O reajuste tarifário calculado pelo IFC para o primeiro ano do contrato da Sabesp pós-privatização tem tirado o sono de analistas e investidores — e pode colocar em risco o processo de privatização da gigante do saneamento.

O cálculo, publicado na semana passada pelo Governo de São Paulo, mostra que a tarifa média da Sabesp cairia 6,4% no primeiro ano.

O número, no entanto, não bate com o cálculo de 10 entre 10 investidores que têm o papel na carteira — levantando dúvidas se o que houve foi um simples erro matemático, que pode facilmente ser corrigido, ou se foi uma decisão deliberada por parte do Governo. 

Como nem o IFC nem o Governo do Estado se manifestaram até agora, a dúvida continua no ar – paralisando o buyside e investidores estratégicos.

A conta para chegar no reajuste tarifário não é uma equação complexa. Primeiro, calcula-se a receita atual, basicamente multiplicando a tarifa praticada hoje, que é dada pela Arsesp, pelo volume consumido, dado pela Sabesp. 

Nessa conta, chega-se a R$ 24,2 bilhões, que, tirando o PIS/Cofins de 7%, cai para R$ 22,5 bilhões, ou uma tarifa média de R$ 6,30/m³. 

Na sequência, basta calcular a diferença entre este número e a receita requerida do novo contrato, que será de R$ 22,4 bilhões, ou uma tarifa média de R$ 6,34/m³. 

Por esta conta, o reajuste tarifário ao final do primeiro ano seria positivo em 0,6% — e não a queda de 6,4% divulgada pelo IFC.

Outra forma de fazer essa conta é pegar a receita atual da Sabesp – publicada pela Arsesp – de R$ 20,9 bilhões. Considerando o reajuste deste ano, ela subiria para R$ 22,2 bi, uma tarifa média de R$ 6,23/m³. 

Usando estes números, o reajuste seria um aumento de 1,8%, em vez da queda de 6,4%. 

“Se a Sabesp tiver que aplicar esse reajuste calculado pelo IFC, isso vai significar uma perda de R$ 1,4 bilhão todo ano de EBITDA,” disse um gestor comprado no papel. “No NPV, isso vale mais de R$ 10 bi para uma empresa com um valor de mercado de R$ 50 bilhões.” 

“Mesmo que a ação caísse 20% para refletir isso, tem um impacto brutal na credibilidade do processo. Se não corrigirem isso, mata a privatização.”

Uma das hipóteses circulando no mercado é que o erro no cálculo do IFC teve a ver com um pequeno grande detalhe. 

O IFC teria se esquecido de considerar o PIS/Cofins no cálculo da receita atual, ao mesmo tempo em que o incluiu no cálculo da receita requerida do novo contrato.

Apesar dessa hipótese, gestores ouvidos pelo Brazil Journal dizem que já questionaram o IFC sobre isso, e o braço do Banco Mundial para investimentos negou que tenha cometido esse erro — reiterando que a conta estava certa, mas sem explicar como chegou nela. 

O IFC tem dito ao mercado que deve publicar entre hoje e amanhã um documento explicando suas contas. 

Outra teoria, que começou a circular nos últimos dias, é de que a Sabesp enviou dados errados ao IFC, e que o erro na conta teria ocorrido porque a base de dados usada no cálculo estava errada.

“O governo de São Paulo tem sido muito receptivo ao feedback do mercado, mas é preciso explicar o que está acontecendo, reconhecer o erro e corrigir,” disse outro gestor.

UPDATE: Depois da publicação da matéria, o Governo de São Paulo disse que “todas as informações necessárias para determinação da tarifa inicial, inclusive os impostos, foram adequadamente consideradas. No entanto, houve uma atualização dos números da Sabesp relacionada às economias denominadas mistas, e por isso o IFC recalculou a tarifa inicial. O novo cálculo será divulgado ainda esta semana.”