Em tempos de emergência climática, bons motivos não faltam para colocar o brasileiro na estrada da eletrificação. Os veículos elétricos são menos poluentes do que os movidos a gasolina (até -80%) e a etanol (até -40%), geram 50% menos ruído e têm custos de manutenção até 40% mais baixos.

Mas pode ser difícil convencer o consumidor a pegar essa via – ou a se manter nela – com uma infraestrutura de recarga ainda deficitária no País. Para garantir que os atuais e futuros donos de carros elétricos não acessem o primeiro retorno para voltar aos motores a combustão, a expansão da oferta de pontos de carregamento precisa acelerar.

Com uma frota de 1,4 milhão de veículos elétricos prevista para 2030, incluindo os modelos híbridos plug-in, serão necessários aproximadamente 580 mil carregadores, sendo 90 mil públicos e 490 mil residenciais e de frotas. Os dados são de um novo levantamento da McKinsey sobre o tema. Traduzindo em valores, isso significa uma oportunidade de aproximadamente R$ 6,8 bilhões para as empresas do setor. Se somada a demanda de energia, o total pode chegar a R$ 13,4 bilhões.

Um futuro cada vez mais elétrico

Seja pela via da sustentabilidade, da manutenção mais econômica ou dos incentivos fiscais como isenção do IPVA, a venda de elétricos vem crescendo no Brasil. Nos primeiros oito meses deste ano, 6,4% dos licenciamentos foram de veículos elétricos a bateria ou híbridos plug-in – um aumento de mais de 100% em relação a 2023. Embora o mercado dê sinais de desaceleração, a perspectiva é positiva, diferentemente da tendência de estagnação já estabelecida na União Europeia e nos Estados Unidos.

Talvez mais importante do que analisar o retrato atual seja olhar para a próxima ocasião de compra. Impressionantes 44% das pessoas entrevistadas pela McKinsey manifestaram o desejo de adquirir um veículo elétrico na próxima troca, ante 38% de intenção global. E os carros chineses são bem-aceitos pelos brasileiros: metade do público de olho em um elétrico está disposta a adquirir um veículo made in China, ante 20% em um mercado mais resistente como a Europa.

Está difícil recarregar as baterias

Diante de um cenário tão propício à expansão, seria esperado um céu de brigadeiro para os veículos elétricos decolarem. Mas há nuvens no horizonte: 38% dos proprietários de elétricos no Brasil consideram voltar para os modelos a combustão. Um dos principais motivos de insatisfação de quem tem um carro elétrico também preocupa quem está considerando a aquisição: a infraestrutura de recarga.

Entre quem já dirige veículos elétricos, mais de um terço considera a infraestrutura de carregamento atual insuficiente, e uma parcela semelhante relata que a preocupação com a recarga é fonte de estresse. Hoje, estima-se que existam 80 mil carregadores no país.

Para atender à demanda futura, será preciso aumentar em mais de seis vezes esse número. Nessa equação entram os pontos de recarga para veículos de passeio (84% da frota em circulação) e as soluções para veículos pesados, como caminhões e ônibus, que, embora componham apenas 16% da frota atual, representarão quase 70% da demanda de energia para carregamento em 2030.

Diversificando a infraestrutura

Recarga residencial: apesar de representar um potencial de mais de R$ 1 bilhão até 2030, é menos atrativa para novos players devido à crescente comoditização dos carregadores de parede – aqui, a regra do jogo é oferecer um produto de baixo custo em grande escala.

Recarga no destino: com pontos de recarga em estacionamentos de shoppings, mercados e torres comerciais, é semelhante à residencial, mas com uma diferença importante – a natureza B2B da venda dos carregadores aumenta a escala ao ampliar o universo a ser atendido. Para demarcar esse território e capturar uma parcela dos aproximadamente R$ 2 bilhões em oportunidades nos próximos quinze anos, as empresas devem ter sólida capacidade de venda, instalação e assistência pós-venda.

Eletropostos dedicados: semelhantes aos postos de gasolina, mas no contexto de recarga, atendem tanto aos veículos leves quanto aos pesados na situação on-the-go; ainda têm baixa utilização e alto custo operacional. Mas a perspectiva é de expansão à medida que a frota de elétricos aumentar, compondo uma oportunidade de cerca de R$ 1,5 bilhão. É preciso levar em conta, no entanto, que a estimativa é que 90% da frota elétrica circule em regiões metropolitanas, o que limita o tamanho dessa fatia do mercado.

Recarga nos hubs das frotas: considerando as necessidades de ônibus e veículos comerciais, será fundamental para assegurar um abastecimento regular e o início pontual das operações desses veículos. Muitas empresas já anunciaram a migração de parte da frota para veículos elétricos, reforçando a atratividade deste segmento. O tamanho do mercado e o valor agregado do serviço fazem deste modelo o mais promissor: uma oportunidade de quase R$ 2 bilhões até 2030.

Aposta no crescimento

Diante do cenário de mudanças climáticas e consequente busca por alternativas ao uso de combustíveis poluentes, a eletrificação veio para ficar. E o consumidor brasileiro tem tudo para embarcar nessa jornada. Permanecer nela, no entanto, dependerá da melhoria substancial da infraestrutura de recarga.

E as empresas que se dispuserem a entrar nesse mercado para abastecer o desejo de mudança do consumidor terão a oportunidade de colher retornos positivos no médio e longo prazo. Com os players ainda se posicionando no tabuleiro da oferta de serviços de recarga para veículos elétricos, não há territórios totalmente conquistados.

Roberto Fantoni é sócio sênior da McKinsey em São Paulo.
Daniele Nadalin é sócio associado da McKinsey no Rio de Janeiro.
Colaborou Camila Schipper, gerente de projetos da McKinsey em São Paulo.

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