Bruno Furtado, Pedro Fernandes e Priscila Ariani

Resolução de ano novo das empresas de consumo e varejo: se preparar para acompanhar o ritmo intenso de evolução dos hábitos de compra dos brasileiros. E haja fôlego – categorias e canais que antes eram de nicho cresceram significativamente e ganharam status de destinos, enquanto grandes categorias foram chacoalhadas pelo acirramento da concorrência e multiplicação das ofertas. Tudo isso em meio a mudanças macroeconômicas que afetaram juros e câmbio.

Alavancando resultados da pesquisa ConsumerWise da McKinsey – que monitora trimestralmente o comportamento do consumidor – e dados hipergranulares da Scanntech – plataforma de inteligência de mercado de bens de consumo que processa mais de R$700 bilhões/ano em compras via supermercados e atacarejos –, foi possível entender quais movimentos observados em 2024 devem se consolidar ao longo deste ano. Três tendências se destacaram: avanço dos alimentos funcionais, novo canal para compras de beleza e dieta mais proteica.

A era dos funcionais

Seguindo um curso inicialmente observado na pandemia, o brasileiro prioriza cada vez mais alimentos e bebidas com atributos funcionais claramente comunicados – como repor proteínas e sais minerais e manter-se acordado e atento. Dados da Scanntech mostram que, entre janeiro e novembro de 2024, houve um aumento de 48% nas vendas de suplementos para academia (como whey, creatina e power coffee) e de 22% nas de isotônicos em relação ao mesmo período do ano anterior. Esse movimento se deu mesmo diante da alta nos preços de 4,6% e 11,8%, respectivamente. Com preço estável, a categoria de energéticos cresceu 13%.

Tendência: a expectativa é que esse momentum atravesse este ano, uma vez que as ocasiões que estimulam o consumo dessas categorias ganham espaço na rotina da população. Segundo a pesquisa da McKinsey, 84% dos brasileiros pretendem gastar o mesmo valor ou mais na categoria de fitness & wellness, um dos maiores índices do mundo. E, segundo organizações do setor, o Brasil continua sendo o segundo maior mercado de academias do mundo – o primeiro da América Latina. São quase 60 mil unidades no país, um aumento de 17% em relação a 2022, sugerindo que a demanda por suplementos funcionais e energéticos seguirá forte ao longo do ano.

Um novo destino para beleza e higiene

Em 2024, as farmácias se fortaleceram como destino de beleza e higiene, ganhando 2 p.p. de participação em relação a super e hipermercados, principalmente para itens acima de R$15 por unidade, como fralda, xampu e condicionador. Esse movimento é consequência da evolução da proposta de valor do canal, que teve como pilares a expansão para posicionar-se como conveniência – com mais de 90 mil pontos de venda no Brasil, a farmácia está mais perto de casa do que o supermercado em muitas cidades –, a melhoria da experiência de compra e a digitalização.

Na comparação com o varejo alimentar, o canal de farmácias acelerou mais a sua participação no digital. Três grandes redes de farmácia indicam que suas vendas online representaram de 15% a 20% do faturamento no terceiro trimestre do ano passado, acima da média do varejo de alimentos. Segundo a pesquisa da McKinsey, cuidado pessoal é a categoria que mais cresce no e-commerce: as vendas triplicaram entre 2019 e 2023 e já chegam a 27% do faturamento dos canais digitais das redes de varejo alimentar.

Tendência: tudo indica que os consumidores vão incrementar suas missões de compra de beleza e higiene em farmácias e nos canais digitais. Aos fabricantes desses produtos, caberá reforçar a execução nesse novo destino; às empresas de varejo alimentar, repensar a atratividade da execução para essas categorias a fim de atender aos momentos de compra dos consumidores neste canal.

Mais proteína no prato

Dados da Scanntech mostram que o brasileiro está reforçando a proteína na dieta, com a venda de categorias relacionadas subindo 3,3% nos dez primeiros meses de 2024 em relação ao mesmo período do ano anterior. Produtos mais econômicos ou que tiveram queda no preço médio, como a carne bovina e o ovo, cresceram acima da médiaa (11,6% e 5,9, respectivamente).A sensibilidade ao preço é esperada em um contexto de consumidores apreensivos com a inflação. E a preocupação é justificada: segundo o IBGE, no resultado acumulado em 12 meses até setembro passado, os preços de alimentos e bebidas subiram 5,9%, superando os 4,4% do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).

Na busca por valor, as opções de proteína empanada se destacaram. Apesar de relativamente pequena (2% do valor total da cesta proteica), essa categoria liderou o crescimento entre as proteínas, com alta de 21,5% em volume e 9,5% em valor. Para isso, contribuíram o preço 10% mais baixo por volume, a facilidade no preparo (conveniência no preparo é um grande motivador de compra entre millenials e geração Z, de acordo com a pesquisa da McKinsey) e o baixo desembolso – enquanto o consumidor paga perto de R$5 por unidade de empanado, uma porção equivalente de outras proteínas custa entre R$13 e R$45.

Tendência: para 2025, a proteína deve seguir em alta no cardápio, mas o consumidor não mostra apego a uma fonte específica. A chave para gerenciar o ano será acompanhar o preço da carne bovina, que é influenciado por fatores como mudanças climáticas, condições de exportação (como as consequências do acordo entre Mercosul e Europa), dinâmicas internas e, é claro, a evolução do preço médio e da disponibilidade dos substitutos, como os empanados.

Sem bola de cristal, mas com uma certeza cristalina

É impossível prever o futuro, mas o passado recente e o presente nos dão indícios de para onde os consumidores estão indo, em busca do quê e com qual expectativa. As empresas do varejo terão a missão de entender esses movimentos e inclinações para estar à altura do desafio de servir um cliente que busca cada vez mais valor por real investido e faz questão de ser atendido nas suas necessidades individuais – de canal, ou estilo de vida.

 

Bruno Furtado é sócio sênior da McKinsey em São Paulo e líder da prática de Consumo na América Latina.

Pedro Fernandes é sócio da McKinsey em São Paulo e atua nos setores de consumo e varejo

Priscila Ariani é diretora de marketing da Scanntech Brasil

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