Você piscou – e metade do ano já foi. E a economia brasileira, quem diria, bateu de longe as estimativas feitas em janeiro.
Agora, a dúvida que atormenta economistas e gestores é se a retomada seguirá no segundo semestre ou se perderá força, dragada pelo aperto monetário em escala global.
O IBGE disse hoje que a taxa de desemprego caiu abaixo dos 10%, algo que se esperava apenas no final do ano, e ficou em 9,8% no trimestre encerrado em maio. É a menor taxa de pessoas sem trabalho para esse período do ano desde 2015.
O total de pessoas ocupadas, somando os empregos formais e informais, atingiu 97,5 milhões – o maior número da série histórica.
Os salários continuam reprimidos e boa parte das vagas são em empregos precários, mas houve uma melhora expressiva em relação ao ano passado. O número de empregados com carteira assinada no setor privado avançou 12% em relação ao mesmo período do ano passado.
Houve duas causas principais para os resultados acima do esperado, dizem os analistas.
Em primeiro lugar, a reabertura pós-covid empurrou para cima o comércio e os serviços de maneira geral. Além disso, a valorização das commodities exportadas pelo Brasil ajudou a irrigar a atividade econômica e criar oportunidades de emprego.
“O setor de commodities costuma ser subestimado por muitos economistas, mas ele representa a nossa única grande vantagem comparativa”, disse Tony Volpon, estrategista-chefe da WHG e ex-diretor do Banco Central. “Quando os preços das matérias-primas sobem, isso irriga toda a economia. Existe um grande efeito multiplicador.”
Para o economista Mauricio Oreng, do Santander, o ciclo de retomada da economia surpreendeu e foi mais rápido do que o imaginado, reduzindo a ociosidade e incentivando as contratações.
“Os dados do emprego formal mostraram um dinamismo muito bom. Temos um conjunto de dados positivos”, afirmou ele. “Esperamos um aumento de 3% na massa total de rendimentos dos brasileiros, o que inclui também os benefícios sociais.”
Infelizmente, muitos economistas temem que esse bom momento possa estar com os dias contados – dado que os efeitos da Selic mais alta serão sentidos mais intensamente nos próximos meses.
O câmbio mais fraco, que retroalimenta a necessidade do juro alto, também já está sendo sentido, lembra Volpon. Normalmente, em situações de valorização das matérias-primas exportadas pelo Brasil, a tendência é de valorização do real e alta na Bovespa. Sem a ajuda dos dólares vindos de fora, a bolsa brasileira entrou em queda, e o dólar subiu.
“Com a economia mais forte do que o esperado, deveríamos esperar um real mais forte”, disse Volpon. “Mas isso não ocorre por causa do cenário externo e de toda essa questão fiscal no Brasil, embora eu particularmente acredite que o mercado exagere um pouco nesse ponto. Tem fixação no fiscal. As contas públicas estão hoje em uma situação estruturalmente melhor do que se diz, graças ao aumento na arrecadação e a algumas medidas de controle de gastos, como nos salários do funcionalismo – que foram segurados a ferro e fogo.”
Fernando Donnay, gestor de portfólio da G5 Partners, ressalta que os pacotes de benefícios distribuídos pelo governo ajudaram a empurrar o consumo e o emprego. Mas o custo fiscal dessas medidas ajuda a explicar a empinada nos juros futuros.
“O mercado está colocando um prêmio de risco muito grande na curva”, disse o gestor. “Pelas estimativas de juros neutros e pela inflação esperada, as taxas dos títulos pré-fixados deveriam estar em 7%, mas estão acima de 12%. É um prêmio de 5%, muito elevado.”
Donnay lembra ainda que o risco-país, medido pelos CDS de 5 anos, bateu nos 300 pontos. No final de 2019, depois das reformas aprovadas no governo Temer, o índice havia caído abaixo de 100 pontos.
A dúvida para os próximos meses, portanto, é qual o peso que a virada externa e o aumento do risco Brasil exercerão sobre a retomada na atividade econômica e no emprego.