Os fundos de pensão fecharam 2024 com a menor alocação histórica em renda variável: apenas 5% do R$ 1,2 trilhão de recursos administrados por eles. Desde um pico de 22% de alocação em Bolsa em 2007, esse percentual vem caindo – em 2023, era de 7%.
A maioria avassaladora dos recursos (92%) está em renda fixa, por conta dos patamares da Selic e das NTN-Bs utilizadas nas metas atuariais.
A partir dos dados acima, divulgados pela Abrapp, a gestora Ártica e a Aditus, uma consultoria especializada em fundos de pensão, fizeram um estudo em que ouviram 23 fundações que juntas gerem mais de R$ 300 bilhões. As fundações responderam 70 perguntas sobre seu processo decisório de investimentos.
Nota técnica relevante: Os dados de alocação da Abrapp se baseiam numa série história iniciada em 2001 e excluem da conta a Previ, que sozinha representa 22% da indústria e investe 25% de seu patrimônio em renda variável, significativamente mais que as outras fundações.
O estudo da Ártica/Aditus identificou fatores que estão pesando para a baixa alocação em Bolsa, para além do conservadorismo do setor.
“Chamou atenção o fato de os fundos de benefício definido estarem com duration curto. Então, faz pouco sentido mesmo alocar em ativos mais arriscados,” Raphael Castilho, sócio da Ártica, disse ao Brazil Journal. Os fundos de benefício definido respondem hoje por 60% do patrimônio da indústria.
“Além disso, observamos que dentro dos planos, em geral, há cada vez mais perfis de alocação definidos pelos beneficiários finais, que têm migrado para as opções mais conservadoras nos últimos anos,” disse Castilho. “Muitos fundos de ações performaram abaixo do Ibovespa, então faz sentido a movimentação.”
Na indústria de fundos de investimento, a alocação média em renda variável está em 8,3%, um patamar também próximo das mínimas históricas, observadas no final de 2024 (7,8%) e durante a crise de 2016 (7,4%), segundo dados do BTG Pactual.
Para Bernardo Fusato, outro sócio da Ártica, a indústria de fundos de pensão vive uma mudança estrutural. “Os fundos de benefício definido não são mais vendidos e, quando eles acabarem, sobrarão os planos de contribuição variável e contribuição definida, mas só que cada vez mais com o uso disseminado de perfis de alocação definido pelo investidor,” disse.
Na prática, segundo Fusato, isso está fazendo com que o passivo desse segmento, que deveria ser de longo prazo – ou teve essa característica em algum momento – “adote um comportamento pró-cíclico igual ao de um investidor pessoa física da Bolsa. Ele tende a estar na alocação mínima durante as mínimas do mercado e na alocação máxima nas máximas do mercado – justamente o inverso do que deveria fazer.”
Dado que as fundações estão no low de alocação em renda variável e este ano e a Bolsa está indo bem, ele diz, “é muito provável que se a Selic começar a cair enquanto eles estiverem revisando as políticas de investimento, eles aumentem a alocação em renda variável no começo do ano que vem,” disse Fusato.
A grande maioria dos fundos tem políticas de investimento definidas previamente todo fim de ano. Nelas, estão previstos os percentuais de alocação em cada classe de ativos, com a possibilidade de eventuais mudanças táticas.
O sistema de remuneração dos gestores não é agressivo, mas existe um percentual variável. No entanto, eles são avaliados anualmente.
“Ou seja, o processo de investimento não é estruturado para que haja uma alocação de longo prazo. Se ele investir na economia real, em ações ou private equity, fica muito mais difícil obter um retorno em um ano,” disse Fusato.
O paradoxo é que quando questionados sobre quais tipos de investimentos ainda oferecem poucas opções no Brasil, os gestores responderam private equity, venture capital e, também, small caps. “Eles sentem falta de opções nas quais provavelmente não vão investir,” disse Castilho.
A Ártica tem R$ 370 milhões sob gestão e não tem entre seus clientes fundos de pensão.
A íntegra do estudo está aqui.