O texto abaixo é uma transcrição do que disse o deputado federal Daniel Coelho, do Cidadania de Pernambuco, numa comissão especial da Câmara dos Deputados, na semana passada.
Há cerca de dois anos eu fui buscar meus filhos na escola e acabei sendo chamado pela professora para entender um desenho que meu filho tinha feito na sala de aula.
Eu tenho dois filhos, Lucas e Helena, e sou casado com Rebeca.
Quando pediram a meu filho para desenhar a família dele, ele desenhou o pai trabalhando, e a mãe na cama, dormindo. Porque na memória dele, a mãe vivia na cama. Há dois anos, minha esposa faz um tratamento de quimioterapia e por muito tempo ela teve que abdicar de suas atividades de mãe e suas atividades profissionais como nutricionista.
De alguns meses para cá, amparada numa liminar — e com um custo altíssimo, que graças a Deus nossa família pode pagar — ela começou a utilizar o óleo de cannabis. Hoje, ela continua o tratamento, mas não está mais na cama.
Todos os dias — hoje mesmo — ela leva os filhos para a escola e vai fazer a infusão de quimioterapia.
Após o uso do óleo de cannabis, ela diminuiu o uso de corticóides, parou de enjoar e vomitar, e passou a ter uma vida normal. Não estou aqui dizendo que o óleo de cannabis é a cura para o câncer. Ninguém sabe se tem cura para o câncer.
O que estou dizendo é um exemplo da minha casa, onde nossa família resgatou sua dignidade e nossa possibilidade de viver em conjunto, da mãe sair da cama e poder ter uma vida normal. E a gente está fazendo aqui esse debate, e muitos estão tentando usar essa discussão para ganho eleitoral, porque, claro, falar em legalizar maconha, a maioria da população é contra.
E o óleo de cannabis nada tem a ver com a maconha recreativa. Se alguns aqui querem ouvir: não ‘dá barato’, ninguém ‘viaja’ tomando óleo de maconha. O óleo da cannabis é um remédio que possibilita uma pessoa que está fazendo quimioterapia ter uma vida normal. Possibilita alguém que está com Alzheimer e não reconhece mais o filho, depois do seu uso reconhecer ele de novo. Possibilita uma criança com autismo ter uma vida normal, estudar, poder trabalhar… Possibilita uma família que tem alguém com epilepsia ficar tranquila que ele vai poder caminhar na rua sem cair, sem ter um acidente e ser atropelado.
E a gente aqui… fazendo uma discussão com cunho eleitoral, apelativo… Como se estivéssemos discutindo a liberação de uma droga. Falando-se em nome da ‘família’… E eu quero falar aqui em nome das famílias desse Brasil — das várias, das milhares de famílias que precisam desse medicamento para ter uma vida com dignidade.
Eu não estou querendo obrigar ninguém a tomar um medicamento, cada um toma o medicamento que quiser e que o médico indicar. Mas por que proibir alguém de tomar um medicamento ou colocá-lo num preço impossível de ser pago por uma população brasileira que mais de 70% tem uma renda familiar de dois salários mínimos? Pessoal não pode pagar isso só de medicamento: ela tem que comer, ela tem que viver!
Recebi muita pressão, senhores e senhoras deputados, de que se votasse essa matéria iria perder votos, talvez até perder a eleição. Eu não tenho ne-nhu-ma dúvida de que se eu tiver que escolher entre perder a eleição, perder voto e defender uma vida, eu vou defender uma vida — quanto mais milhares de vidas nesse País.
Só a ABRACE (Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança) na Paraíba tem 14 mil pacientes que estão recebendo o medicamento de forma precária, através de uma decisão judicial. E sabe por quê? A legislação não dá sustentação à decisão judicial, mas não tem juiz nesse País que tenha coragem de cortar o medicamento dessas 14 mil famílias. Nós estamos vivendo um estado de desobediência civil nesse País. E isso nada tem a ver com o uso recreativo e com a droga.
‘Ah, se for plantar a cannabis medicinal, vai aumentar o uso de maconha e a plantação’…. O traficante não quer plantar a cannabis nas regras que estão estabelecidas no projeto. Ele vai continuar plantando de forma irregular sem fiscalização do Estado, como ocorre hoje!
Se você caminhar no domingo na Avenida Paulista, na praia de Copacabana, na praia de Boa Viagem, na cidade onde eu moro, você vai sentir o cheiro das pessoas consumindo a droga, e ninguém faz absolutamente nada. Quer combater a droga? Vão combater nas fronteiras!
Eu vi parlamentar aqui de estados fronteiriços. Vão combater nas fronteiras onde está entrando a droga. Vão combater! No meu próprio estado tem plantação irregular de maconha. O sertão pernambucano, como foi dito aqui, é um local de plantação. Por que não vão lá resolver?
Agora, proibir as pessoas de ter um tratamento que vai dar dignidade??? Eu não tenho nenhuma dúvida. Eu escolhi um lado aqui: o lado da vida, o lado daquilo que é certo.
Se prejuízos pessoais terei, terei muito orgulho lá na frente de olhar nos olhos dos meus dois filhos, de Lucas e Helena, e de dizer que lutei o quanto pude para defender o bem estar da mãe deles e de muitas e muitas mães, filhos e avós que precisam desse medicamento.
Não vou abrir mão e vou ficar até o fim. Senhor deputado, me mandaram um ofício para me retirar da comissão… Eu não vou ter a possibilidade de votar. Eu poderia até achar isso cômodo, porque não iria entrar no desgaste. Mas faço questão, com essa fala, de deixar registrada a minha luta na defesa de todos os pacientes que precisam da cannabis medicinal no nosso País.
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Nota do Brazil Journal: O deputado Daniel Coelho fica ao lado dos fatos em vez da demagogia, das famílias reais em vez da ‘família’ que é massa de manobra de políticos e pastores. De vez em quando, uma lufada de verdade, de sinceridade e de espírito público — tudo que está presente nesta fala — resgata nossa esperança na Política. Ou será que não?
Na quinta-feira, o deputado disse ao Diário de Pernambuco: “Eu fazia parte da comissão, era um dos membros titulares e votava dentro dela, mas os discursos e argumentações que comecei a fazer incomodaram tanto que os partidos se juntaram e me tiraram. Mas não saí do debate, porque é extremamente relevante.”
Para entender mais sobre o assunto:
https://abraceesperanca.org.br/home/
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