O artigo que escrevi neste espaço no dia 17 de julho — “O segredo das transformações empresariais que funcionam” — defendia que, para mudar uma empresa, é preciso entre outras coisas investir em uma boa comunicação com os colaboradores, de modo a garantir seu engajamento. 
 
O texto teve ótima repercussão. Leitores mostraram interesse em saber mais sobre um ponto: na hora de contar a estória da transformação, o que falar exatamente, e como?
 
Para começar, é essencial não focar apenas nas métricas financeiras e operacionais, esquecendo-se de transmitir outros elementos:  o que será feito, como, quando, por quem, e por que isto é relevante para a pessoa com quem se está conversando. 
 
Uma estória de transformação é única para cada situação, empresa ou momento. Não pode simplesmente ser copiada, nem tratada como um documento único distribuído uma só vez num comunicado interno. Ao contrário: ela deve ser fonte para a criação das várias formas de comunicação ao longo da transformação.
 
Normalmente, ao contar esta estória, os líderes tendem a enfatizar a importância do ponto de vista dos desafios empresariais e das decisões tomadas.
 
No caso de uma empresa aérea, a estória poderia ser algo como: “Nossa precificação está acima do mercado em um momento em que custo é o principal fator de decisão de compra dos passageiros. Precisamos cortar custos, oferecer passagens mais baratas e diminuir perdas com atrasos. Isso vai nos permitir conquistar maior share de mercado”.
 
O problema é que, segundo nossa experiência, narrativas com este foco limitado somente inspiram 20% dos funcionários. Precisamos admitir que a maioria das pessoas não estão realmente tão preocupadas em fazer a companhia aumentar sua rentabilidade. Isso tem mais impacto no CEO e nos acionistas do que em quem está na ponta.
 
A questão é que precisamos dos 80% restantes para engajar as pessoas, chegar aos nossos objetivos e atingir resultados realmente diferentes e sustentáveis. Mas como engajar e fazê-los se sentir protagonistas da estória?
 
Antes de mais nada, com significado e propósito. 
 
Alguns vão se inspirar por ajudar a mudar e melhorar o mundo. No exemplo do setor aéreo, a mensagem poderia ser algo como “ter passagens mais baratas significará promover mais encontros, mais felicidade para quem quer conhecer outros lugares, juntar pessoas que vivem longe e facilitar a vida de quem trabalha e quer chegar em casa logo para estar com a família”. Seria a dimensão de uma missão maior — e com benefícios para a sociedade.
 
Um segundo grupo se conectará, acima de tudo, em saber que os clientes admiram a sua entrega de produtos ou serviços. A mensagem aqui poderia ser: “teremos o melhor custo/benefício do mercado, com preços justos, voos pontuais e serviço atencioso, impressionando os nossos passageiros”. Este grupo se conecta com o objetivo de melhorar a experiência do cliente/consumidor.
 
Um terceiro perfil tem como prioridade temas que melhorem o ambiente de trabalho, aumentem a performance do time e criem senso de pertencimento. “Teremos maior delegação, mais simplicidade, mais flexibilidade e maior acolhimento a novas ideias. Isso tornará nosso trabalho mais eficiente e trabalharemos melhor como grupo”. Aqui, a experiência do time é o que faz a diferença.
 
E não podemos esquecer o grupo de profissionais que quer saber, acima de tudo, de si próprio. Não há nada de errado nisso. Temas como reconhecimento, promoções, remuneração e desenvolvimento pessoal precisam ser tratados. Para estes, podemos dizer: “A racionalização criará oportunidades, vamos investir no desenvolvimento profissional e premiar quem se destacar”. O desejo de sucesso pessoal não pode ser negligenciado.
 
Quando você quer engajar o máximo de pessoas, é preciso tratar destas dimensões. O programa e os objetivos financeiros não precisam mudar — seguiremos focados em crescer e ser mais eficientes, mas é preciso garantir que outras necessidades também sejam atendidas de forma sincera e real. 

Em um estudo famoso, o economista Daniel Kahneman tentou comprar bilhetes de loteria de voluntários. Metade deles havia recebido os bilhetes já preenchidos, com números aleatórios. A outra metade havia feito o preenchimento por conta própria.
 
O resultado: o segundo grupo queria cobrar pelo menos cinco vezes mais pelos bilhetes do que o primeiro. Como loteria é puro acaso, isso não faz o mínimo sentido lógico — a chance de ganhar era a mesma. Mas é a natureza humana: quando fazemos uma escolha, ficamos muito mais comprometidos com o resultado.
 
Desse modo, uma boa ideia é fazer os próprios colaboradores contarem a sua versão da transformação e terem a possibilidade de dar o seu toque pessoal. Um exemplo: Neville Isdell, ex-CEO da Coca-Cola, diz que um dos fatores que lhe permitiu tirar a empresa do vermelho e obter retornos de 20% ao ano foi ter convidado 150 funcionários-chave a falarem e escreverem sobre as implicações da transformação para sua área específica na empresa.
 
Ou seja: quer aumentar a chance de sucesso? Garanta que haja um propósito significativo para todos, e faça as pessoas serem co-criadoras do objeto de engajamento e da sua narrativa. Nas transformações corporativas, isso é fundamental.

 

Rami Goldfajn é sócio da McKinsey e líder da prática de Transformações – RTS no Brasil.

 

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