E de repente… o mercado ficou (temporariamente?) ‘crowded’.
 
Evidência No. 1: a Tecnisa teve que precificar sua oferta a R$ 1,1 por ação, um desconto boçal em relação ao R$ 1,58 do fechamento de ontem (um dia em que o papel já fechou em queda de 7%).
 
OK:  há vários motivos para um desconto tão grande no caso da incorporadora.  Para começo de conversa, ela precisava muito mais dos investidores do que o contrário.
 
Mas os sinais de exaustão do mercado não param por aí.
 
Evidência No. 2:  Ontem à noite, a 24 horas do fechamento de sua oferta, o IRB Brasil tinha, na melhor das hipóteses, apenas as ordens necessárias para cobrir a oferta, sem nenhum sinal de oversubscription.
 
Na última semana, a excitação com o bull market de 2019 está dando lugar a uma pausa, em grande parte porque o número de emissores vindo a mercado está causando uma indigestão.
 
A Hapvida está trazendo R$ 2,6 bilhões em novos papeis para financiar seu crescimento; a Movida, a locadora de carros da JSL, quer levantar R$ 800 milhões; o IRB, R$ 7,8 bilhões, numa oferta secundária da União e do Banco do Brasil.  E, last but not least, a Petrobras deve levantar pelo menos R$ 9 bilhões com a BR Distribuidora (assumindo aí um preço hipotético de R$ 23 e a colocação de todos os lotes adicionais).  
 
Passando a régua, dá R$ 20 bi — sem falar de Banco Inter, Banco Pan, Alupar, Banco do Brasil…
 
Mas tem mais.
 
Em sua posse, o novo presidente do BNDES, Gustavo Montezano, disse que pretende vender R$ 100 bilhões em participações acionárias do banco em empresas.
 
(Muita calma nessa hora, Gustavo, senão tu estraga a festa.  Melhor focar na caixa preta.)
 
O banco tem posições relevantes em Petrobras, Vale, JBS e Suzano.  Estes são só os nomes em que o valor de mercado da participação do banco se conta em bilhões de reais.  Em vários outros nomes, a participação é menos expressiva, mas o free float dos papeis, também — o que significa que a pressão potencial é a mesma. 
 
Talvez seja o fato de que a Previdência não “passou” ainda.  A Câmara entrou em recesso deixando o segundo turno para agosto, e o Senado, com a árdua tarefa de reinserir estados e municípios no texto.  Valha-me, São Tasso Jereissati.
 
Mas o mercado tem que se preparar para uma realidade mais dura:  e se, mesmo com a reforma aprovada, o fluxo internacional demorar a vir?  O mercado conseguirá se escorar apenas no fluxo que migra todo dia da renda fixa?  (No caso da BR, por exemplo, até ontem as ordens eram predominantemente de investidores locais, ainda que seja natural o investidor internacional entrar mais perto da data de corte: segunda-feira à tarde para novas ordens, e terça para ajustes de preço.)
 
Para um operador experiente que já trabalhou anos fora do País, “Se logo depois da Previdência você começar a aprovar uma reforma tributária, isso dá confiança, porque o gringo gosta é do gerúndio — ‘está melhorando’…. Se você falar só que ‘melhorou’, opa!  Ele cai fora achando que é o fim da festa.” 
 
No mês de julho, o fluxo de capital estrangeiro na Bolsa está negativo em cerca R$ 950 milhões, e, no acumulado do ano, o saldo está negativo em quase R$ 5 bilhões.
 
Estes números, no entanto, não capturam a participação dos gringos em ofertas.  Segundo a Anbima, ela caiu para 41% de todas as ofertas no primeiro semestre deste ano, comparado a 63,7% no mesmo período do ano passado, quando o presidente ainda se chamava Michel Temer.  (Se isso serve de consolo, o crescimento dos fundos de investimento locais contribuiu para esse encolhimento do papel relativo do investidor internacional.)
 
Por ora, o mercado segue aquele mantra da internet: “Ninguém larga a mão de ninguém.”