Paulo Guilherme Aguiar Cunha – um brasileiro das antigas, patriota, nacionalista, dedicado às causas públicas e que sempre pensava o Brasil – deixou-nos nesta madrugada aos 82 anos.
Incansável defensor da indústria, lúcido, equilibrado e ativo líder empresarial, Paulo foi um visionário que sempre projetou o País 30 anos à frente. Era também um homem profundamente preocupado com as questões sociais, a educação e a desigualdade. Um homem generoso, preocupado com os mais humildes.
Um dos fundadores do IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), presidiu-o por quatro anos. Presidiu também o IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo), e a ABNT e foi membro do Conselho Monetário Nacional.
Repetidamente convidado a compor ministérios de diferentes governos, sempre acreditou que seu papel era no setor privado. “Fique perto do governo, mas não perto demais,” aconselhava frequentemente.
Paulo foi um dos responsáveis pela implantação da indústria química no Brasil, um dos artífices da bem-sucedida aliança entre o capital privado, o capital estatal e o capital estrangeiro, sempre sob comando nacional. Renovou e presidiu a ABIQUIM (a Associação Brasileira da Indústria Química) no período crítico da definição do modelo que permitiu a modernização da indústria química brasileira.
Começou no setor privado após uma passagem curta pela Petrobras, da qual muito se orgulhava. Começou a construir ali sua visão sobre o papel transformador da indústria na sociedade e sobre a grandeza que o país deveria sempre ambicionar. Entrou na Petrobras por concurso e saiu – não sem passar por um certo conflito interno – para o Grupo Ultra, respondendo a um convite de Pery Igel em 1967. Ali, realizou plenamente sua visão.
Responsável inicialmente pela implantação da Oxiteno, liderou posteriormente todo o Grupo Ultra – inicialmente como vice-presidente, compondo com Pery Igel e Hélio Beltrão um triunvirato que dirigiu a empresa por muitos anos.
Em 1981 assumiu a presidência da companhia. Em 1999 liderou a abertura de capital da Ultrapar de forma pioneira, simultaneamente nas bolsas de São Paulo e Nova York. Foi pioneiro também na concessão de tag-along de 100% para todos os acionistas e, posteriormente, na migração da empresa para o Novo Mercado – um caso único de uma empresa em que o acionista abria mão voluntariamente do controle da empresa, em prol do seu progresso, sua perenização e profissionalização.
Dirigiu a Ultrapar durante a sua fase mais agressiva de crescimento, com a aquisição da totalidade das ações da Oxiteno, seguida por M&As transformadores para a Ultragaz, a Ultracargo e a própria Oxiteno, como as compras da Shell Gás, da Canamex (iniciando o processo de internacionalização da Oxiteno) e da União Terminais.
Paulo transformou o grupo – mais uma vez – com a compra da Ipiranga e da Texaco, convertendo o Ultra em uma potência da distribuição de combustíveis. Em 2007 deixou de acumular a presidência executiva com a presidência do Conselho de Administração, e em 2018 deixou a presidência do conselho.
Tive a honra de suceder Paulo em três cargos: como CEO da Oxiteno, presidente executivo do Ultra e presidente do conselho de administração.
Ao entregar este texto na manhã deste domingo, ainda sob o impacto de sua perda, ouvi dos mais próximos que eu deveria dizer algo a respeito de nossa relação pessoal —que foi longa, produtiva e se confunde com minha carreira. Mas isto é justamente o que Paulo não gostaria. Em vez de falar de nós mesmos, ele preferia falar do Brasil.
Paulo Cunha deixa um legado de ética, visão de longo prazo, austeridade na vida pessoal e profissional, valorização das pessoas e da atividade industrial, do empreendedorismo, da educação e da inovação tecnológica. Uma grande perda para a empresa e o País.
Pedro Wongtschowski é o chairman do Grupo Ultra.