Há dois meses, corre no mercado financeiro o boato de que a Localiza, de longe a maior empresa de locação de automóveis do Brasil, estaria negociando a compra da Unidas, uma concorrente menor que saiu do buraco e pode dar trabalho daqui pra frente.
Crescer por aquisições não é parte do DNA da Localiza. Em seus 42 anos, ela só fez aquisições no início de sua expansão, em 1980, quando comprou 11 locadoras espalhadas pelo Brasil, predominantemente as que tinham lojas em aeroportos. Depois disso, só comprou seus próprios franqueados quando estes queriam sair do negócio.
Mas num evento com investidores em fevereiro, o diretor financeiro da Localiza disse que a empresa estava olhando o mercado e poderia fazer algum movimento de aquisição. Disse ainda que o alvo poderia ser uma empresa menor, de nicho, mas que se algo maior viesse para análise, a empresa olharia.
(Detalhe: Assim como os controladores da Localiza, Roberto Mendes é mineiro. Quando um mineiro ousa dizer qualquer coisa, é porque o trem já saiu da estação.)
Nesta semana, o boato de uma transação ganhou mais força. A ABLAS, associação que representa as empresas do setor, modificou a forma de calcular o tamanho do mercado de aluguel de carros e a participação de cada empresa.
Pela nova metodologia, os quatro maiores concorrentes passaram a ter 24% do mercado de aluguel de carros; na velha metolodogia, tinham 43%.
A Localiza teve sua participação reduzida de 47% para 13% (em termos de receita), com a Unidas caindo de 8% para 4%. A leitura do mercado: com estes números, uma aquisição teria mais chance de aprovação no CADE.
Mas a pergunta que importa aqui é, por que a Localiza compraria a Unidas?
Comandada pelos irmãos Salim e Eugênio Mattar, que juntos detêm 12,7% da companhia, a Localiza é uma ‘empresa de dono’ — apesar de 72% de seu capital estar pulverizado entre investidores. (Uma outra família, os Resende, tem 15%).
A Localiza sempre teve um custo tão baixo que frequentemente consegue passar anos sem aumentar seus preços — e sem perder margem. “Por causa da escala, eles conseguem transferir para o cliente a produtividade e a eficiência,” diz um analista. A última vez que a empresa aumentou sua tabela foi em dezembro de 2008, apesar de aumentar ou reduzir os descontos ao sabor do mercado.
O que a Unidas daria à Localiza é mais escala e, principalmente, a chance de defender seu território da eventual entrada de um concorrente internacional no momento em que o dólar a 3 faz o Brasil barato para um investidor estratégico de longo prazo.
A Unidas é controlada pelo grupo português SAG e por fundos de private equity administrados pela Kinea, Vinci Partners e Gávea Investimentos. Os fundos passaram quatro anos reestruturando a companhia, e agora o negócio ficou redondo. Uma tentativa de IPO teve que ser abortada em 2013 por pouca demanda, mas, quando a janela de IPOs reabrir, a história pode ser diferente. A empresa deve crescer seu faturamento em 15% este ano, principalmente ganhando mercado de locadoras menores como Avis e Hertz.
O mercado aposta que algo vai acontecer. Esta semana, alguns bancos de investimento começaram a recomendar as ações da Localiza e aumentar seu preço-alvo, turbinando estimativas e mudando a forma de avaliar a empresa. “Isso não é nada anormal, mas é estranho num momento de economia fraca e revisões para baixo das variáveis macro,” diz um investidor.
Dinheiro não é problema para os Mattar. A Localiza tem um endividamento líquido confortável, de 1,3 bilhão de reais, equivalente a apenas 1,4x sua geração de caixa. Como a empresa carrega uma posição de caixa bruto de cerca de 1 bilhão de reais (ou mais) há 15 meses, no ano passado o mercado especulou que ela pagaria um dividendo extraordinário , mas, previdentes, os Mattar sentaram no caixa.
A Localiza vale 8,5 bilhões de reais na Bolsa. Sua ação negocia a 19 vezes seu lucro estimado para 2015 e a quatro vezes seu valor patrimonial, múltiplos altos para um cenário econômico tão fraco e que talvez já embutam a expectativa de que uma transação aconteça.
Mas a Localiza pode regatear o preço porque, apesar de uma compra fazer todo sentido, ela não precisa de uma aquisição.
“A eficiência e o poder de preço deles é tão grande que, quando vem uma crise, tudo que eles têm a fazer é esperar os concorrentes quebrarem,” diz um gestor que acompanha a empresa há anos.
Diz outro, que só tem elogios para a Localiza: “Eu acho que o Salim tem que fazer essa aquisição, mas acho que não vai fazer porque ele é muito fissurado em preço. Ele não vai querer deixar 100% das sinergias com o vendedor, ele vai querer dividir a sinergia, e aí pode ser que o negócio não saia, mas eu acho que essa transação protegeria muito o negócio dele.”
Vamos ver quem pisca primeiro.