Menos de um mês depois das confissões que implodiram a política, o grupo J&F conseguiu fechar sua primeira venda de ativos por um bom preço, desafiando todas as expectativas de que a empresa seja um vendedor em distress.
 
A JBS vendeu suas operações na Argentina, Uruguai e Paraguai para o frigorífico Minerva por US$ 300 milhões. O preço, somado à dívida das empresas adquiridas, equivale de 5 a 6 vezes o EBITDA, em linha com o múltiplo pelo qual o Minerva é negociada em Bolsa, de cerca de 5,5 vezes.

“Me parece um ótimo deal para a JBS. Não foi um mau negócio para a Minerva mas, dada a situação do JBS, dava para a Minerva ter negociado melhor”, diz um analista que acompanha o setor. A avaliação se reflete na Bovespa. No final da tarde, as ações da Minerva operam em alta de 5% enquanto a JBS sobe quase 10%.

“A JBS é corrupta, mas é extremamente eficiente e tem bons ativos”, diz o analista.

O negócio anunciado hoje é estratégico para a Minerva, que vai consolidar sua liderança de mercado no Paraguai e há tempos buscava uma porta de entrada na Argentina. Com a aquisição, o frigorífico vai aumentar sua capacidade de abate em 52%, para 26,4 mil cabeças/dia.

Para a JBS, a operação não faz cócegas: os ativos vendidos representam cerca de 15% da unidade JBS Mercosul, que concentra a operação de carne bovina no Brasil e nos países da região e faturou R$ 28,4 bilhões em 2016, comparado a uma receita total de R$ 170,4 bilhões.

O grosso do negócio vem da Argentina. A Minerva levou uma capacidade de abate de 5 mil cabeças/dia, distribuída em cinco plantas e um centro de distribuição.

Numa teleconferência com analistas hoje cedo, a direção da Minerva sinalizou que, com as sinergias esperadas com as operações que já possui no Paraguai e Uruguai, o valor da transação poderia cair para 3,5 a 4 vezes o EBITDA.

Desde que a delação dos Batista se tornou pública, a grande expectativa é pela venda dos ativos da holding J&F, que terá que pagar R$ 10,3 bilhões – e em 25 anos, sem juros, com uma correção camarada apenas pelo IPCA — no que certamente é um dos acordos de leniência mais abjetos da história. 

A J&F deve tentar vender ainda a Vigor, fabricante de laticínios, a Eldorado Celulose e a Alpargatas, dona das Havaianas.
 
A Alpargatas é o ativo mais vendável e desejável do bolo, e há um número de investidores debruçados sobre seus números.  Uma venda pode sair mais cedo do que se espera.
 
A Eldorado é tida como invendável por ter muita dívida e uma sinergia particular com sua vizinha de floresta, a Fibria Celulose. Veja aqui nossa abordagem sobre este assunto em 2014.
 
Quanto à Vigor, executivos da JBS estimam que o valor do equity da empresa é de R$ 2 bilhões.
 
Nos últimos dias, o management da JBS tem se empenhado em distanciar o futuro da J&F do futuro da JBS, dizendo que a última nada tem a ver com os problemas da primeira.  
 
Quando investidores perguntam sobre a Blessed, a holding obscura que tem participação na JBS, os executivos respondem que o problema será resolvido na CVM com uma reversão do ágio, que “ficará na casa das centenas de milhões de reais” em vez dos bilhões. A empresa enfrenta ainda outros esqueletos.

Apesar da multa concentrada na holding, a JBS quer fazer um colchão de liquidez para enfrentar a turbulência gerada pela delação de seus controladores.

Há preocupação com a queda nas receitas. Na defecção mais high profile até agora, a Domino’s Pizza disse que não vai mais comprar produtos da companhia.
 
Os bancos, por sua vez, devem exigir garantias mais robustas para conceder empréstimos e rolar a dívida, que estava em R$ 47 bilhões no fim do primeiro trimestre, o equivalente a 4,2 vezes o EBITDA.

O mercado também espera a venda de ativos mais líquidos, como a participação na americana Pilgrim’s Pride, ou da Moy Park, a operação de frango voltada para a Europa e comprada da Marfrig em 2015. 

Não se descarta, inclusive, a venda dos negócios de carne bovina no Brasil. “Eles querem se listar nos Estados Unidos, mandaram os bens todos para lá, claramente estão preservando as operações de lá e, com exceção da Seara, não tem tanto apego aos ativos no Brasil. Não teria ninguém com bala na agulha para comprar tudo, mas dá pra fatiar”, pondera um analista.