Neste fim de semana, ao visitar o bairro de Pinheiros, em São Paulo, João Amoêdo teve que atravessar a feira de antiguidades que todo sábado toma a Praça Benedito Calixto para chegar ao outro lado, onde era aguardado para um evento de seu Partido Novo.  O trajeto de 150 metros demorou mais de 30 minutos, tal era o número de populares que o abordavam para cumprimentar, tirar fotos e prometer votos. Mais tarde, ao comparecer a um casamento, Amoêdo “estava mais concorrido que o noivo,” segundo um convidado que estava na cerimônia.

A pequena grande novidade desta campanha eleitoral é a candidatura laranja.

Há alguns dias, um almoço do candidato em Brusque, Santa Catarina, reuniu 700 pessoas, e, em Curitiba, ele lotou um auditório para 2.500.

10536 51719e95 9d04 da8c 8c1e 00a9c41972a5Amoêdo ainda está muito longe de poder sonhar com o segundo turno. Mas na eleição mais aberta desde a redemocratização, seu recente crescimento de 1% para 2% na pesquisa Datafolha e o interesse crescente por seu nome nas redes sociais mostram que sua candidatura pode ser uma sementinha que começou a brotar. 

A questão é se ela vai vingar a tempo.

Na última semana, a página de Amoêdo no Facebook foi a que mais cresceu no Brasil — quase 3 vezes mais que a de Lula, a segunda que mais cresceu — e a quarta página que mais ganhou seguidores no mundo.  O engajamento da página (o número de interações em relação ao número de likes) foi o maior entre todos os presidenciáveis:  2,7 milhões contra 1,8 milhão de Lula e 1,6 milhão de Jair Bolsonaro.

Até agora, Amoêdo não conseguiu participar de nenhum debate na TV aberta. As emissoras têm regras de corte que levam em consideração tanto a representação do partido no Congresso quanto a posição do candidato nas pesquisas. A Rede de Marina não tem muitos deputados, mas ela está bem na pesquisa. Henrique Meirelles pontua mal, mas o MDB tem uma mega bancada.  (É óbvio que alguma regra tem que existir, mas num País que reclama diariamente da política e exige renovação, as TVs deveriam trabalhar em regras que produzissem um resultado melhor.  Em vez de um cardápio de qualidade, o eleitor esta tendo acesso apenas ao menu mais esdrúxulo.)

Mas nem o bloqueio nos debates impediu que Amoêdo crescesse. A questão é se o momentum vai continuar.

Perguntei a Carlos Augusto Montenegro — presidente do Ibope Inteligência e 47 anos de estrada em pesquisas — se Amoêdo está no caminho de ir para 3% ou 4%, o que embolaria o meio de campo dos candidatos de centro. Sua resposta:

“Se ele estivesse competindo em condições normais, era possível sim. Mas ele não aparece na cobertura diária dos telejornais (a Globo tem como regra cobrir os 4 ou 5 mais bem colocados nas pesquisas), ele não terá tempo de TV e não foi convidado para os debates. Esses 2% dele são de um esforço total: rede social, boca a boca e pé na estrada. Ele precisa aparecer mais para criar uma onda. Acho até que ele está numa crescente, mas vagarosa. […]. O João está enfrentando aquele dilema de Tostines:  ele poderia ter mais voto se aparecesse mais — ele tem uma boa figura, boas propostas e tem princípios — mas não aparece mais porque não tem mais voto.”

Uma pesquisa encomendada pelo BTG Pactual — feita no fim de semana e divulgada hoje — também mostra progresso: ele aparece com 3% na espontânea e 4% na pesquisa estimulada.

O sucesso de Amoêdo até agora é fruto de sua obstinação pessoal, de um desejo ardente de mudança na sociedade e da criação do Novo, uma alternativa liberal intelectualmente honesta e não fisiológica. Seu crescimento nas pesquisas sugere que o Novo veio para ficar, e mostra que pelo menos uma parte da sociedade quer romper com o status quo de uma forma inteligente.

Apesar disso, o Novo não conseguiu lançar nomes de peso nos Estados — como Bernardinho, no Rio; Salim Mattar em Minas Gerais; e Fábio Barbosa em São Paulo — que teriam dado mais vigor à campanha nacional.  Além disso, Amoêdo ainda enfrenta desafios enormes. O principal deles: lutar para que seu apoio atual não se transforme em voto útil em Alckmin ou Marina, se o segundo turno estiver com pinta de Bolsonaro x Haddad.

Amoêdo reúne atributos presentes nas três candidaturas tidas como mais viáveis: ele tem acesso à mesma equipe técnica de qualidade que Alckmin, a mesma honestidade que define Marina Silva, e todo o apreço pela propriedade privada e pela ordem que formam o binômio da candidatura Bolsonaro, sem o fardo da truculência.  É um candidato leve, capaz de unir o Brasil em vez de dividi-lo.  Não é à toa que tem a menor taxa de rejeição entre os candidatos (10%); Bolsonaro tem 37%.

Há, também, a questão do dinheiro, que seu exemplo pessoal está começando a desmistificar.

No Brasil, a riqueza sempre foi vista com suspeição. Mas Amoêdo não só fez um patrimônio de R$ 425 milhões trabalhando como executivo de bancos como declarou tudo no Imposto de Renda.  Em tempos de Lava Jato, a simplicidade dessa história pessoal é um exemplo poderoso. 

Talvez por causa disso, seu sucesso material tem se provado mais um atributo do que um problema.  “Muitos eleitores dizem que vão votar nele porque ele ‘teve sucesso na vida e, como é rico, não precisa roubar’,” diz um integrante da campanha do Novo.

O candidato não costuma falar do assunto na campanha, mas, em 2009, foi diagnosticado com um linfoma agressivo. Nos EUA, os médicos lhe disseram que o prognóstico não era bom, mas falaram de um protocolo coreano que, de tão forte, não era aprovado nos EUA. Amoêdo submeteu-se ao tratamento e venceu o câncer em 2010. No ano seguinte, fundou o Novo. 

O avanço de Amoêdo — encorajador mas de duração ainda incerta — acontece num momento em que o PIB brasileiro ainda está em busca de um candidato viável (e confiável).  Mesmo entre os empresários há pulverização.  

Geraldo Alckmin é visto como o que mais saberia negociar com o Congresso, o que conhece a máquina pública como ninguém, e é assessorado por uma equipe técnica que entende os problemas com profundidade.  Mas o PSDB, além de ter que lidar com o desgaste de sua marca, continua insistindo na tese de que falar a língua do povo é algo supérfluo: o pobre Geraldo parece não ter sequer um marqueteiro que lhe ajude a sair da armadilha semântica do Itaim.  Ele defende o “IVA” e o “voto distrital misto, modelo alemão” como se o brasileiro médio tivesse um diploma da USP.

Já Bolsonaro professa fé no ‘liberalismo’, mas esta sua nova religião é o oposto da carreira que fez como representante quase sindical dos militares.  Não há uma só costela privatista em seu corpo que não tenha um passado estatista.  Sem falar nas inúmeras aspas bizarras que produziu em seus 26 anos no Congresso.

As dificuldades do País são as mais graves desde a hiperinflação dos anos 80: nos próximos anos, o Estado brasileiro terá que ser redimensionado e reinventado.  Esta missão vai exigir inteligência, preparo técnico, postura e independência.  João Amoêdo é um dos poucos que tem tudo isso para oferecer.  Mas antes vai ter que crescer e aparecer ainda mais.

 

Abaixo, a evolução da candidatura do Novo no Facebook na última semana.

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