Os políticos brasileiros de esquerda que admiram e se inspiram na França já têm algo novo para copiar.
Em face ao aumento da dívida pública, o primeiro-ministro François Bayrou apresentou uma proposta radical: eliminar dois feriados do calendário nacional.
“Toda a nação terá que trabalhar mais para que a atividade do país como um todo aumente e a situação da França possa melhorar,” disse o centrista Bayrou numa coletiva de imprensa.
Pelas regras da zona do euro, o déficit público não pode ultrapassar 3% do PIB – incluindo aí os juros da dívida. Na França, o número atual é quase o dobro disso: ficou em 5,8% no ano passado. (Nota: o rombo do Brasil gira em torno de 8% do PIB.)
O endividamento total soma € 3,3 trilhões, e os juros anuais devem chegar a € 62 bilhões neste ano. Sem ajuste, essa rubrica vai subir a € 100 bilhões até 2029 e será a maior despesa do orçamento público.
Bayrou não poupou hipérboles. Disse que a situação fiscal representa um “risco mortal” para um país “à beira do abismo” e “ainda viciado em gasto público” – e, por isso, os franceses precisam apertar o cinto “antes que sejamos esmagados pela dívida.”
No pacote proposto, haveria uma redução de € 44 bilhões no desequilíbrio esperado para 2026. O plano envolve contenção de despesas e aumento de arrecadação. Com isso, o déficit cairia para 4,6% no próximo ano e 3% até 2029.
Além da supressão dos feriados, as medidas apresentadas incluem um congelamento de despesas em todas as pastas, como exceção da Defesa. Salários dos servidores públicos e das agências federais também ficariam congelados, e vagas serão cortadas.
“É a nossa hora da verdade,” disse o premiê, para quem o país pode sofrer uma crise similar à da Grécia em 2008. “Nós nos tornamos viciados em gasto público.”
Bayrou propôs eliminar dois feriados: a segunda-feira de Páscoa e o Dia da Vitória na Segunda Guerra Mundial (8 de maio). Pelas contas do governo, isso geraria uma receita adicional de € 4,2 bilhões – um montante equivalente ao aumento de tributação previsto.
A França tem 11 feriados (seis católicos e cinco nacionais). O Brasil tem 15 feriados nacionais – sem falar nos feriados e pontos facultativos locais.
O congelamento de salários de servidores e programas sociais, sem o reajuste automático da inflação, traria uma economia de € 7,1 bilhões.
Entre os países da zona do euro, apenas a Eslováquia tem um rombo orçamentário pior que o francês. A Grécia conseguiu praticamente eliminar o déficit.
Os gastos militares ficaram de fora porque a expansão deles foi um compromisso do Presidente Emmanuel Macron, com a promessa de elevar em € 6,5 bilhões o orçamento da área nos próximos dois anos.
Bayrou alcançou uma unanimidade – o que deve indicar que esteja no caminho certo: foi atacado impiedosamente pela direita e pela esquerda.
A líder da Reunião Nacional, Marine Le Pen, da extrema direita, disse que o primeiro-ministro deveria “eliminar desperdícios e gastos desnecessários” em vez de atingir os trabalhadores e aposentados franceses. Ele prometeu apoiar um voto de censura caso o plano vá adiante.
Nisso, o líder da França Insubmissa, Jean-Luc Mélenchon, da extrema esquerda, está de acordo com a colega da ultradireita e também deve votar pela censura do projeto.
A coalizão de centro-direita liderada por Bayrou assumiu em dezembro e mantém baixos níveis de popularidade e apoio na Assembleia Nacional.
Sem os votos necessários, o governo terá que usar uma cláusula de excepcionalidade para aprovar o orçamento proposto.