Preso nesta manhã na Operação Trapaça, o ex-CEO da BRF, Pedro Faria, é acusado de acobertar um esquema de fraudes em amostras para burlar o sistema de conformidade sanitária do Ministério da Agricultura.
Por volta de 11:50 hs, a ação da BRF cai cerca de 15% na Bolsa.
O Brazil Journal se debruçou sobre os pedidos de busca e apreensão e as evidências que a Polícia Federal apresentou à 1a Vara Federal de Ponta Grossa.
A acusação contra Faria é localizada: tem seu ponto de partida num processo trabalhista movido em 2015 por uma ex-funcionária do controle de qualidade da fábrica de Mineiros (GO) — a mesma unidade que foi interditada temporariamente no ano passado pela Carne Fraca.
No processo judicial, consta que Adriana Marques Carvalho “era obrigada a alterar o resultado das análises que diagnosticavam contaminação. Assim, se a análise constatasse a presença de salmonella ou outro tipo de contaminação, por ordens expressas dos superiores, devia alterar os registros nos laudos publicados, os destinados à fiscalização”.
Em setembro de 2015, a advogada da BRF que estava conduzindo o caso trabalhista alerta seus superiores imediatos sobre a sensibilidade do processo. O email vai sendo encaminhado a diversos diretores e chega a Pedro Faria. Ele, então, encaminha uma breve mensagem a Helio Rubens, o VP de operações da companhia:
“É um absurdo! Impressionante como sempre levamos bucha dos mesmos lugares. Hélio por favor avalie algo drástico por lá. Tem coisa que ofende nosso senso de propósito.”
Cerca de dois meses após a advogada alertar sobre o processo, o gerente jurídico Luciano Wienke autoriza o fechamento de um acordo com Adriana por R$ 70 mil. “Valor de uma reclamatória com menos de 02 anos não chegaria nem a R$ 15.000,00 mas como esse assunto (sic) temos esse problema vamos ter que pagar mais”, diz numa troca de emails.
Semanas antes, Wienke havia classificado o assunto como prioritário, “sob pena do Juiz enviar as informações para os órgãos competentes e complicar mais a situação da empresa”, disse em uma mensagem encaminhada à diretora jurídica, Ana Rovai.
Num dos emails, Rubens, o VP de operações, pede a André Baldissera, o diretor de operações regional: “Vamos ter bastante trabalho pela frente! Vamos eliminar todas as exposições! Conversamos na próxima semana”. A PF e o juiz entenderam que se trata de uma ordem para destruir provas — mas não fica claro se os executivos estavam tratando de providências para evitar que a adulteração continuasse a se repetir na unidade.
A partir desses fatos, o juiz avalia: “Todos esses investigados, informados de graves crimes de falsidade ideológica e contra a saúde pública (…) em vez de avisar os órgãos de fiscalização e usar sua autoridade na empresa para mandar apurar os fatos e corrigir irregularidades, não só permaneceram inertes, como ainda ajustam suas vontades para ocultar os ilícitos”.
E continua: “Pedro, André e Hélio ostentam posição privilegiada no organograma hierárquico da empresa, o que lhes permite, por sua ascendência aos demais funcionários, intimidar estes últimos, além de terem pleno acesso às provas, o que poderia ocasionar sua ocultação/destruição”.
Hélio Rubens, o VP de operações, foi desligado da BRF semana passada.
A Operação Trapaça também investiga outras irregularidades na BRF, mas Faria não é diretamente implicado.
A PF recebeu denúncias de que a BRF teria encoberto um surto de salmonella na unidade industrial de Carambeí, no Paraná, em 2016. A denúncia foi feita por Cristianne Liberti, uma granjeira terceirizada, que diz ter recebido 46 mil pintos contaminados para engorda. A BRF não teria feito nada a respeito da contaminação, que atingiu outros estabelecimentos na cidade, e os frangos foram abatidos mais tarde na planta da companhia na cidade. A ocultação da contaminação ocorreria por manipulação de resultados por laboratórios que trabalhavam em conluio com a companhia.
Outra acusação diz respeito ao uso de substâncias não aprovadas pelo Ministério da Agricultura na ração dos animais. Emails trocados pelo corpo técnico supostamente mostram tentativas de burlar a fiscalização, ao menos em algums unidades.
O juiz autorizou processos de busca e apreensão na sede da BRF, em São Paulo, e na Tarpon, uma das maiores acionistas da BRF e onde Faria é sócio.
A operação envolve ao todo 11 mandados de prisão temporária, 27 de condução coercitiva e 53 mandados de busca e apreensão nos estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás e São Paulo.
A ação é coordenada entre Polícia Federal e Ministério da Agricultura e Abastecimento, e vem no mesmo dia em que o conselho da BRF se reúne para deliberar sobre a convocação de uma assembleia de acionistas que deve renovar 70% do conselho.
Abaixo, fac simile do email enviado por Faria que consta do pedido de busca e apreensão feito pela Polícia Federal.
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