Geralmente situado em algum lugar entre o sisudo e o monossilábico, André Jakurski estava mais descontraído e falante do que até os mais íntimos esperavam.
A ocasião era o lançamento do livro ‘Fora da Curva: Os segredos dos grandes investidores do Brasil — e o que você pode aprender com eles.’
Apesar da noite fria e chuvosa lá fora, o pequeno auditório da PUC-Rio transbordava com alunos, empresários e amigos dos autores-debatedores.
Na mesa, três representantes da escola ‘long only’, investidores de longo prazo: Florian Bartunek, da Constellation; Pedro Damasceno, da Dynamo; e Guilherme Aché, da Squadra.
E, no meio deles, aquela avis rara: o operador reconhecido por seus pares como ‘o melhor trader do Brasil’; o homem capaz de zerar tudo sempre que o seu ‘gut’ muda de opinião; que almoça há anos em sua mesa de trabalho para ficar de olho na tela; o cara que estuda e mede forças com o Risco todos os dias — e ainda faz tudo isso alavancado.
“A bolha da dívida na China é tão grande que quando aquilo explodir vai ser uma explosão ‘universal’ em vez de ‘planetária’; o planeta já ficou pequeno pras dimensões daquilo,” disse Jakurski, 66 anos e um dos fundadores do velho Banco Pactual, injetando pavor e risos na plateia. “O mercado passa dois terços do tempo subindo e um terço caindo, mas quando cai, essa queda acontece rápido, de uma vez.”
Para o sócio da JGP Gestão de Recursos, “o mundo hoje está mais para você ter posições táticas do que permanentes. Posição permanente é aquela que você investe com horizonte de longo prazo. Tático é aquilo que você está disposto a mudar de ideia a qualquer momento.”
Mas depois de pintar um quadro global complicado (senão tenebroso), resolveu fazer um hedge no prognóstico: “O Brasil está numa fase diferente do ciclo, porque afundou dramaticamente.”
Numa conversa que iluminou o contraste clássico entre operar e investir, os três gestores à mesa foram portadores de todas as mensagens sensatas que se esperam de gente que administra o dinheiro de faculdades e fundos de pensão americanos: compre qualidade, não transija, invista pro longo prazo, teste sempre suas convicções… Segundo eles, “as grandes fortunas foram todas feitas por duas coisas: ‘long-term compounding’ [o processo de gerar mais lucro reinvestindo os lucros anteriores] e evitar os grandes erros.”
Jakurski mostrou que uma grande mudança patrimonial é possível “quando a oportunidade certa aparece e quando você opera grande.” [Kids, please don’t try this at home.]
Contou dois casos.
Em 1991, Jakurski foi a uma conferência nas Bahamas acompanhado de sua mulher. Chegando lá, “o zum zum zum era a Telmex”. A Telmex acabara de fazer uma oferta de ações na Bolsa de Nova York. Jakurski começou então a estudar o equivalente brasileiro, a Telebras. Fez as contas e descobriu que a Telebras negociava a um múltiplo de 3x seu lucro. (Mais tarde, ao refazer as contas, viu que o múltiplo era de apenas 0,5x.) “Eu falei, isso aí tá de graça. Quando os gringos descobrirem, esse papel vai dar uma porrada. Passei a comprar Telebras todo dia. Chegamos a ter 100% do patrimônio do Pactual na Telebras. Só com essa operação nós quintuplicamos o tamanho do banco. Foi aí que a gente deixou de ser um banco pequeno.”
Depois deu um exemplo mais recente. “No último ano e meio, a Petrobras era vista como uma empresa-lixo, uma empresa que vai quebrar, que não vai conseguir pagar suas dívidas. Com isso, os títulos da empresa, que antes rendiam 5-6% ao ano em dólares, estavam rendendo até 16% ao ano. Eu comprei US$500 milhões em títulos da Petrobras curtos, com vencimento até 2019, e hoje eles estão rendendo 3%.”
Resumiu a ópera: “Quando eu vejo uma oportunidade, eu entro pra matar. Mas essas grandes oportunidades acontecem quando você está na contramão do mercado — quando todo mundo acha que vai acontecer uma coisa e você pensa diferente — e quando aparece uma oportunidade grande, o que é raro.”
Já havia passado o microfone para um colega quando notou que esquecera de fazer uma distinção importante: “Olha, essas operações de curto prazo não tem nada a ver com informação fundamental. Isso aqui tem a ver com sentimento, com psicologia. É saber o que os outros estão pensando. É igual a um concurso de beleza em que você tem que apostar na vencedora. Não importa quem você acha que é a mais bonita, e sim o que os outros acham, para você fazer a aposta certa.”
Jakurski também explicou como lida com seus erros. “Minha teoria é de que todos nós temos pelo menos 5 minutos de estupidez por dia. O segredo é não exercer os seus 5 minutos muito agressivamente… Mas errar é uma constante: ou você escolheu o papel errado, o timing errado, ou errou o tamanho da posição… Mas você tem que acordar no dia seguinte e não se lembrar mais disso. É claro que você tem que aprender lições, mas você tem que olhar pra frente.”
Perguntaram que conselhos ele daria a um jovem de 20 anos. “Tenha sorte, muita sorte. [A vida] é igual a estar numa batalha ou numa guerra: você pode levar um tiro ou sobreviver. Tem aquela frase dos americanos: ‘Success is when preparation meets opportunity.’ Mas a maior sorte é encontrar sua vocação. Tem gente que passa a vida toda e não encontra. Você tem que se preparar e, quando o cavalo passar selado, monta em cima! Eu trabalhei no Unibanco dez anos. Fazia crédito, investment banking, até que eu descobri que o que eu gostava mesmo era descer lá na corretora, no andar de baixo, e operar pra mim.”
Sentado na primeira fila, um garoto perguntou se havia um propósito para a sociedade em seguir carreira no mercado financeiro.
Em vez de filosofar, Jakurski atalhou. “Você tem que fazer o que você gosta. Se eu te oferecer você estar agora com 80 anos e US$10 bilhões, você aceitaria? Claro que não, né? E por um motivo simples: porque a viagem até lá tem que ser tão agradável quanto o destino.”
Depois de anos sem falar quase nada, André Jakurski mostrou que tem muito a dizer.