Jorge Cerezo e Thalita Marcondes 

O avanço da tecnologia revolucionou a indústria e alavancou a produtividade em muitas partes do mundo, mas o Brasil ainda não conseguiu concretizar as promessas de automação e digitalização. Nos últimos cinco anos, 80% do crescimento da produtividade no país se deu pelo aumento da mão de obra e não pelas esperadas melhorias na competitividade com o uso de novas ferramentas.

Apesar de muitas empresas já terem feito grandes investimentos, a capacitação ainda persiste como um enorme desafio. Um estudo global da McKinsey, com mais de 450 companhias, mostrou que metade delas não conta com talentos habilitados para implementar a agenda digital.

Lapidar os talentos internos

A defasagem nas habilidades e capacidades internas é percebida como um obstáculo maior à implementação da agenda digital do que a falta de investimento, a indisponibilidade de dados ou os desafios com a tecnologia atual.

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Para superar esse déficit de capacitação, o caminho mais eficiente é o treinamento e a qualificação dos profissionais que já fazem parte do quadro de funcionários das empresas. Segundo estimativas do Observatório Nacional da Indústria, esse é um universo de aproximadamente 7,5 milhões de trabalhadores.

Existem fortes incentivos para as empresas tirarem os programas de requalificação do papel: para três em cada quatro executivos entrevistados, tais programas ajudam a fechar pelo menos metade da lacuna de capacidade. O aspecto financeiro também favorece essa abordagem. Pesquisas da McKinsey sugerem que cultivar os talentos internos custa até três vezes menos do que recrutar no mercado.

Além disso, há uma consideração importante a ser feita: se aprender novas habilidades leva um certo tempo, absorver a cultura e desenvolver familiaridade com os processos de uma empresa pode ser ainda mais demorado. Há um ganho em investir nas pessoas que já têm uma história com a empresa que, embora intangível, não pode ser ignorado.

Casos para se inspirar

Há bons exemplos em curso na indústria e que servem de farol. Para lidar com uma operação cada vez mais digitalizada, por exemplo, uma empresa líder de mercado no setor de bens de consumo colocou o desenvolvimento de talentos internos no topo das prioridades. Com as novas habilidades relacionadas ao mundo digital, essas pessoas, que antes desempenhavam funções operacionais, passaram a estar aptas também a atuar em atividades mais analíticas – e a multiplicar o conhecimento dentro da empresa. Os resultados são significativos, com aumento de eficiência de 3,5% e economia em custo de produção e desperdício.

Como parte do seu processo de transformação digital, outra companhia da área de material de construção civil implementou sistemas de automação e precisou capacitar a força de trabalho para operar no novo ambiente. O primeiro passo foi identificar as lacunas de habilidades que precisariam ser fechadas por meio de treinamentos práticos em conceitos de Lean e em tecnologias digitais. Em seguida, a empresa elaborou um plano de capacitação técnica que contribuiu para um incremento de 25% na produtividade.

Roteiro para uma jornada de capacitação

Embora a jornada de capacitação não seja uma simples receita de bolo, as empresas podem se beneficiar de um roteiro indicando as frentes de atuação determinantes para garantir a eficácia dos seus programas.

Eis quatro ações que não podem faltar no planejamento das empresas:

  • Mapear as capacidades que realmente importam para as alavancas de valor do negócio. Fazer um diagnóstico robusto, entendendo onde a empresa está e aonde ela deve chegar, é fundamental para definir as prioridades da jornada e os critérios para acompanhar a sua evolução.
  • Customizar os treinamentos para a maturidade atual e os requerimentos específicos da empresa. Programas eficazes apoiam a estratégia e endereçam necessidades claras do negócio. Alinhar os conteúdos dos treinamentos com os processos e sistemas atuais da empresa ajuda a manter o desenvolvimento de capacidades na direção e no ritmo certos.
  • Usar metodologias adequadas para a aprendizagem de adultos. Adultos aprendem de um jeito diferente. Para eles, a combinação de teoria com exercícios práticos e aplicações em campo é essencial. Colocar a teoria em prática e passar esse conhecimento a outras pessoas é o que, de fato, consolida o aprendizado. Das mais de 600 pessoas que participaram dos treinamentos no centro de capacitação e inovação da McKinsey em São Paulo nos últimos 2 anos, mais de 85% mencionaram a simulação prática como o principal destaque na aprendizagem.
  • Mensurar o progresso. Depois de investir no desenvolvimento de jornadas de aprendizagem de longo prazo, é fundamental acompanhar o avanço em relação aos critérios preestabelecidos. Caso contrário, o programa poderá perder tração e não ganhar escala suficiente para ajudar a organização a atingir e sustentar os objetivos de desempenho.

O futuro chegou – melhor se apressar

Embora as posições que requerem habilidades digitais sejam denominadas “empregos do futuro”, não se trata de algo distante no horizonte. Em muitas áreas da manufatura, o futuro já chegou. Em outras, os ganhos de eficiência seriam maiores se esse futuro pudesse ser antecipado.

Em todos os casos, quanto antes as empresas embarcarem na jornada de capacitação dos seus funcionários, mais perto estarão de colher os frutos do aumento da produtividade e de ajudar o país a entrar em uma trajetória ascendente de crescimento sustentável e inclusivo.

 

Jorge Cerezo é sócio da McKinsey em São Paulo e líder da prática de Operações na América Latina

Thalita Marcondes é sócia associada da McKinsey em São Paulo e líder do ILC – Innovation & Learning Center, centro de capacitação e inovação da McKinsey

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