inovação e à adoção de tecnologias limpas e constatou que avançamos na resolução dos mais simples, mas estamos estagnados nos mais complexos – justamente aqueles cuja resolução seria necessária para eliminar cerca de metade das emissões do sistema energético.

Tráfego fluindo

Entre os domínios que mais progrediram estão os setores de eletricidade e mobilidade. A capacidade global anual de geração de energia elétrica com baixas emissões, por exemplo, dobrou entre 2022 e 2024, alcançando aproximadamente 600 gigawatts. Mantido esse ritmo, a meta de 1.000 GW por ano até 2030 parece alcançável.

A China foi responsável por dois terços das recentes adições globais. Mas enquanto o ritmo do progresso abrandou em alguns mercados como os Estados Unidos, outras economias emergentes aceleraram. O Brasil adicionou 19 GW em energia solar e eólica em 2024, um aumento de 50% comparado com 2022. Já a Índia ampliou sua capacidade em 28 GW no ano passado, um aumento de mais de 80% comparado com 2022.

A eletromobilidade é outra dimensão de destaque. Este ano, os carros elétricos representaram 25% das vendas de carros de passageiros em todo o mundo. No Brasil, esse percentual é mais baixo, mas por aqui o ritmo de crescimento dos elétricos é maior do que em países como os Estados Unidos.

Pista escorregadia

Entre os desafios mais exigentes estão a descarbonização de indústrias pesadas e a implantação eficiente do hidrogênio. Para se ter uma dimensão: apenas 10% dos projetos de hidrogênio anunciados chegaram à decisão final de investimento no ano passado, e mais de 50 foram cancelados até o meio deste ano, incluindo os relacionados a indústrias e combustíveis. Isso revela o enorme descompasso entre o que é planejado e o que vira realidade.

Ainda assim, surgem sinais promissores. Novas tecnologias de eletrificação, como baterias avançadas e tecnologias de aquecimento elétrico de alta temperatura, começam a ser aplicadas em setores intensivos em carbono, como transporte de longa distância e produção de cimento. E os data centers, conhecidos pelo alto consumo energético, poderão impulsionar a geração de eletricidade limpa – como nuclear, geotérmica e gás com captura de carbono.

O papel das lideranças

Estaremos mais perto de alcançar os objetivos da transição energética se as lideranças forem capazes de atuar a partir do reconhecimento das especificidades de cada frente desse esforço.

Para as dimensões que já estão avançando, é preciso ter disciplina na execução, não deixando escapar as oportunidades de acelerar o avanço, identificando precocemente possíveis gargalos e tomando medidas para superá-los o quanto antes.

Já as frentes mais desafiadoras, que patinam ou avançam muito lentamente, não há rota alternativa: é preciso inovar. E isso não significa apenas desenvolver novas tecnologias de baixo carbono, mas considerar a integração entre elas, como elas se potencializam e como os mercados podem se organizar para alavancá-las.

A transição é, por definição, um processo multidimensional e dinâmico. Não haverá uma solução simples nem um ponto-final. O que definirá o sucesso será a capacidade de agir com agilidade diante da incerteza, aprendendo e se adaptando continuamente a um cenário em mutação.

A COP30 nos lembra de que todo grande desafio é, na verdade, um conjunto de muitos desafios menores. Precisamos reconhecer e compreender cada um deles para sermos capazes de atuar de forma mais coordenada e eficaz.

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Mekala Krishnan é sócia do McKinsey Global Institute, onde Tiago Devesa é pesquisador sênior.

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