O meteorologista Carlos Magno construiu a marca brasileira mais conhecida quando o assunto é se-vai-chover-amanhã: a Climatempo.

Agora, vai se aventurar em outro tipo de previsão.

Magno lançou semana passada a Climate Change Channel, ou C3 TV, o primeiro canal de televisão voltado exclusivamente para a cobertura das mudanças climáticas.

Quando provoco Magno dizendo que ele está migrando “da previsão do tempo para a do fim do mundo,” ele diz que não é bem assim, e me enquadra: “Queremos trazer a percepção da seriedade daquilo que está acontecendo.”

É sério mesmo.

Até outro dia não havia furacões no Brasil (como os que vem matando no Sul), tampouco os ‘furacões de fogo’ que assolaram o Havaí há poucos dias. Isso só para dar dois exemplos do que a mudança climática está fazendo com o mundo. Magno vai além: “O impacto do calor na saúde das pessoas é tão sério que daqui a pouco algumas áreas do Brasil não serão mais possíveis de habitar.”

ClimatempoPara mostrar essa realidade em todos os cantos do País e fazer da C3 TV um negócio viável, o novo canal vai exibir documentários feitos com financiamento da Ancine, a agência do audiovisual. Cinco projetos (de um total de 20) já estão aprovados, num regime de co-produção em que a C3 TV não tem que colocar dinheiro.

Este modelo justifica a escolha da TV por assinatura. A lei brasileira prevê que os pacotes de TV paga ofereçam pelo menos dois canais com 12 horas diárias de produção nacional independente.

O conteúdo da TV também estará disponível no YouTube e nas redes sociais, como parte da estratégia de Magno de atingir o público jovem. A ideia é fazer lives para transmitir em tempo real acontecimentos climáticos, como enchentes e furacões, sempre com base nas previsões dos cientistas do canal, ligados a organizações como INPE, IMET (Instituto Nacional de Meteorologia), Embrapa, ITA e 11 universidades da área ambiental. “Cada um vai atuar na sua área, colaborando com entrevistas ou consultas,” diz Magno.

O projeto inclui ainda fazer parcerias com escolas para que os alunos produzam conteúdos focados em suas realidades locais, com o apoio de professores e cientistas. Em um segundo momento, o canal também vai buscar publicidade para incrementar a monetização.

Magno e sua esposa, a também meteorologista Ana Lúcia Frony, estão fazendo um investimento inicial de R$ 2 milhões no novo canal – mas não estão partindo do zero.

Três grandes empresas – The Weather Company (vendida esta semana pela IBM para o fundo de private equity Francisco Partners), a DTN e a norueguesa StormGeo – dominam o setor de previsão do clima no mundo.

Em 2019, a StormGeo comprou do casal 51% da Climatempo em uma disputa acirrada pelo ativo — e logo em seguida patrocinou um M&A em que a Climatempo comprou a concorrente Somar Meteorologia, ficando com 80% de share no mercado de previsão do tempo, segundo a própria empresa. Em maio deste ano, a StormGeo comprou os 49% restantes de Magno e Ana Lúcia.

ClimatempoParecia o fim de uma história de mais de 30 anos. O casal fundou a Climatempo em 1988, em São Paulo, depois de deixarem o Rio de Janeiro com a expertise adquirida no Instituto Nacional de Meteorologia, onde trabalhavam juntos. Criaram assim a primeira empresa privada de previsão do tempo, e logo começaram a produzir boletins para a Rádio Eldorado, uma potência de audiência na época.

Na agricultura, as empresas também precisavam de informação confiável para não ficar à mercê de boatos – como o de geadas que teriam destruído cafezais e assim faziam o preço do café subir. Foi para fugir de boatos que a Nestlé se tornou uma das primeiras clientes da Climatempo.

Magno e sua esposa foram se adaptando a cada evolução do mercado ao longo das décadas. Com o advento da internet, começaram também a fazer B2C, e o crescimento foi exponencial. Site, aplicativo, TV: a marca ficou tão conhecida que, mesmo com os smartphones tendo seus próprios apps de previsão do tempo, a Climatempo é um dos aplicativos de previsão mais baixados pelos brasileiros. O site da empresa tem uma audiência de 20 milhões de visitantes únicos por mês.

Magno permaneceu no conselho da empresa quando concluiu a venda para a StormGeo, e havia tomado a decisão de se aposentar. Mudou-se para a paradisíaca São Miguel do Gostoso, no Rio Grande do Norte, e começou a plantar batata doce.

Mas logo na sequência, os noruegueses resolveram se desfazer da TV Climatempo, dando a Magno um atalho para o novo canal.

Como a TV Climatempo já estava na TV por assinatura, a C3 TV já nasce com faturamento (a operadora paga pelo conteúdo com base na audiência) e, segundo Magno, vai fechar este ano no breakeven.

O sinal está disponível na Claro TV, e em breve por outras operadoras. No futuro, o casal do tempo quer fazer uma plataforma de streaming sobre mudanças climáticas, ao estilo Netflix. Se o mundo ainda existir, claro.