O voto plural ‘à brasileira’ conseguiu a proeza de desagradar todo mundo.
Os que defendiam a criação do mecanismo como forma de evitar a evasão de empresas rumo à Nasdaq acharam que, do jeito como foi criado, o voto plural no Brasil foi insuficiente.
Já os defensores do “one share, one vote” consideraram o instituto uma ‘bomba atômica’ contra os avanços que o País já fez na governança corporativa.
“A adoção do super vote e o fim do CAF — comitê de aquisições e fusões — são dois retrocessos de longo prazo num momento de boom de IPOs”, diz um gestor. Segundo ele, os dois eventos deterioram o ambiente do mercado brasileiro, que com frequência convive com disputas entre controladores e minoritários.
A criação do super voto é parte da Lei do Ambiente de Negócios, aprovada pelo Congresso no início de agosto e sancionada pelo Presidente Bolsonaro na semana passada.
Quem defendia a criação do supervoto ficou decepcionado — alguns, furiosos — porque a lei acabou trazendo várias amarras ao mecanismo que, na visão deles, podem acabar inibindo o seu uso.
O super vote é comum no mercado americano, adotado por companhias cujos fundadores são vistos como um diferencial do negócio. Mas lá as características desse mecanismo são definidas pelas empresas, em seus estatutos.
Aqui, está agora na lei que esse superpoder será de no máximo 10 votos e vai valer por sete anos, prorrogáveis por prazo indefinido e sem o voto de quem detiver as super ações.
O formato brasileiro também define na lei que o super poder não vale para decidir a remuneração dos administradores ou transações entre partes relacionadas. E só poderão adotar o super vote as companhias fechadas ou antes da realização de um IPO — estão fora da lista todas as empresas já listadas.
“A redação acabou limitando muito o poder decisório das empresas. Parece ter esquecido a premissa importante de que vai usar o mecanismo a empresa que quiser, assim como vai ser acionista dela aquele que quiser. As duas partes deveriam ter mais liberdade para discutir essas condições”, diz uma fonte. Para ele, excluir a possibilidade para as empresas já listadas é um “disparate”.
“Ainda assim, acho melhor ter do que não ter. Mudanças regulatórias são um processo, que não agrada a todos. E certamente o assunto não foi blindado. Problemas vão surgir,” diz a fonte.
A lei acabou trazendo salvaguardas que foram defendidas pela Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (AMEC) — que nunca morreu de amores pelo tema mas acabou entendendo que deveria acompanhar a evolução do mercado. “A redação final ficou bastante equilibrada e traz vantagens para todas as partes,” Fabio Coelho, presidente da AMEC, disse ao Brazil Journal.
A pressão pela adoção do super voto no Brasil veio de companhias, bancos e da B3, depois que diversas empresas brasileiras optaram por IPOs nos Estados Unidos alegando a possibilidade do super voto — ainda que parte importante da evasão sejam os investidores globais especializados em tech, que só podem investir sob a proteção do arcabouço regulatório americano.