PARIS — Passem por aqui na volta de Courchevel.

Não se trata de um conclave, até porque não há fumaça branca saindo de chaminés, mas a Fondation Louis Vuitton está consagrando um novo “Papa da Pop Art”.

Em vez de Andy Warhol ou Roy Lichtenstein, a exposição Pop Forever, Tom Wesselmann &…, que fica em cartaz até 24 de fevereiro, exalta Tom Wesselmann (1931-2004). 

Os curadores Dieter Buchhart e Anna Karina Hofbauer atribuem mérito duplo a Wesselmann – que em vida rechaçou o rótulo de artista pop.

Além de ajudar a construir o cânone da Pop Art nos anos 60, o trabalho do americano teria sido o que melhor resistiu ao teste do tempo na medida em que artistas contemporâneos seguem estudando e criando a partir das técnicas que ele desenvolveu.

Wesselmann “não é tão valorizado como alguns de seus pares, mas foi muito importante, está na primeira prateleira, e esta mostra resgata isso,” o marchand Gugu Steiner disse ao Brazil Journal

Assim, o que a princípio seria apenas uma retrospectiva de Wesselmann, com 150 de seus trabalhos, também é um retrato da Pop Art, com 70 obras de outros 35 artistas. 

Sem legenda 1O resultado é uma mostra grandiosa – literal e figurativamente.

Iniciada entre as décadas de 50 e 60 na Inglaterra e nos Estados Unidos, a Pop Art buscava subverter o expressionismo abstrato e conectar a arte com o cotidiano. 

Para isso, os artistas utilizavam em suas obras elementos culturais populares, como publicidade e histórias em quadrinhos. Nos Estados Unidos, as cores da bandeira e o corpo feminino também foram objeto de estudo.

Alguns dos trabalhos mais icônicos da escola surgem já nessa altura e abrem a exposição. 

Logo de cara, surge a hipnotizante Shot Sage Blue Marilyn (1964), de Warhol. O mundo da arte acredita que a obra, vendida por US$ 195 milhões em 2022 a um comprador não divulgado, foi adquirida justamente pelo fundador da LVMH, Bernard Arnault, para decorar a loja da Tiffany & Co de Nova York.

Entre as obras de Wesselmann, impressionam quadros da série Still Life, em que o pintor chacoalha o habitual intimismo das clássicas composições de natureza-morta com elementos da cultura americana. 

Em Still Life #31, Wesselmann colocou uma televisão de verdade, que fica ligada, e colou na pintura uma foto de George Washington, além de pintar frutas em uma cozinha. O resultado é uma mistura de técnicas e uma explosão de cores com humor sofisticado.

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Wesselmann foi fazendo Still Lifes cada vez maiores ao longo da carreira, algumas com mais de 10 metros de comprimento.

Nesta linha, Still Life #57 é uma composição de molduras gigantes recortadas que transforma objetos corriqueiros como uma laranja e um rádio em um arranjo tridimensional de proporções exageradas. 

O público também é apresentado à série que deu fama ao artista, Great American Nude. Como o nome indica, o ponto focal é o corpo feminino despido.

Em uma das versões, Great American Nude #31 (1962), uma mulher nua aparece deitada em primeiro plano enquanto uma reprodução da Monalisa decora a parede do cômodo.

Entre um nu e uma Coca-Cola gigante, a curadoria até apresenta referências que ajudaram a parir a Pop Art, como o Dadaísmo. Inclusive, nada melhor que A Fonte (1917), de Marcel Duchamp, para representar a relação entre arte e cotidiano (a obra consiste em um urinol virado de ponta-cabeça, assinada com um pseudônimo).

O erotismo mantém protagonismo inequívoco nos trabalhos de Wesselmann ao longo de sua carreira e, consequentemente, na mostra. Séries como Bedroom Paintings e Mouths retratam incansavelmente corpos femininos, seja por inteiro ou alguma parte, como pés, bocas e seios. 

O que varia bem mais que o conteúdo na obra de Wesselmann é a forma. Além das molduras recortadas, o trabalho do artista com metal fica em evidência, sendo inclusive vanguardista na utilização de lasers para moldar as peças.

Tal versatilidade é tratada pela curadoria como o grande legado de Wesselmann e sua ponte com artistas contemporâneos.

Isso fica claro nas molduras não simétricas de Tomokazu Matsuyama e nos nus de Mickalene Thomas e Derrick Adams, que evidenciam corpos negros. Os três artistas desenvolveram obras para a exposição.

Ballon Dog (Yellow) (1994-2000), de Jeff Koons, e Han Dynasty Urn with Coca-Cola logo (1994-2015), de Ai Weiwei, são outras presenças ilustres.

A mostra deixa claro que Arnault aposta no pop para seguir atraindo atenção para a Louis Vuitton. A varejista de luxo acumula colaborações recentes com outras marcas hypadas, como Supreme e Comme Des Garçons, e expoentes da Pop Art, a exemplo de Yayoi Kusama e Takashi Murakami — que assina a coleção estrelada atualmente pela atriz americana Zendaya.

Na Fondation Louis Vuitton, o museu de arte criado pela empresa há 10 anos, o foco também tem sido reverenciar artistas com forte apelo comercial, a exemplo de Jean-Michel Basquiat e Warhol, que tiveram grandes mostras.

No catálogo da exposição, o próprio Arnault diz que o gênero permeia a construção das coleções da casa, bem como mostras e eventos.

“Arnault é um grande colecionador, tem organizado grandes exposições e vai continuar trabalhando para ligar arte e sofisticação à sua marca,” disse Steiner.

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